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sexta-feira, 31 de março de 2017

MAIS UMA HISTÓRIA DE DESILUSÃO PARA OS MINORITÁRIOS

A Energias de Portugal (EDP) acaba de anunciar o lançamento de uma Oferta Pública de Compra (OPA) sobre a EDP Renováveis (EDPR) a 6.80 €/ação para comprar os 22,5% do capital social que estão dispersos em bolsa e não lhe pertencem.
A EDP pretende gastar cerca de 1400 milhões de euros na compra de 22,5% de uma empresa cuja capitalização bolsista é de 6 mil milhões de euros. A EDP anunciou também a venda da espanhola Naturgás, por 2,5 mil milhões de euros, que usará para financiar esta compra, até porque a EDP é uma empresa relativamente endividada. 


Se a EDP conseguir mais de 90% do capital da EDPR, é provável que retire de bolsa a empresa de energias renováveis. Mais uma vez o PSI 20, que há dias recebeu duas novas empresas, a Ibersol e a Novabase, passará a ter apenas 18 empresas. Além disso, deixa de ter uma empresa de grande peso, com uma ponderação no principal índice português à volta dos 10%. 

Em nove anos de cotação em bolsa, desde a sua OPV, a EDPR distribuiu em dividendos uns insignificantes 0,1616 euros (16,16 cêntimos de euro), entre 2013 e 2016. 
O pagamento deste ano, relativo aos resultados de 2016, será descontado no preço da OPA. No total, preço da OPA e dividendos brutos recebidos, perfaz um montante de 6.9616 euros/ação, uma perda de 13% face à OPV de 8 euros/ação em maio de 2008. 

Mas ainda temos que acrescentar as perdas espelhadas no custo de oportunidade. Se alguém, que comprou ações da EDPR na OPV em 2008, tivesse investido oito euros em dívida pública portuguesa, a uma taxa média de rentabilidade de 4%, que não andará muito longe da realidade, teria amealhado, numa ótica de juros compostos, 3,38 euros, uma rentabilidade de 42,3% em nove anos. E teria hoje, capital acrescido de juros, 11,38 euros. A EDP vendeu a oito euros e vem agora propor a recompra a 6,80, se não existir subida do preço. 

Perderam os investidores em EDPR, porém ganharam os acionistas da EDP.
Nos últimos anos não temos assistido a OPV porque as quedas do mercado nacional não têm permitido isso, devido aos receios e afastamento de muitos investidores. Houve a privatização de os CTT em 2013, mas, neste momento, depois dos investidores terem estado a ganhar mais de 100%, já perdem quase 10% em relação ao preço da oferta do Estado Português. Tem existido uma maior propensão, devido à queda do mercado, a fusões e aquisições, passando pelas OPA. O Banif foi integrado no Santander Totta, o BPI foi comprado pelo CaixaBank – de ainda algumas ações cotadas em bolsa , a empresa francesa de Altice comprou a PT Portugal, a ZON fundiu-se com a Optimus, empresa da SonaeCom… 

Alguns investidores tomam de decisões de investimento ou de saída da bolsa, de acordo com o número de Ofertas Públicas de Compra (OPA) e de Ofertas Públicas de Venda (OPV). Quando existem muitas OPV, provavelmente estamos numa fase de consolidação do setor, a finalizar uma tendência de alta do mercado e a entrar num mercado de tendência de baixa (um 'Bear Market'). É normal assistir-se a mais OPA do que OPV quando o mercado vem de uma fase descendente e possivelmente estará a fazer um fundo e encetar uma nova tendência de subida (um ´Bull Market' estará para acontecer), e, segundo esta estratégia, é sinal para entrar no mercado com posições longas (comprador). 

A OPV da EDP Renováveis aconteceu precisamente numa fase em que o mercado vinha de uma fase de alta, em maio de 2008, e começava a corrigir devido à crise do 'subprime' nos EUA. O PSI20 encontrava-se nos 10.500 pontos, e desde essa data já perdeu cerca de 55%, com duas correções em alta pelo caminho, entre 2009 a 2010 e entre 2012 a meados de 2014.
Estas operações poderão descredibilizar o mercado, mas o mercado é de memória curta e tende a voltar a investir em títulos que passaram por operações idênticas. Não foi por causa do 'haircut' sobre parte da dívida soberana helénica, há alguns anos, que os investidores deixaram, após alguns meses ou anos de algum receio acrescido, de investir novamente em dívida grega. 

Quando o mercado acalma, a memória dos investidores é curta e o apetite pelo risco é enorme…


Paulo Rosa, Jornal "Vida Económica", 31 março 2017 








sexta-feira, 17 de março de 2017

PODE UMA EMPRESA DISTRIBUIR MAIS LUCROS DO QUE OS QUE TEVE? PODE, MAS RARAMENTE ACABA BEM.

No Jornal de Negócios de 14 de março, o jornalista Rui Barroso avisou: "as empresas do PSI 20 vão abrir os cordões à bolsa para premiar os acionistas. E há mesmo três cotadas que vão pagar aos investidores mais que o lucro que obtiveram no ano passado". O artigo explica que o dinheiro a entregar aos acionistas subiu 20% em relação ao montante distribuído em 2016. Com mais 350 milhões de euros, os dividendos das principais cotadas vão chegar aos 2200 milhões de euros. Distribuir a quase totalidade dos lucros pelos acionistas não costuma ser uma boa notícia para o futuro da empresa. Mas distribuir mais do que os lucros, é um caso que merece reflexão. Não que seja inédito.

Mas em 2017, depois de todas as lições que a crise, e a História, nos ensinaram, há três empresas que vão dar a ganhar aos donos mais do que elas próprias ganharam: Sonae Capital, Nos e CTT. Pelo interesse que desperta junto dos investidores particulares, vejamos o caso dos CTT. Em 2016, os resultados dos CTT desceram 14%, de 72 milhões de euros para os 62 milhões de euros (M€), abaixo dos 64 M€ esperados pelos analistas. O cash flow operacional desceu 24%, dos 134 M€ para os 102 M€, justificados principalmente pela queda do correio tradicional. A diminuição no uso de correio por parte da Autoridade Fiscal teve um impacto de cerca de 10 milhões de euros na redução das receitas. No último ano os resultados não vinham superando as expectativas, e na bolsa o preço da ação já tinha antecipado resultados fracos com uma queda de 50% desde os máximos nos 10.49 €/ação em 11 de novembro de 2015.

O correio postal está em declínio, a distribuição de encomendas tem muitos concorrentes e mais eficientes e o recém-criado Banco Postal, apesar dos custos terem sido baixos, não tem sido a mais-valia que se esperava, não só porque o negócio ainda tem muito caminho a percorrer até chegar ao break-even (quando a receitas ultrapassam as despesas) mas principalmente pelo momento menos favorável do setor bancário. Porém, a empresa liderada por Francisco Lacerda mantém um dividendo bastante atrativo de 0.48 euros por ação, algo que só se consegue justificar com o intuito da administração fidelizar ou agradar à estrutura acionista. Esta política de dividendos já foi adotada pela Portugal Telecom com os resultados que se conhecem, bem como pela Brisa com consequências nada positivas…

No curto prazo, uma rentabilidade elevada do dividendo ("dividend yield") na casa dos 10%, atrai investidores que procuram rendimento. Mas no médio/longo prazo, investidores que procuram estabilidade nos dividendos e crescimento da empresa tendem a afastar-se. Distribuir mais do que os resultados obtidos, não só não gera poupança para novos projetos, como retira dinheiro às poupanças que suportam o negócio ou, pior, implica aumento de dívida. Numa gestão mais prudente, com distribuição de metade dos lucros, o dividendo deveria ser de 0.20 €/ ação. Será de 0.48 euros por ação, com um payout ratio (parte dos resultados distribuídos) de quase 120%! Teve lucros de 62 milhões de euros e vai distribuir 72 milhões em dividendos! Se a principal empresa portuguesa de correios não conseguir nos próximos tempos melhorias nos resultados terá, então, apenas duas alternativas: ou mantém a sua política suicida de dividendo e a descapitalização da empresa, ou assume uma postura responsável e ajusta os dividendos aos resultados gerados.

Depois da divulgação dos resultados, a ação CTT registou um novo mínimo histórico nos 4.741€, 55% abaixo do máximo histórico. Os CTT entraram em bolsa há 3 anos a 5.52€. Onde é que já ouvimos esta história?

Paulo Rosa, Jornal "Vida Económica", 17 março 2017



sexta-feira, 10 de março de 2017

O "DEBT-CEILING" FAZ CEM ANOS EM 2017. PARA QUE SERVIU?

O "debt-ceiling" representa o limite de endividamento dos EUA. Trata-se de um limite, definido no Congresso, ao montante de dívida que pode ser contraído pelo governo federal. O primeiro limite foi estabelecido em l917, há 100 anos, nos 11,5 mil milhões de dólares. Hoje está muito perto dos 20 biliões de dólares, 1700 vezes superior ao inicial, e representa cerca de 110% do PIB norte-americano.
Em outubro do ano passado os republicanos, que eram e continuam a ser maioria no Congresso após as eleições de novembro, acordaram com a antiga administração Obama uma extensão do "debt-ceiling" até 16 de março de 2017. O acordo previa a suspensão do limite de empréstimos por parte do Tesouro norteamericano com o intuito de evitar o incumprimento e era justificado com a subida de gastos na defesa.
Para a semana esse acordo vai terminar, mas muito provavelmente o Congresso renovará a suspensão ou decidirá até aumentar o limite ao endividamento, uma vez que os republicanos estão na administração e dominam o Congresso. Mas o problema permanece e agudiza-se porque a dívida pública dos EUA está em níveis preocupantes, e poderá aumentar devido aos possíveis défices orçamentais fruto da política orçamental da administração de Donald Trump refletida na diminuição de impostos e aumento da despesa pública.
Desde 2010, a dívida pública norte-americana quase duplicou. Os entraves legais ao aumento da dívida soberana, com os seus freios e contrapesos, têm sido inócuos a ponto de não terem impedido a subida exponencial da dívida pública. Para que serve, então, a existência de um teto para a dívida plasmado na lei quando é sistematicamente quebrada essa mesma regra? Há seis anos, em julho e início de agosto de 2011, os mercados foram marcados por um receio crescente, à medida que se aproximava o dia limite do "debt-ceiling", a 2 de agosto. A volatilidade e a incerteza marcaram várias semanas estivais nas bolsas a nível mundial. Uma luta de forças no Congresso entre democratas - que não tinham a maioria, mas era deles a administração Obama e pretendiam subir o teto - e os republicanos que não cederam até a última hora em que o país iria ficar sem dinheiro para pagar aos funcionários públicos e todos os compromissos que o Tesouro norte-americano tinha assumido. Teria sido a falência dos EUA. As próprias casas de rating de crédito ameaçaram com isso mesmo, dispondo-se a cortar a notação de crédito dos EUA. A Moodys, em meados de julho de 2011, colocou sob "vigilância negativa" a dívida soberana dos EUA. Isso vem sendo feito há quase um século desde a criação dessa mesma regra. O "debt-ceiling" foi sempre sendo ajustado para cima, de acordo com as crescentes necessidades de financiamento para compensar por vezes os défices orçamentais, que seriam espelhados na subida da dívida pública...
Um ajustamento de acordo com a evolução da inflação não seria problemático, mas usá-lo para financiar o crescente e sistemático aumento da dívida pública é bastante perigoso para a economia dos EUA, que já padece de desequilíbrios ao nível orçamental e cronicamente há 40 anos a nível comercial, os denominados défices gémeos.

Em Portugal, há anos, nomeadamente desde a crise financeira de 2008 e a crise das dívidas soberanas dos países europeus periféricos, que se vem falando de um teto para a dívida pública. De uma dívida de 60% do PIB, o máximo permitido para a entrada no euro, para uma dívida de 130% do PIB, de hoje, vai um salto de gigante. Colocar esse entrave, esse teto na Constituição da República Portuguesa teria algum efeito? Não iria acontecer o mesmo que se verifica nos EUA?

Paulo Rosa, Jornal "Vida Económica", 10 de março 2017





AS DÚVIDAS DOS PEQUENOS INVESTIDORES PERANTE OS AUMENTOS DE CAPITAL

Durante o recente aumento de capital do BCP, em janeiro passado, surgiram muitas dúvidas dos investidores, muitos deles com bastante experiência no mercado e com décadas de bolsa, sobre como se processava o aumento de capital.

A maior parte das questões colocadas à sala de mercados do Banco Carregosa diziam respeito à forma como se deve calcular o valor do ajuste do aumento de capital (o destaque dos direitos), o valor teórico dos direitos (que mais não são que ações em estado "embrionário") e a pergunta mais relevante de todas e que é sempre feita quando existe um aumento de capital: vale a pena ir ao aumento de capital?

A resposta, da minha parte, é a mesma há muitos anos: acredita na empresa? No caso em concreto, acredita no banco? Acredita que o crédito malparado vai começar a diminuir? Acredita que o controlo de custos, as receitas e os lucros irão regressar ao banco? Se acha que sim, então invista.
Um investidor precisa de saber, desde logo, para que se destina um aumento de capital: é para colmatar prejuízos (imparidades) da empresa ou para investir no seu crescimento orgânico, em investigação e desenvolvimento, em novas fábricas? Os investidores com visão de longo prazo estarão menos propensos para acompanhar o aumento de capital e entrar com "capital novo" na empresa se o objetivo não for investimento. Os investidores de curto prazo pretendem apenas ganhar com as variações das cotações ao dia ou ao minuto e com a arbitragem entre preços.

Mas alguns investidores tendem a julgar o mérito da operação pelo preço: quanto menor for o preço de emissão do aumento de capital, mais baixo estarão a comprar, logo com mais benefício! A maior parte dos investidores particulares tem estas dúvidas.

Na verdade, quanto mais baixo for o preço de emissão, maior será o preço dos direitos cedidos para se poder comprar a esse preço de emissão. Estaremos a comprar ao preço de emissão acrescido do montante necessário em direitos a esse aumento de capital.

Existe a perceção errada de que quanto menor for o preço de emissão das novas ações, mais pressionados estarão os acionistas a acompanhar o aumento de capital para não verem diluída a sua posição. Mas podem sempre vender os direitos mais caros e o valor é sempre igual. O fator relevante é o montante de dinheiro que a empresa pretende levantar, e… o preço de emissão é indiferente.
O novo preço das ações após o destaque dos direitos, o aludido ajuste do aumento de capital, não é mais do que uma média ponderada: ações antigas à cotação antes do ajuste e as novas ações ao preço de emissão, a dividir pelo total de ações novas e antigas.

Paulo Rosa, Jornal "Vida Económica", 3 de março 2017



O cálculo do valor teórico do direito nada mais é do que do que a multiplicação dos números de novas ações pela diferença entre a cotação da ação após destaque do direito e o preço de emissão.



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Licenciado em Economia pela Faculdade de Economia da Universidade do Porto.