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quarta-feira, 21 de julho de 2021

O 3º trimestre é do dólar!?

Desde a última reunião da Reserva Federal norte-americana (Fed), nos dias 15 e 16 de junho, o dólar tem estado suportado pelo aumento das expectativas de uma redução na compra de ativos, mais cedo do que esperado, corroborada também pela antecipação da primeira subida das taxas de juro da Fed de 2024 para 2023, espelhada no diagrama de ‘dot plot’ da Fed. É esperado que o regresso ao trabalho de alguns americanos em setembro, impulsionado pela vacinação, fim dos subsídios e abertura dos infantários, possa acelerar a prossecução do pleno emprego, manter robusta a atividade económica e diminuir a necessidade de estímulos e, consequentemente, suportar o dólar. O balanço da Fed contraiu 15% de janeiro de 2018 a agosto de 2019 e o dólar face ao euro valorizou cerca de 13% no mesmo período. As taxas de juro da Fed subiram de 1,5% para 2,5% em 2018 e regressaram às quedas em agosto de 2019. 

No seio da Fed, cresce o número de membros que desejam uma diminuição gradual dos estímulos monetários mais cedo do que esperado, justificando a sua postura contracionista com a subida da inflação nos últimos meses. O IPC tem subido gradualmente e em junho foi de 5,4%, o valor mais elevado desde agosto de 2008. Todavia, existem membros, nomeadamente o presidente Powell, que referem o carácter temporário da inflação, em boa parte impulsionada pelos efeitos de base.

A quantidade existente de uma moeda justifica o valor da mesma. Em março do ano passado, o confinamento global ditado pela pandemia impôs uma paralisação da economia, nomeadamente da produção de bens e serviços não essenciais, para tentar suster a propagação do vírus. Nessa altura de forte queda dos mercados financeiros, a procura por liquidez aumentou significativamente e o dólar foi um dos únicos ativos a valorizar em março de 2020, a capitalizar o seu estatuto de moeda hegemónica face à preferência por liquidez dos agentes económicos. Em apenas quinze dias, o colapso dos mercados financeiros determinou a descida das taxas de juros pelos bancos centrais e o reinício dos programas de recompra de títulos para fornecer liquidez à economia. Era preciso manter salários e estruturas produtivas capazes de retomar a produção a qualquer momento, e serenidade nos mercados financeiros.

Num regime monetário de moeda-mercadoria os bancos centrais não conseguem criar nova moeda e substituir-se aos agentes económicos, nomeadamente aforradores e bancos comerciais, que deixam de alimentar o mercado monetário devido ao aumento do risco e dos receios de perderem o seu dinheiro. Apenas uma parte dos aforradores estará disposta a emprestar dinheiro e a taxas de juro elevadas que compensem objetivamente o risco. Todavia, num regime de moeda fiduciária a criação de dinheiro pelos bancos centrais é ilimitada, o seu custo é o “imposto inflacionário”, e permite-lhes fornecer toda a liquidez suficiente à economia para que esta não pare e se mantenha a paz social.

Todos os bancos centrais criaram nova moeda, mas a Fed foi a instituição monetária mais arrojada e essa política penalizou, e muito, o dólar. Por exemplo, o euro não desceu taxas [também não tinha margem!] e beneficiou do regresso da coesão à UE na distribuição de fundos pelos membros mais afetados pela crise, nomeadamente países de serviços e com um peso acrescido do turismo. A moeda americana perdeu 10% face ao euro no segundo semestre 2021. 

O ressurgimento da Covid, impulsionado pela variante Delta altamente transmissível, é visto como uma ameaça crescente ao crescimento global e o dólar é visto como um dos principais portos seguros. Este receio poderá estar a espoletar, ultimamente, a compra de dólares e posterior aquisição de dívida dos EUA e, consequente, descida das taxas de juro de longo prazo. A crescente volatilidade nos mercados financeiros também poderá suportar o dólar.

Para muitos é tempo de iniciar o ‘tapering’ do dólar. Um menor crescimento da quantidade dólares em relação a outras moedas, nomeadamente à moeda única, poderá suportar o dólar. Ademais, o BCE pretende acelerar mais a sua política monetária expansionista com a adoção de uma meta mais flexível para a estabilidade dos preços. O Dollar Index subiu de 90 para 93 no último mês. Todavia, a penalizar o dólar continuam os défices gémeos… 

Paulo Monteiro Rosa, In Vida Económica, 23 de julho de 2021



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Licenciado em Economia pela Faculdade de Economia da Universidade do Porto.