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quinta-feira, 9 de junho de 2022

Inflação do lado da oferta requer descida de impostos para mitigá-la

A descoberta de vacinas eficazes contra a covid-19, em novembro de 2020, e o início da inoculação nos primeiros meses de 2021, aliviaram os confinamentos e suportaram a reabertura das economias no ano passado. Mas dificuldades nas cadeias de abastecimento, custos de transportes mais elevados, e a subida dos preços dos metais industriais, da energia e dos produtos agrícolas a nível global, culminaram numa visível inflação do lado da oferta. E apesar do excesso de capacidade instalada, principalmente nas empresas das economias avançadas, a escassez dos ‘inputs’ necessários para a produção limitaram a oferta e têm agravado os preços. Também o aumento do rendimento disponível, impulsionado pelos apoios pandémicos dos governos, pelas poupanças propiciadas pelo teletrabalho, e por um mercado de trabalho resiliente, nomeadamente nos EUA, cuja oferta de empregos pelas empresas é quase duas vezes superior à procura, aceleraram a inflação do lado da procura. 

A pandemia foi terreno fértil para a inflação, tanto do lado da oferta como da procura, mas a guerra na Ucrânia acelerou os preços dos combustíveis fósseis e dos cereais, intensificando a inflação do lado da oferta. Se na Europa a inflação é quase exclusivamente do lado da oferta, impulsionada em boa parte pelas transição e segurança energética, nos EUA a procura também tem sido responsável pela inflação, mas é-o cada vez menos, espelhada numa desaceleração, desde meados de 2021, do sentimento do consumidor de Michigan, em mínimos de 2008, e do Conference Board. 

Em 2021 a recuperação económica global foi notável. A procura agregada aumentou significativamente e mais do que compensou a diminuição da oferta agregada, mas o inevitável aconteceu, a inflação apareceu após muitos anos de ausência. E desde o início da guerra na Ucrânia a curva da oferta agregada deslocou-se ainda mais para a esquerda, acelerando ainda mais a inflação e diminuindo o PIB potencial da economia. As políticas monetária e orçamental devem ser restritivas diante de uma inflação impulsionada pelo lado da procura, aumentando as taxas de juro e diminuindo os gastos públicos, refreando os ímpetos dos consumidores e garantindo a estabilidade de preços de novo à volta dos 2%. Mas uma inflação do lado da oferta, predominante na Europa e cada vez mais dominante nos EUA, requer uma postura de combate diferente, devido a um crescimento económico abaixo do seu potencial. É certo que é necessária uma política monetária mais restritiva para combater a inflação, como aumento de juros e contração dos balanços dos bancos centrais, mas deve ser tanto mais moderada e criteriosa quanto mais peso tiver a inflação da oferta. A subida dos juros permite também manter a robustez da moeda e mitigar a já elevada inflação importada. 

No entanto, uma excessiva alta das taxas de juro culminará numa recessão. Diante de uma inflação cada vez mais do lado da oferta, alicerçada principalmente na alta dos preços da energia, mas também dos cereais, uma política orçamental expansionista deve ser implementada, caracterizada pela descida dos impostos, mais especificamente dos indiretos e nomeadamente daqueles que sobrecarregam os combustíveis fósseis e as importações, na génese da atual inflação na Zona Euro. É certo que os preços da energia e dos alimentos básicos não processados têm um peso limitado no Índice de Preços no Consumidor, mas geram uma dinâmica de alta de preços em toda a economia e em toda a cadeia de valor, de baixo para cima, culminando numa espiral de preços mais elevados. O Parlamento da Alemanha aprovou, há dias, o aumento do salário mínimo em cerca de 22%, ou seja, mais um custo a somar na inflação do lado oferta e o ciclo vicioso é cada vez mais uma realidade.

As políticas de aumento dos juros pelos bancos centrais dificilmente reduzem os preços dos hidrocarbonetos importados, cuja procura é muita rígida. As várias políticas de combate à inflação devem, num quadro de eficiência económica, procurar uma justa repartição, pelos vários agentes económicos, desse aumento de custo dos combustíveis fósseis importados.

Por último, a inflação é também influenciada pela oferta e procura de moeda, numa alusão à teoria quantitativa da moeda. Mas os bancos centrais não cedem diretamente dinheiro ao público, são os bancos comerciais. O balanço da Fed quadruplicou de 2007 a 2014 e o seu juro foi de quase zero, mas a inflação manteve-se ancorada à volta de 1,5%. Globalização, tecnologia e ‘fábrica’ do mundo chinesa têm sido as principais variáveis deflacionistas há 30 anos.

 

PMR In Vida Económica 9 de junho 2022


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Licenciado em Economia pela Faculdade de Economia da Universidade do Porto.