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sexta-feira, 28 de maio de 2021

Défices orçamentais e MMT

Quando um Estado gasta mais do que as receitas que arrecada o resultado é um défice orçamental, mas se o acréscimo de crescimento económico nominal do país for superior ao montante deficitário das contas públicas, a dívida pública diminuirá em termos relativos. Um crescimento económico nominal de 5% consegue neutralizar um défice público de 5% e manter estável a percentagem de dívida pública em relação ao PIB nominal.

Porém, se incorrermos em défices públicos significativos e bastante acima do crescimento económico, a dívida pública subirá acentuadamente. Este quadro deficitário será tanto mais grave quanto mais débil for a economia do país em causa. Há países que podem incorrer em défices excessivos mais elevados e por mais tempo sem comprometerem consideravelmente a sua reputação económica e a confiança dos investidores. O Japão tem uma dívida de 250% do PIB nominal, mas consegue ter taxas de juro baixas, ausência de inflação, uma das principais moedas mundiais e gozar de pleno emprego. Todavia, a classificação do seu crédito de risco desceu de triplo ‘A’ há 30 anos para ‘A’, aquém dos países do norte da Europa, Austrália e EUA de triplo ‘A’, mas a dívida pública nipónica é em grande parte detida por nacionais e, atualmente, as suas multinacionais são capazes de suportar aumentos de impostos para sustentar os défices orçamentais e o envelhecimento da população, mas incorrem em crescentes perdas de competitividade e produtividade.

Os EUA são o único país do mundo capaz de emitir dólares norte-americanos e, assim, incorrer mais facilmente em défices orçamentais excessivos. Os EUA tem défices orçamentais desde 2002 e a dívida pública em relação ao PIB nominal aumentou de 60% na Grande Recessão de 2008 para 130% no quarto trimestre de 2020. Normalmente, o financiamento da sua dívida soberana tenderia a impulsionar as taxas de juros e a “expulsar” o investimento privado – efeito ‘crowding out’ - que também depende de empréstimos, culminando no abrandamento do crescimento económico, mas isso não tem acontecido.

A Teoria Monetária Moderna (MMT – Modern Monetary Theory) permite défices elevados e mais ou menos permanentes, desde que a inflação e as taxas de juros permaneçam baixas. Economistas, tanto da esquerda quanto da direita, tendem a achar isso irresponsável, mas gradualmente são cada vez mais os entusiastas. O governo nos EUA tem gastado mais, tributado menos e acumulado dívidas, mas, mesmo assim, as taxas de juros permanecem baixas, assim como a inflação, e a MMT justifica que os países que emitem as suas próprias moedas nunca podem “ficar sem dinheiro” da mesma forma que os indivíduos ou mesmo as empresas. Poucas crises orçamentais, se existiram, ocorreram em países que pedem emprestado nas suas próprias moedas e imprimem o seu próprio dinheiro. O resultado político dessa observação sobre moedas soberanas é que países como o Japão e os EUA são livres para gastar mais. A forma tradicional de pensar há muito que não existe, coletar impostos e depois decidir como gastá-lo. De acordo com a forma de pensar da MMT, em primeiro lugar o governo define como e quanto gastar.

Na MMT, um governo arrecada impostos para tornar a sua moeda soberana valiosa. Ao exigir que as pessoas paguem impostos em dólares, o governo dos EUA garante que as pessoas irão gastar, ganhar, emprestar esses dólares. Os impostos tornam os dólares a moeda de escolha, em vez de alguma alternativa como criptomoedas ou euros. A segunda razão pela qual um governo arrecada impostos num mundo definido pela MMT é para controlar a inflação - a principal ameaça - e gastos governamentais não controlados podem elevar os preços. Uma política orçamental contracionista, através do aumento dos impostos, controlará as pressões inflacionistas. Mas os governos preferem que esse controlo da inflação seja realizado pelo Banco Central por motivos de agenda política e eleitoral, mas deste modo uma subida dos juros é contrária à MMT. Se a esquerda prefere governos despesistas e vê a MMT como tal, a direita olha a permissividade da MMT em relação aos elevados défices como ‘cortes de impostos’. A MMT significa não apenas mais gastos do governo em infraestruturas e apoios às famílias, mas menor necessidade de aumentar a receita fiscal porque são permitidos défices públicos muito maiores.

Paulo Monteiro Rosa, In Vida Económica, 28 de maio de 2021



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Licenciado em Economia pela Faculdade de Economia da Universidade do Porto.