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sexta-feira, 23 de janeiro de 2015

O Tsunami Suíço

O Banco Central da Suíça voltou a ter política monetária, a 15 de janeiro de 2015, depois de a 6 de setembro de 2011 ter abdicado dela. Desde essa altura, o franco suíço estabeleceu o limite fixo de 1,2 face ao euro. Ou seja, desde setembro de 2011, a política monetária da suíça era a do Banco Central Europeu (BCE). 

Foi a decisão do BCE de prosseguir com uma política expansionista mais enérgica que levou a Suíça a abandonar a relação com o euro. Com o chamado "quantitative easing", a depreciação do euro é inevitável. Para manter a fasquia a 1.20, a Suíça teria que imprimir mais francos e aumentar, na mesma proporção que o BCE, a base monetária. A probabilidade (inevitabilidade?) de vir a sofrer um surto inflacionista, levou a Suíça a preferir ter a sua política monetária. Os bancos centrais não conseguem controlar, ao mesmo tempo, a política monetária e a política cambial. É o denominado trilema, a “tríade impossível” de controlar ao mesmo tempo a taxa de câmbio e a base monetária, independentemente de existir ou não livre circulação de capitais.

Quem tem poupanças em francos suíços, e não seja residente, deve ser cauteloso: as taxas de remuneração são muito baixas ou quase nulas e o franco suíço pode não valorizar durante muito tempo contra o euro, mesmo com uma política expansionista do BCE. De salientar que os portugueses que trabalham na Suíça e recebem em euros viram o seu poder de compra diminuir imediatamente. 

As empresas helvéticas exportadores sofrem impacto imediato. No longo prazo, além do esperado ajustamento às novas medidas, as características dos seus bens, avançados tecnologicamente, conseguem competir via diferenciação, sejam produtos farmacêuticos, seja a indústria relojoeira, clínicas e serviços médicos, entre outros. O turismo, como não é transacionável internacionalmente, poderá ser penalizado…

O erro de muitos investidores foi o de assumirem posições longas no EUR/CHF, baseados na garantia da compra de euros pelo Banco Central Suíço sempre que se aproximasse dos 1.20. Ganhavam dinheiro com a venda a 1.21 ou 1.22, porque dificilmente o euro passava estes valores. Amealhavam pequenos lucros em poucas semanas, durante dezenas de "trades" ao longo dos últimos 3 anos e perderam tudo o que ganharam em segundos – em alguns casos perderam mesmo bastante mais do que os pequenos ganhos e abriram falência. Ganhavam à principiante e acabaram por perder à campeão. 

Seria mais prudente, em virtude da tendência de baixa do euro, esperar que este subisse um pouco até 1.21 ou 1.22 e aí assumir posições vendedoras do cross EUR/CHF e fechar a posição junto dos 1.20. Os investidores que seguiram este tipo de estratégia, e se no passados dia 15 de janeiro tinham posições abertas, ganharam mais de 30%, em poucos segundos, e em posições muitíssimo alavancadas. Ou seja, o ganho foi exponencial. Fizeram fortunas… 

Uma das vantagens desta medida foi o alerta gerado quanto à alavancagem. Há irracionalidade nas elevadas alavancagens permitidas aos investidores que negoceiam Forex. É esperado um corte drástico no crédito concedido a estes produtos financeiros por partes das corretoras do mundo inteiro, depois da falência de, pelo menos, uma corretora neozelandesa. 

A medida - que provocou um tsunami nas principais bolsas e moedas mundiais - mostrou como os mercados financeiros estão desfasados da economia real. O mercado financeiro mostrou ser um gigante com pés de barro totalmente dependente de políticas monetárias inflacionistas para se sustentar. 

Uma nota final: para minorar os efeitos cambiais da medida de abandono do câmbio fixo a 1.20, o banco central da suíça desceu a taxa dos depósitos de (-0.25%) para (-0.75%), na prática um imposto de 0.75%, para desestimular a compra de francos e, assim, a moeda helvética não se apreciar muito. Duas medidas de sinal contrário. 

Paulo Monteiro Rosa, in semanário "vida económica", dia 23 de janeiro de 2015.

http://www.docstoc.com/docs/173394898/tsunami%20su%C3%AD%C3%A7o.pdf

quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

O "Quantitative Easing" (QE) do Banco Central Europeu (BCE)

O “Quantitative Easing” (QE) foi um instrumento utilizado nos EUA e no Reino Unido com reconhecido sucesso. No entanto estes países apresentam uma dinâmica económica diferente, mais favorável, da observada na Zona Euro e no Japão, além de terem começado o QE muito mais cedo.
O QE nipónico não resultou em nenhum crescimento económico e teve início em abril de 2013, praticamente quando a FED norte americana começou o “tapering” do seu QE – diminuição gradual dos seus estímulos.

Os resultados verificados na economia do Japão, com o QE do seu banco central, não deverão ser muito diferentes daqueles que deverão acontecer na Zona Euro com o QE que o BCE anunciou hoje, pelo menos no que concerne à evolução dos preços e ao crescimento económico. A economia japonesa tem algumas semelhanças à da Zona Euro, nomeadamente no que respeita à pirâmide demográfica invertida, ou seja, envelhecimento da população. No entanto a população europeia é mais propensa ao consumo que o povo japonês o que poderá resultar num comportamento mais positivo do QE da Zona Euro.

No entanto, o QE do BCE pode ficar-se pelos mercados financeiros e não chegar à economia real. Os bancos comerciais já têm um relativo acesso facilitado aos mercados. Dinheiro não lhes falta. A taxa de juro de referência do BCE é de 0.05%. Logo se os bancos não emprestam é porque, muito provavelmente, têm receio de financiar uma economia que continua débil. Os bancos centrais controlam a base monetária e não a massa monetária. Os bancos centrais não emprestam directamente à economia… Esse trabalho cabe aos bancos comerciais e aos agentes económicos, nomeadamente famílias e empresas que estejam interessadas em obter crédito, em endividar-se para consumir ou investir.

O QE japonês tinha como objectivos restabelecer o crescimento económico e criar inflação de preços. Só o segundo “target” foi conseguido, com o índice de preços no consumidor (o IPC "core", que exclui alimentação e energia) a elevar-se até aos 2%, após décadas de estagnação ou mesmo de deflação de preços.

A moeda japonesa (JPY), antes do Banco do Japão (BoJ) colocar em prática o seu QE, mantinha uma tendência de valorização em relação ao dólar americano (USD). Porém, depois da implementação do QE, e à medida que este decorria, o JPY foi perdendo valor em relação à moeda norte-americana e até ao momento já perdeu cerca de 30%. No que respeita ao mercado accionista, o principal índice nipónico, Nikkey 225, duplicou de valor desde que o início do QE, passando dos 9000 para os 18000 pontos.
Poderá acontecer o mesmo na Zona Euro? O Nikkei 225 havia desvalorizado cerca de 50%, desde 2008 até 2013. O mesmo não acontece por exemplo com o Dax de Frankfurt, o principal benchmark das bolsas da Zona Euro, que se encontra em máximos históricos. No que respeita à moeda, o euro já desvalorizou mais de 15% nos últimos 6 meses em relação ao dólar americano, logo a continuação da depreciação poderá ser menos acentuada.

Análise elaborada antes do anúncio do QE pelo BCE.

sexta-feira, 16 de janeiro de 2015

Banco Central da Suíça abandona o floor de 1.20 francos suíços por cada euro


O Banco Central da Suíça tomou, ontem, duas medidas de sinais contrários. Ao mesmo tempo que abandonava o seu objectivo de manter a sua taxa de câmbio acima de 1,20 francos suíços por cada euro, decidindo terminar com o floor que não permitia que o cross euro/franco suíço estivesse abaixo da fasquia de 1.20, tomou também a medida de diminuir a sua taxa de juro dos depósitos para uma valor negativo de (-0.75%) para desestimular a procura por francos suíços.
A redução da taxa de juro dos depósitos de (-0.25%) para (-0.75%), na prática um imposto de 0.75%, tenta contrabalançar o abandono do floor, e tem como objectivo impedir o parqueamento de mais dinheiro no Banco Central da Suíça e atenuar os efeitos do abandono do floor a 1,20, desincentivando a compra de francos.
Em suma, com o desaparecimento do floor o câmbio euro/franco suíço tende a descer, provavelmente, para níveis perto da paridade, mas com uma maior penalização dos depósitos a procura por francos pode ser travada e a descida não ser tanto acentuada e, assim, minorar efeitos imediatos no turismo e nas empresas exportadoras helvéticas.

Na prática as duas medidas anulam-se mutuamente, mas será agora o mercado a ditar qual delas terá maior impacto e onde o cross entre as duas moeda encontrará o seu equilíbrio. É, então, uma política estéril? Não necessariamente, porque na realidade já não fazia grande sentido manter essa fasquia após a forte depreciação do euro nos últimos 6 meses.

O Banco Suíço tomou a medida do floor a 1,20 em Agosto de 2011 devido à crise das dívidas soberanas da Zona Euro ter despoletado uma procura por moedas refúgios, por parte dos detentores de euros, nomeadamente por portos seguros como o franco suíço. A moeda helvética tinha na altura valorizado mais de 30% em relação ao euro, de cerca de 1.50 para 1.10. O Banco Central da Suíça mantinha, a partir dessa data, a taxa de câmbio artificialmente acima dos 1.20, com a justificação de que estava a proteger o seu mercado exportador – em boa verdade, a Suíça exporta bens competitivos extra-preço, logo a taxa de câmbio tem uma relevância menor, no entanto a mainstream, a corrente dominante, defende que se deve influenciar a evolução das cotações das moedas, e muitas vezes também é preciso satisfazer pretensões de certos sectores influentes.
Se a política do floor não existisse, o câmbio euro/franco suíço seria, hoje, provavelmente de 1, ou seja, estaria na paridade. Por isso, está aqui a justificação para a medida de sinal contrário espelhada no imposto de 0.75%, no intuito da moeda suíça não se afastar muito dos valores dos últimos 3 anos e, assim, manter a estabilidade.

As yields - as taxas de juros implícitas, rentabilidades das OT - das obrigações do tesouro suíço a 10 anos já estavam a 0.16% há 2 dias atrás e neste momento cotam a 0.07%. Qualquer dia quem emprestar dinheiro, a 10 anos, à Federação Helvética ainda terá que pagar, ou seja, receber menos na maturidade que o montante que investiu...

De salientar que a Suíça poderia fazer este tipo de política ad eterno, porque se tratava da apreciação da sua moeda, logo pode vender infinitamente francos suíços imprimidos na sua máquina de fazer notas, que só eles têm para fazer francos, e trocá-los por euros... e assim não permitir a apreciação da sua moeda. No entanto, o balanço do Banco Central da Suíça está inundado de euros, uma moeda, um activo que desvalorizou cerca de 15% no último ano, criando algum desconforto actualmente nas suas contas e explica, em parte, a tomada da medida de acabar com o floor a 1.20 quando se aproxima a importantíssima reunião do Banco Central Europeu no próximo dia 22 de janeiro.
Os países que tentam segurar a sua moeda, cuja tendência é de baixa devido aos fundamentais das suas economias, através de um peg (fixar o câmbio), principalmente em relação ao dólar, não o podem fazer eternamente, porque a sua moeda se deprecia e eles têm que vender as divisas, as moedas que têm em carteira, e comprar a sua moeda para a apreciar e trazê-la para o peg definido. Mas as reservas em moeda estrangeira não são inesgotáveis, um dia acabam e estes países perdem as reservas e perdem o peg. Políticas erradas que os países da América Latina, e de outras geografias e latitudes, muitas vezes seguem e acabam por ser penalizados. Um veneno altamente letal…

Muitos economistas defendem que os pegs são positivos porque, assim, as empresas exportadoras e os agentes económicos sabem quanto vão receber, sem existirem significativos riscos cambiais (a não ser em relação à moeda na qual se fixa o valor que varia no mercado, caso do dólar americano). No entanto há um desvirtuamento do mercado, enviesamento que um dia será corrigido e o ajuste terá prejuízos muito mais elevados que os benefícios que se foram colhendo ao longo do tempo com o peg, além de ter custos para o Estado, devido ao exaurir das reservas que depois podem ter que ser compensadas, infelizmente e mais uma vez com custos para o contribuinte, através do aumento de impostos. Mesmo que a subida de imposto não aconteça, dificilmente os agentes económicos, nomeadamente famílias e empresas, escaparão do imposto inflacionário...

Qual a justificação para o Banco Central da Suíça ter abandonado esta política? O euro vinha a perder terreno em relação a todas as majors, principais moedas mundiais, nomeadamente no que concerne ao dólar americano. Os comentários de Mário Draghi, presidente do Banco Central Europeu, nos últimos 6 meses têm contribuído para a forte depreciação do euro. Draghi tem reafirmado constantemente que fará tudo o que estiver ao seu alcance para afastar o "demónio" da deflação. Também as perspectivas quanto à tomada de políticas inflacionistas mais enérgicas por parte de Draghi, já na próxima reunião do Banco Central Europeu, no dia 22 de janeiro, contribuem para a queda do euro face ao dólar americano.

Os bancos centrais ao alterarem as suas taxas de juro, influenciam directamente o nível dos juros nos mercados monetário e de capitais, e ao criarem dinheiro economicamente "falso" - leia-se não respaldado, não reflectido no aumento da produção, na existência de mais bens e serviços, no aumento do PIB, apesar de, obviamente, ser dinheiro legal pelo direito positivo, emanado pelas leis de um Estado de Direito - contribuem para a desestabilização cambial e para a contínua guerra cambial... O valor da moeda deve ser encontrado no mercado e não influenciado pelas autoridades monetárias. A não ser que os bancos centrais sejam uns iluminados… iluminados por uma qualquer entidade divina. Além destas medidas dos bancos centrais poderem desvirtuar a realidade.
Não seria mais salutar alterar o stock de moeda apenas quando temos um aumento do PIB? Ou nem sequer alterar e manter ad eterno o mesmo stock? Sim, teríamos deflação dos preços dos bens e serviços, mas essa realidade não seria um problema. No entanto os agentes económicos, muito provavelmente, não estariam mentalizados para essa mesma realidade... Mas adaptavam-se.

O problema da Zona Euro está espelhado no envelhecimento da sua população, na ausência de recursos energéticos, no rígido mercado laboral, na produtividade cada vez menor, na falta de uma estratégia comum, na fraca produtividade do trabalho – nomeadamente nos países do sul - e não é, obviamente, com políticas monetárias, influência das taxas de juro por parte de Mário Draghi que o trabalho, de um dia para o outro, se torna mais produtivo. Mas a mainstream aplaude estas políticas e refere que já vêm tarde, e não deixam de ter razão no curto prazo, o problema são os efeitos secundários no longo prazo destas decisões. Continuamos a olhar para a floresta com a mente de um pirómano. É como dar a um doente um medicamento para a gripe quando ele teve um enfarte do miocárdio…


Paulo Monteiro Rosa, economista, 15 de Janeiro de 2014

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Licenciado em Economia pela Faculdade de Economia da Universidade do Porto.