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sexta-feira, 13 de março de 2020

Imobiliário suportará impactos do covid-19 e do petróleo?


Uma segunda-feira negra para os mercados, com quedas semelhantes a outubro de 2008, após a falência da Lehman Brothers, a 14 de setembro. O setor energético na Europa foi o mais penalizado com uma queda de 15%.

A agudização do covid-19 na Europa e nos EUA e a alteração de estratégia da Arábia Saudita estiveram na origem destas quedas. Depois de não ter sido alcançado um corte de produção na reunião da OPEP+, numa reviravolta, os sauditas decidiram aumentar a produção de petróleo e forçar os preços em baixa, confrontando a Rússia, que novamente decidiu manter a sua produção. Esta guerra por quotas entre a Arábia Saudita e a Rússia pressionou a cotação do petróleo para metade dos preços de há dois meses, num reflexo, talvez, de reação também ao coronavírus e ao previsível abrandamento da atividade económica. Ganham as economias importadoras, mas as empresas de energias renováveis, de "shale oil" e "oil sands" são as mais penalizadas com os preços do petróleo nestes níveis.

As obrigações do Tesouro alemão, britânico, suíço e norte-americano foram dos poucos ativos que subiram, um "safe haven" num momento de fortes perdas.

As rentabilidades da Bund alemã a 10 anos registaram mínimos históricos nos -0,90%, e a Gilt britânica nos 0,075%.

Os bancos centrais continuam a reforçar as suas políticas expansionistas, e na quarta-feira o Banco de Inglaterra desceu a sua taxa de referência em 50 pontos, para os níveis históricos de 0,25%. Nos EUA é esperado que a FED reduza as taxas em 75 pontos, dos 1,25% para 0,50%, na FOMC de 18 de março.

Mas o mercado imobiliário nos EUA continua ao rubro, nomeadamente a aquisição para revenda de imóveis que são restaurados. Em 2019 foram investidos 32,5 biliões de dólares, em quase 250 mil casas e condomínios unifamiliares restaurados, um aumento de 21% em relação a 2018, máximo dos últimos 13 anos.

O número de licenças para construção, acima de 1,5 milhões, está em máximos desde a crise financeira de 2008. No entanto, a venda de casas usadas parece ter estagnado, e mantémse, nos últimos quatro anos, em tomo dos 5,5 milhões. Em meados de 2010 registou-se o valor mais baixo de 3,5 milhões de casas alienadas. No final de 2005 estes números registavam máximos históricos acima das sete milhões de casas vendidas mensalmente.

As taxas de juro do crédito à habitação nos EUA têm descido. Há um ano a taxa de juro fixa a 30 anos de uma hipoteca era de 4,62%, e de acordo com os últimos números conhecidos, a 4 de março e segundo a "Bankrate Data", desceu para 3,56%, uma queda superior a um ponto percentual.

Devido ao alastrar do coronavírus, as recentes quedas para mínimos históricos das rentabilidades das obrigações do Tesouro norte-americano, indiciando abrandamento ou mesmo recessão económica, podem redundar numa queda das taxas de juro do crédito à habitação, com o estreitar do spread entre as yields das T-Bonds, que registaram mínimos históricos esta semana nos 0,32% a 10 anos e abaixo de 1% a 30 anos, e as taxas de juro das hipotecas, e, assim, aliviar a hipotética pressão do covid-19 sobre o mercado mobiliário norte-americano.

No entanto, no mercado da aquisição para revenda de casas restauradas, o lucro médio bruto de quase 63 mil dólares traduz-se num ROI de 40,6% para os investidores. O ROI, ganho obtido de acordo com o investimento inicial, foi de 45,8% em 2018 e 51,4% em 2017. Os retornos mais recentes caíram para níveis nunca vistos desde 2011. O custo de aquisição de um imóvel continua a aumentar mais rapidamente do que os ganhos obtidos na revenda. A resiliência do mercado imobiliário começa a espelhar ligeiras fragilidades, designadamente no mercado de casas restauradas. Os preços das casas desceram dos 5% de crescimento anual durante 4 anos, desde 2015 a 2018, para 2,85% no final de 2019. Podem os preços das casas começar a cair, e isso poderia ser acompanhado por uma recessão, devido ao coronavírus? Ou será o mercado imobiliário, alimentado pelas quedas significativas das taxas de juro, a suportar os prejuízos provocados pelo covid-19 e pelas cotações do petróleo?

Paulo Rosa, In "Vida Económica", 13 de março 2020



Era uma vez na América...

A agudização do Covid-19, o inesperado desacordo no seio da OPEP+ e as crescentes restrições à circulação arrastam bolsas para mínimos.

Se o mercado já estava fragilizado, a decisão de Donald Trump de suspender a entrada de europeus nos EUA durante 30 dias, muito provavelmente, acabou por "decretar" o bear market e a recessão económica. Os EUA representam 25% do PIB global, a UE 21% e a China 16%, três geografias que detêm quase 2/3 da economia mundial seriamente afeadas por este surto viral.

O comércio internacional, tão caro a Adam Smith nas vantagens absolutas e a David Ricardo nas vantagens comparadas, parece estar comprometido no curto prazo.

O isolamento das pessoas é fundamental para refrear a propagação do coronavírus e a saúde pública sobrepõe-se a qualquer outra variável, mas espera-se que as medidas surtam o efeito desejado. Estamos perante um difícil trade-off, e aguardemos que o adágio "não morre da doença, morre da cura", por falta de abastecimento de mantimentos e medicamentos, não seja uma realidade para nenhuma pessoa.

Os investidores estão a reviver as semanas que se sucederam à queda do Lehman Brothers a 14 de setembro. O outubro negro de 2008, espelhado nas significativas perdas diárias, só observadas em 1929. Um índice acionista paradigmático do aconteceu nesse fatídico outubro de 2008, foi o alemão DAX 30, que registava sucessivas quedas diárias à volta dos 10%.

Os profits wamings crescem a ritmos crescentes. O mercado aguarda com expectativa e bastante apreensão os resultados das empresas relativos ao primeiro trimestre e os números macroeconómicos referentes ao corrente mês de março, desde postos de trabalho criados, taxas de desemprego, PIB, Tendas a retalho, inflação e venda de casas.

Os setores do turismo, viagens e lazer são dos mais penalizados, mas as perdas são generalizadas devido às interações entre todos sectores de atividade e a quebra das cadeias de abastecimento.

Os futuros negociados da bolsa de derivados Chicago refletem um corte de 100 pontos base na próxima reunião da Reserva Federal, a 18 de março, de 1,25% para 0,25%.

O Banco de Inglaterra cortou as taxas de juro de referência em 50 pontos base, para níveis históricos, dos 0,75% para 0,25%, O BCE manteve as taxas inalteradas, mas adicionou 120 mil milhões de euros, até ao final do ano, para aquisição de dívida, nomeadamente privada. Atualmente, as compras são de 20 mil milhões de euros mensais. Lagarde apela a estímulos orçamentais.

As taxas de juro de longo prazo das principais economias desenvolvidas, com melhores capacidades creditícias, atingem sucessivos mínimos históricos, antecipando um forte abrandamento ou mesmo recessão económica. As rentabilidades a 10 anos das obrigações do tesouro americano, as T-Bonds, registaram mínimos nos 0,32%, as Gilt do Reino Unido a 10 anos nos 0,075% e a Bund alemã a 10 anos nos -0,90%.

Paulo Rosa, Jornal Económico, 13 de março 2020





sexta-feira, 6 de março de 2020

OS JUROS DO MEU AVÔ MATERNO


No dia 29 de fevereiro, o sentimento dos empresários chineses do setor transformador, medido pelo PMI industrial, caiu dos 50 para os 35,7 pontos, o número mais baixo desde que existe compilação destes valores, significativamente inferior aos piores números verificados durante a crise financeira global entre 2008 e 2009, quando este dado se manteve no intervalo de 38,8 a 45,3 pontos.

Estes registos espelharam fragilidade não apenas na produção, que foi bastante fraca nos 27,8, mas também nas encomendas relativas às exportações que se fixaram nos 28,7. As encomendas domésticas caíram para os 29,3 pontos. As medidas para tentar conter o Covid-19 não interromperam apenas a produção, mas quebraram também a cadeia de produção, o que ajuda a explicar a queda abrupta destes dados.

É provável que a epidemia já tenha atingido o seu ponto de inflexão na China, mas, mesmo que a produção industrial chinesa recupere em março, ainda enfrentará o risco de um nível baixo de encomendas para exportação. Isso ocorre porque a cadeia de abastecimentos continuará fragilizada, uma vez que na Coreia do Sul, no Japão, na Europa e nos EUA o Covid-19 apareceu mais tarde, e provavelmente estes países ainda estão longe do ponto de inflexão. As exportações chinesas continuarão, portanto, fracas no primeiro trimestre e, possivelmente, essa debilidade estender-se-á ao segundo trimestre. Perante estes cenários, a FED desceu extraordinariamente a sua taxa de juro de referência em 50 pontos, dos 1,75% para 1,25%, algo que não acontecia! desde 16 de dezembro de 2008.


Atualmente, segundo os futuros negociados na bolsa de derivados de Chicago, são esperados mais três cortes de taxas: na próxima reunião de 18 de março e com uma amplitude de 25 pontos, um segundo corte na FOMC seguinte, a 29 de abril, de 25 pontos, e um terceiro também de 25 pontos no início do segundo semestre, isto ê, corte total, em 2020, de 125 pontos base, de 1,75%, no início do ano, para 0,50% no final de 2020.

A rentabilidade das obrigações do Tesouro americano a 10 anos cota nos 0,93%, o valor mais baixo de sempre, refletindo a crescente preocupação dos investidores, que apostam em taxas de juro baixas por um longo período de tempo. O anterior valor histórico havia sido de 1,40%, em meados de 2012, quando as "Fed Funds Rate" se encontravam nos valores mais baixos de sempre, entre 0% e 0,25%. Mas, desde o corte da FED, a yield da T-Bond alO anos encontra-se acima da yield daT-BiU (bilhetes do tesouro americano) a três meses, nos 0,85%, não sinalizando recessão económica. Porém, a curva de rendimentos nos EUA é horizontal, indiciando um abrandamento económico. A yield da Gilt alO anos, no Reino Unido, cota em mínimos históricos, nos 0,335%.


A Goldman Sachs prevê agora que o BCE reduza a sua taxa de depósito em 20 pontos até ao final do ano, dos -0,50% para -0,70%, o BoE em 25 ou 50 pontos, o BoJ em 10 pontos, dos atuais -0,10% para -0,2%, o sueco RiskBank de 0% para -0,1% e o Banco Nacional da Suíça de -0,75% para -1%. Será suficiente para que as empresas escapem a um considerável abrandamento?

O meu avô costumava dizer-me que os juros comiam connosco à mesa. Outros tempos, outras realidades. Hoje, os juros ficam à porta da sala de jantar e por vezes servem à mesa!

Os mercados financeiros vão ser alimentados por este reforço de liquidez, e os arivos de risco deverão continuar a beneficiar do efeito TINA (There Is No Altemative).

Podemos, momentaneamente, ter a perceção de que o coronovírus se cura mais depressa com políticas monetárias extremamente expansionistas do que com a procura de uma vacina eficaz. Provavelmente, o vírus causará mais danos à economia do que à saúde pública, e o crescente receio quanto a uma pandemia está a ser potencialmente mais perigoso para a economia do que o vírus irá alguma vez ser. E... em suma, as restrições à circulação de pessoas têm um impacto substancialmente negativo na economia.

Paulo Rosa, In Vida Económica, 6 de março




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Licenciado em Economia pela Faculdade de Economia da Universidade do Porto.