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sexta-feira, 23 de outubro de 2015

O crash de 1987, 28 anos depois


Em 1987, um dos principais índices acionistas norte-americanos, S&P500, tinha subido 42% desde janeiro até meados de agosto quando atingiu o seu máximo anual. Mas desde aí até ao "crash" da famosa "black Monday", o S&P500 perdeu cerca de metade do seu valor. Nas duas sessões anteriores ao dia 19 de outubro, a tal segunda-feira negra, as quedas agudizaram-se antes do forte tombo de 20%, que ficou para a história. Não foram só os preços que caiam, o volume também foi aumentando nas sessões que precederam o "crash", e foi bastante significativo na própria sessão.

Este movimento recorda evoluções mais recentes dos mercados acionistas. Em 1997, na bolsa portuguesa, após uma subida desde o início do ano de 60%, o PSI20 abriu no dia 28 de outubro a perder uns inimagináveis 18%, quando, no dia anterior, o índice norte-americano Dow Jones tinha perdido 6%. O PSI 20 acabou a sessão a perder apenas 6%, a aliviar das fortes perdas da abertura.

No meio de um louco "panic sell", os investidores mais experientes fizeram excelentes compras. O índice PSI20, nessa altura, cotava a 8000 pontos e na abertura do dia 28 de outubro chegou a cotar a 6500 pontos. Em 9 de março de 2000, atingiu o seu máximo até hoje nos 15080 pontos. Atualmente ronda os 5300 pontos, ou seja, perdeu quase dois terços do seu valor nos últimos 15 anos…

Nesse longínquo outubro de 1987, o mercado intensificou a desvalorização depois de se saber que as fusões deixariam de ter benefícios fiscais. O anúncio de um défice comercial norte-americano acima do esperado contribuiu para a queda do dólar e levou o mercado a antecipar uma subida das taxas de juro. Na sessão do dia 19 de outubro de 1987, os investidores começaram o dia a vender massivamente.

Há anos que vinham sendo implementados nos mercados financeiros programas informáticos para se poderem negociar rapidamente grandes quantidades de títulos e, neste dia, os programas que controlavam as ordens "stop loss" libertaram um grande número de ordens que fizeram disparar outras e intensificaram a queda. O próprio sistema informático da NYSE teve problemas devido à enorme avalanche de ordens, deixando os investidores desorientados. No final do dia o Dow Jones perdia 23%, a maior queda diária de sempre até aos dias de hoje. A queda havia chegado à praça de Lisboa dias antes, a 13 de outubro, após as declarações do Primeiro-Ministro da época, que numa entrevista à televisão no serão anterior, afirmou que na bolsa se anda a vender "gato por lebre".

Estas quedas abruptas dos índices nada mais são do que um reflexo, e uma correção, às exponenciais subidas verificadas nos meses anteriores. O S&P500, após o "crash" de 19 de outubro de 1987, continuou na senda dos ganhos, ou seja a tendência de alta - o "Bull Market" permaneceu intacto, com mais uma forte correção em outubro de 1998, até o rebentar da bolha das "dotcoms" em 2000. Atingiu o máximo nos 1553 pontos no dia 28 de março. Ainda em 2015, tivemos um exemplo idêntico com a queda dos principais índices chineses, Shanghai e Shenzhen. Se são apenas fortes correções para tomar fôlego para novas subidas só o tempo o dirá…

O PSI20 teve as correções de 1997 e 1998, no meio de uma frenética e desconhecida, até então, bolsa tecnológica NASDAQ que não parava de subir há anos, para respirar e ganhar mais alguma força até ao rebentar da bolha das "dotcoms" em 2000, que arrastou todas as bolsas mundiais para quedas consideráveis durante quase três anos.

Os "crashs" são fortes correções que podem ser ou não o rebentar de bolhas. São descidas significativas que por vezes sinalizam distorções entre as cotações das empresas e os seus fundamentais. As diferenças entre um "crash" e uma "bolha" são essencialmente de cariz temporal e mudança de tendência. Os "crashs" são quedas agressivas pontuais, enquanto a implosão de "bolhas especulativas" representam a alteração da tendência, correção contínua e duradoura, de vários anos, sempre ligada à afluência de dinheiro fácil, muitas vezes via bancos centrais. São o fim de um ciclo de mercado altista, de um "Bull market" para um novo ciclo de tendência de baixa, "Bear market", que originam muitas vezes crises financeiras que podem chegar à economia real. Estará a acontecer o mesmo nos mercado acionistas chineses? Os preços das ações chinesas espelham o valor das empresas? Foi um "crash" ou será o rebentar de uma bolha? São mercados demasiadamente herméticos… só o futuro nos poderá responder a esta questão.

Paulo Monteiro Rosa, 23 de outubro de 2015




sexta-feira, 9 de outubro de 2015

UMA RECEITA PARA UM CRESCIMENTO SUSTENTÁVEL: CONSUMO OU INVESTIMENTO?

O consumo é um fim em si mesmo. Corresponde à satisfação das necessidades económicas das pessoas e organizações, através de bens e serviços. É o consumo que permite às empresas escoar os produtos e rentabilizar a sua atividade.

No entanto, se todo o dinheiro for destinado ao consumo, não haverá poupança e, sem ela, não há investimento. Se alguém consumir todas as batatas que produziu, não terá nenhumas para semente, nem dinheiro para a aquisição de bens de capital para modernizar os utensílios agrícolas e rentabilizar a produção. No ano seguinte, não terá batatas para consumir nem para vender. Um agricultor com um trator é mais produtivo do que dez com uma enxada, e estes mais produtivos que cem sem qualquer ferramenta.

É por isso que tem que existir uma ponderação entre consumo e poupança. Tudo o que for consumido não pode ser poupado. O rendimento disponível das famílias que não seja utilizado na aquisição de bens de consumo será poupado e pode ser investido na aquisição de bens de capital e aumentar os estágios de produção. Algumas empresas, nomeadamente as que vendem ao público e se posicionam no último estágio, serão penalizadas pelo aumento da poupança pois venderão menos, mas a economia como um todo será mais que compensada com o surgimento e crescimento de empresas que produzem bens de capital, que investem em Investigação e Desenvolvimento (I&D) e em meios de produção mais avançados tecnologicamente. A economia sairá bastante mais fortalecida e o crescimento será mais sustentável.

Como surgiram os "smartphones"? Como apareceram medicamentos mais eficazes? Com investimento, todo ele resultante da poupança real de alguém. O dinheiro criado pelos bancos centrais é apenas papel ou dígitos num computador, e não
uma nova ferramenta para um investigador utilizar, uma serra inovadora para um carpinteiro...

Imaginemos alguém que se perde numa floresta e durante alguns dias, perante o seu instinto de sobrevivência, alimenta-se de frutos que vai encontrando, apenas consome e espera pelos meios de socorro. Se recolher o máximo de frutos possíveis para ter tempo para construir uma arma de caça ou uma canoa (bens de capital, ou seja investimento), as suas hipóteses de sobrevivência aumentam significativamente. 

Países com elevadas taxas de poupanças são mais propensos a investimentos baseados em I&D. Países com baixas taxas de poupança têm que pedir emprestado para realizar os seus investimentos dependentes do exterior. A taxa de juro, caso não fosse definida pelos bancos centrais, seria encontrada no mercado entre quem adia o consumo e poupa e aqueles que consomem. Quando os bancos centrais descem as taxas de juro, mais dinheiro tende a afluir aos mercados financeiros, repercutindo-se mais tarde em bolhas. Caso chegue à economia real, são maioritariamente canalizados para investimentos com retornos bastante rápidos, como o imobiliário, criando desta maneira também bolhas…

Na ótica da despesa, o cálculo do PIB tem várias varáveis: Consumo, Investimento, Gastos Públicos e Exportações, subtraindo as importações (Y=C+I+G+X-M). Os Gastos Públicos afastam muitas vezes o setor privado da atividade económica, através do aumento dos impostos ou via mercado monetário com a subida das taxas de juro, o denominado efeito "crowding-out". A gestão pública é tendencialmente mais displicente que a gestão de uma empresa privada, porque quando se trata do nosso dinheiro todos os cuidados são poucos. As exportações são fundamentais, mas o investimento acaba por ser a pedra basilar de qualquer economia. Sem capital, a humanidade ainda estaria, muito provavelmente, na pré-história. Como referiu o economista francês, Jean-Baptiste Say, "a oferta cria a sua própria procura".

Na teoria keynesiana, um aumento do consumo público é fundamental para estimular uma economia debilitada. Porém, numa economia pequena e bastante aberta como a portuguesa é provável que um aumento dos gastos públicos, para estimular o consumo privado, redunde no aumento da procura de bens importados. Quando muito, numa economia que é "price maker" como a chinesa ou a norte-americana, a esterilidade desta política pode ser menor.

Paulo Rosa In Vida Económica, 9 de outubro de 2015





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Licenciado em Economia pela Faculdade de Economia da Universidade do Porto.