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sexta-feira, 25 de setembro de 2015

Como a falta de ética pode derrubar gigantes


Na passada segunda-feira, foi conhecido um facto que marcará a história do setor automóvel mundial e entrará para os livros de escândalos no mundo dos negócios: o caso do software que manipulava desde 2009 os testes de emissões poluentes dos carros a gasóleo da Volkswagen. Este escândalo assustou os investidores e ressuscitou o fantasma da manipulação de procedimentos nas empresas, caros à crise financeira de 2008.

A empresa referiu que 11 milhões de veículos por todo o mundo estão envolvidos no caso da manipulação ambiental. As coimas podem atingir os 20 mil milhões de dólares para a Volkswagen que, antes da abertura do mercado na segunda-feira, valia em bolsa cerca de 75 mil milhões de euros. Não foi só a cotação da Volkswagen que perdeu - quase 40% em dois dias - foi todo o setor dos fabricantes de automóveis, incluindo os europeus, com a Peugeot, por exemplo, a cair cerca de 20%. E os investidores perguntam-se quantos mais casos semelhantes haverá em todos os setores económicos?

Quando se trata de dinheiro dos outros, a sua gestão pode ser tendencialmente displicente, como aconteceu com muitos bancos que estiveram na origem da crise financeira de 2008. Em 2002, a gigante de telecomunicações norte-americana WorldCom, segunda maior dos EUA no que concerne a ligações de longa distância, faliu, inesperadamente, com fortes perdas para os acionistas, apesar de ser considerada uma empresa de referência. Os executivos da empresa tinham inflacionado em 12 mil milhões de dólares as contas da empresa. Foi a maior falência de sempre nos EUA e o CEO foi condenado a 25 anos de prisão.

Nas empresas cotadas uma boa parte da remuneração dos gestores, muitas vezes, depende dos resultados financeiros da companhia e é paga com ações da empresa. É indisfarçável o conflito de interesses latente entre gestores e proprietários, entre o real desempenho da empresa e a contabilidade dissimulada que enviesa os resultados.

Os gestores tenderão a ser mais propensos à obtenção de lucros rápidos muitas vezes pouco sustentáveis, nem que para isso, tenham que alterar resultados com a conivência de vários "stakeholders" da empresa, ou perante a cegueira dos órgãos de fiscalização interna. Os bónus em ações da empresa são um incentivo para que os responsáveis empresariais com menores escrúpulos manipulem dados contabilísticos que catapultam a cotação das ações e assim valorizar as que têm em carteira e que receberam como prémio.

Erradicar este tipo de atuação é virtualmente impossível, mas muitos casos poderiam não existir se os donos das empresas (acionistas) e os órgãos de fiscalização internos escrutinassem a gestão. A captura de valor por parte dos gestores em detrimentos dos donos das empresas cotadas pode condicionar uma gestão assente na ética.

Na origem deste problema, estarão acionistas com uma visão mais especulativa do que de investimento em relação ao negócio da empresa. Uma visão mais de curto-prazo do que longo-prazo coloca uma considerável pressão sobre os gestores das empresas para gerarem lucros rápidos, usando qualquer método para os alcançar, incluindo atropelos à ética. O controlo interno também pode falhar e por isso é auxiliado pelas auditorias externas. Porém, quando a pressão é demasiada, esta também é exercida sobre as empresas de auditoria e sobre os Revisores Oficiais de Contas (ROC).

Paulo Rosa, economista, In "Vida Económica", 25 de setembro de 2015.

segunda-feira, 14 de setembro de 2015

A FED subirá taxas a 17 de setembro?

Depois de mais de um ano a descerem, desde o final do mês de janeiro as taxas de juros das "t-bonds", obrigações do tesouro norte-americano, têm subido sustentadamente, nomeadamente nos prazos mais longos, a 30 e 10 anos, sinalizando uma maior probabilidade de subida de taxas por parte da Reserva federal norte-americana (FED).

As taxas de juro de curto prazo, negociadas no mercado monetário e denominadas de "LIBOR" (London Interbank Bank Offer Rate), neste caso do dólar americano (USD), quer sejam as maturidades a 1 mês, 3 meses, 6 meses ou 12 meses subiram cerca de 40% desde o início do ano, o que espelham um aumento da expectativa de subida da taxa de juro de referência da FED.

As taxas de juro de longo prazo, transacionadas no mercado de capitais, plasmadas nas "yields" (taxas implícitas) das obrigações do tesouro, neste caso norte-americano, também registam uma subida desde o início do ano. Ambas as taxas, quer do mercado monetário, quer do mercado de capitais indiciam uma subida das taxas de juro por parte da FED, mais cedo ou mais tarde…

As taxas de juro de referência da FED subirão na próxima reunião no dia 17 de setembro? Neste momento está a 0.14% e varia no intervalo [0%-0.25%]. A probabilidade de subida de 25 pontos base para os 0.50%, segundo a CME Group FedWatch, é hoje de 24%. No entanto há um mês era de 54%. Os dados macroeconómicos chineses, e em parte dos EUA, bem como a incerteza provocada pela volatilidade e pela significativa queda das bolsas chineses, mas também com alguma expressão as descidas registadas nas praças dos EUA e da Europa, contribuíram para uma redução da perceção de subida das taxas de juros por parte da Reserva federal norte-america, a "FED FUND RATE", e que é facilmente corroborado no quadro abaixo.














O Banco Central Europeu (BCE), depois da reunião no passado dia 3 de setembro, reforçou a continuação da sua expressiva e vigorosa política monetária inflacionista, que poderá estender-se para lá do mês de setembro de 2016, data estabelecida para o término do programa de compra de ativos (QE, "Quantitative Easing"). O BCE estima que o Índice de Preços no Consumidor (IPC) se mantenha bastante aquém dos 2%, meta estipulada pelo tratado da União Europeia, e se assista a deflação de preços até ao final deste ano. Estes dois fatores reduzem também as probabilidades de alterações das taxas de juro por parte da FED nas suas próximas reuniões (FMOC, "Federal Open Market Committee"), porque em caso de subida da taxa de juro directora da FED, o EUR/USD tenderá a ser arrastado para números abaixo da paridade. Poderemos assistir a políticas monetárias contrárias entre os dois maiores blocos económicos mundiais, os EUA e a Zona Euro, sendo responsáveis por mais de metade da riqueza produzida a nível mundial? A FED com uma política monetária marcadamente contracionista ("Tightening") e o BCE com uma política monetária vigorosamente expansionista ("Loosening"), é pouco provável que venha a acontecer…

Paulo Rosa, In Vida Económica 11 de setembro 2015







sexta-feira, 4 de setembro de 2015

LUTAR OU FUGIR?

Os títulos das notícias de bolsa não enganam: "o pior mês do ano da Bolsa de Lisboa", "a pior semana nos EUA desde 2011" e podíamos continuar...

Os alertas não são de agora. Vêm, pelo menos, desde 2014, quando os sinais de correção estavam implícitos: o imobiliário na China e em Hong Kong está a níveis exorbitantes há vários anos; nos EUA já se encontra aos níveis de 2006, perto do auge antes da crise do "sub-prime"; o esmagamento das taxas de juro pelos principais bancos centrais do mundo, quer através de agressivas políticas monetárias inflacionistas, quer por via da cedência de liquidez aos bancos, os sucessivos "Quantitative Easing" (ou programas de compras de ativos), bem como a descida das taxas de juro de referência para valores praticamente de 0% (algumas são mesmo negativas) contribuíram para descidas artificiais em terreno nunca experimentado.

A desvalorização recente da moeda chinesa, o vuan-renminbi, não é mais que um reflexo da desvalorização consecutiva do dólar americano (USD), do iene japonês (JPY) nos últimos anos e da queda do euro no último ano, tudo reflexo dos "Quantitative Easing" e das descidas das taxas de juro pelos bancos centrais destas zonas económicas.

As autoridades chinesas estão apenas a ajustar a sua moeda às principais moedas mundiais. No entanto, esta atitude demonstra também a fraqueza a que se assiste na China, plasmada na correção dos mercados acionistas e no abrandamento, para mínimos dos últimos seis anos, do forte ritmo de crescimento da produção industrial a que todos estavam habituados.

O preço das matérias-primas em mínimos espelha a diminuição da procura mundial. O petróleo cotado nos EUA, o WTI de Nova Iorque, desceu, pela primeira vez desde 2009, abaixo dos 40 USD/Barril. A cotação do petróleo desce há quase nove semanas consecutivas, o maior ciclo de quedas desde 1986, tendo apenas observado um interregno na semana passada.

No 2º trimestre do ano os lucros das empresas do S&P500 cresceram ao ritmo mais baixo dos últimos seis anos. Os lucros subiram em média apenas 0.07 USD/ação relativamente ao trimestre homólogo de 2014.

A preocupação da Reserva Federal dos EUA, para além do "timing" da subida das taxas de juro, passou a ser a baixa inflação e o abrandamento económico quer norte-americano, quer chinês. A bolsa de Shanghai registou, há uma semana, a maior queda desde 2007.

O que os investidores devem fazer agora? Lutar ou fugir? Perante a forte queda das bolsas americanas muitos investidores, que até agora mantinham firmes as suas carteiras, não acreditando que os mercados podem encetar uma correção a qualquer momento, entraram em pânico e quiseram desfazer-se de todos os títulos. É a atitude típica do "panic sell".

O ser humano é dotado de uma parte primitiva junto ao tronco cerebral, o complexo reptiliano, uma ferramenta de sobrevivência, que nos diz, perante uma ameaça, se devemos lutar ou fugir. O investidor que não consegue lidar com estes sinais emanados do cérebro entra em pânico, tendo dificuldade em perceber se perante a queda deve fugir, vendendo tudo, ou enfrentar a correçáo esperar por um "pullback", uma recuperação em alta. Mesmo assustado, o investidor não deve descurar o seu instinto de sobrevivência: lutar ou fugir? Ele existe para o ajudar. Jamais deve entrar em pânico, sob pena de ser mal sucedido...

Paulo Rosa, In Vida Económica, 4 de setembro. Escrito dia 1 de setembro.

 



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Licenciado em Economia pela Faculdade de Economia da Universidade do Porto.