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sexta-feira, 27 de maio de 2022

Inflação condiciona nível da ‘Fed Put’?

Até onde a Reserva Federal dos EUA (Fed) tolera uma queda dos mercados acionistas? Onde está atualmente a ‘Fed Put’? Uma ‘put’, ou seja, uma opção de venda é muitas vezes utilizada como cobertura de risco num cenário de indesejada volatilidade do mercado que afeta negativamente o desempenho de uma carteira. Uma opção de venda, cujo subjacente é um índice acionista, é um seguro contra a queda das ações. Nas últimas décadas, os investidores habituaram-se à atuação pontual da Fed para travar a quedas dos mercados acionistas. Uma significativa desvalorização das ações retira liquidez aos mercados, diminui o rendimento disponível e, se persistente e acentuada, acaba por penalizar o crescimento económico. Sendo assim, os investidores procuram quaisquer sinais para identificar o ponto a partir do qual é ativada a ‘Fed Put’, isto é, a partir do qual a queda do mercado estaria coberta pelo banco central dos EUA e este reverteria a sua política monetária novamente para expansionista.

 

A ‘Fed Put’ começou por ser apelidada de ‘Greenspan Put’ e apareceu pela primeira vez durante o mandato de Alan Greenspan, presidente da Fed de 1987 a 2006, para mitigar a crise financeira de 1987. Greenspan foi bastante proativo, tentando impedir quedas excessivas do mercado de ações, agindo como uma forma de seguro contra perdas, semelhante a uma opção de venda. Em boa verdade, a ‘Fed Put’ representa uma crença dos investidores num seguro contra a queda do mercado, um tipo de compromisso tácito de que a Fed travará sempre excessivas quedas dos mercados acionistas, cuja estabilidade dos mesmos também depende a estabilidade da economia.

 

No entanto, atualmente a política monetária da Fed depende sobretudo da evolução da inflação. Quanto mais persistente a alta dos preços, mais firme será a postura da Fed no seu combate. E um aumento das taxas de juro mais arrojado penalizaria ainda mais o mercado acionista. Haverá um momento a partir do qual a Fed optará pelo mercado acionista em detrimento da inflação? A queda das ações é também um processo deflacionista, ou seja, a sua desvalorização retira liquidez aos mercados, tal como um aumento de taxas de juro pelos bancos centrais ou um Quantitative Tightening, abrandando a inflação e facilitando o trabalho da Fed no combate à alta dos preços. Mas a queda das ações é mais eficaz a travar a inflação do lado da procura, como por exemplo na contenção do custo das rendas de casa (‘shelter’), via diminuição dos preços dos imóveis. Esta variável pesa um terço no índice de preços no consumidor norte-americano e tem contribuído para o aumento da inflação dos EUA. Todavia, a subida dos preços da energia e os constrangimentos nas cadeias de abastecimento, ditados pela pandemia e pela guerra na Ucrânia, não são facilmente travados pela queda das ações e até mesmo pela política restritiva da Fed, pois tratam-se de variáveis do lado da oferta. Os preços da energia continuam elevados e constituem uma ameaça à economia e favorecem o aparecimento de uma estagflação, estagnação económica associada a elevada inflação, tal como na década de 1970. Mas nessa altura a dependência energética norte-americana dos combustíveis fósseis era de 50%, hoje os EUA são autossuficientes em petróleo e gás natural.

 

Apesar das palavras marcadamente inflexíveis de Jerome Powell, frisando um firme combate à inflação em detrimento do mercado acionista, muitos investidores ainda acreditam que há uma ‘Fed Put’, mas reconhecem que o seu preço de exercício está cada vez mais baixo. A pesquisa de maio do Bank of America Global Fund Manager mostrou que as expetativas para a ‘Fed Put’ relativamente ao S&P 500 baixaram para 3529 pontos, um valor 26% abaixo dos máximos. E inferior aos 3647 de abril e aos 3698 de fevereiro.

Certo é que quanto mais cai o mercado acionista, mais atrativo este fica numa perspetiva de longo prazo. Mais importantes do que quaisquer ‘Fed Put’ são os lucros das empresas e o nível das taxas de juro. Quanto mais desvalorizam as ações, maiores são as rentabilidades das mesmas face aos lucros gerados, mas a subida dos rendimentos do tesouro, nomeadamente da ‘yield’ a 10 anos dos EUA, influencia o prémio de risco das ações (Equity Risk Premium, ERP). O ERP representa a diferença entre os retornos do mercado acionista e os rendimentos de ativos sem risco, tais como as obrigações do tesouro dos EUA, com horizontes temporais comparáveis. Hoje o rendimento de 2,75% das ‘treasuries’ a 10 anos retira atratividade a uma ação cuja rentabilidade é de 2,5%, não fazendo sentido investir nessa ação se há um retorno maior sem risco.

PMR In VE 25 maio 2022



sexta-feira, 20 de maio de 2022

Excedente comercial impulsiona rublo

O valor de uma moeda depende dos fundamentais macroeconómicos e da política monetária do banco central. Crescentes excedentes comerciais, termos de troca mais favoráveis, contas públicas equilibradas, liberdade económica, estabilidade de preços e crescimento económico robusto impulsionam o valor de uma moeda, mas no curto prazo a política monetária do banco central influencia a procura de moeda e dita a competitividade externa via preço.

 

Os termos de troca são importantes para perceber a evolução das contas externas e da taxa de câmbio nominal. Os termos de troca melhoram quando os preços das exportações de um país aumentam a um ritmo superior ao dos preços das suas importações, dados pelo rácio entre o valor das exportações e o das importações. Se esse rácio for superior a um, então está a entrar mais dinheiro no país do que a sair e a moeda tende a valorizar. Por exemplo, a significativa subida dos preços dos combustíveis fósseis nos últimos meses, cuja dependência portuguesa é atualmente de 70%, deteriorou os termos de troca de Portugal e agravou o índice de preços nacional penalizado pela inflação importada. Uma melhoria nos termos de troca indica que um país consegue com menos exportações comprar mais importações e, assim, aumentar a competitividade da sua economia, impulsionar o crescimento económico e melhorar o nível de vida das suas populações.

 

A crescente intensificação das sanções económicas do ocidente à Rússia, após a invasão da Ucrânia, tem redesenhado os níveis de exportações e de importações entre estas duas geografias e, por conseguinte, redefinido os termos de trocas. A Rússia é uma economia emergente alicerçada nas exportações de ‘commodities’ (recursos minerais, energéticos e agrícolas), sobretudo de petróleo e gás natural, mas também de ferro, aço, alumínio, fertilizantes, madeiras e cereais, e importadora de produtos manufaturados, tais como máquinas industriais, máquinas elétricas, produtos tecnológicos, carros e camiões e peças para os mesmos, produtos farmacêuticos e aviões. A dependência europeia dos combustíveis fósseis russos, a par do crescente interesse por bons acordos com fornecedores russos por parte de países de todo o mundo, tem suportado as exportações russas. Todavia, as sanções económicas ocidentais, além de terem diminuído consideravelmente as vendas do ocidente à Rússia (as exportações alemãs caíram 58,7% em março), dificultam a logística e o pagamento das importações russas, desincentivando a venda de bens a Moscovo de muitos países fora do perímetro das sanções. Assim sendo, as exportações russas não foram penalizadas como o ocidente pretendia, sustentadas também pela subida das cotações do petróleo e do gás natural, mas as importações diminuíram significativamente, conduzindo a economia russa a um excedente comercial histórico de 106,5 mil milhões de dólares nos primeiros quatro meses do ano (em abril o superávite foi de 40,2 mil milhões de dólares), alterando substancialmente os termos de troca a favor da Rússia, realidade que tem impulsionado o rublo, a moeda com melhor desempenho global em 2022. Mas há um custo para a economia russa que necessita constantemente de máquinas e bens tecnológicos para manter a sua atividade económica em funcionamento, além de criar potenciais tensões sociais devido às crescentes dificuldades ao acesso a bens globais pela população russa. A atual proeza histórica do excedente comercial russo tem facilitado a ação do Banco Central da Rússia (RCB) e permitiu a este descer a taxa de juro por duas vezes no mês de abril para 14%, depois da subida de 9,5% para 20%, no dia 28 de fevereiro, para travar a queda do rublo. Poucos dias depois da invasão, o sistema financeiro russo parecia à beira do colapso. Uma série de sanções financeiras, principalmente sobre as reservas cambiais do RCB, penalizaram o rublo e originaram uma corrida aos levantamentos de dinheiro pelos cidadãos russos. Então o RCB elevou os juros, impôs controles de capital e injetou liquidez no sistema bancário. Embora uma parte das reservas cambiais da Rússia permaneça congelada, o país ainda gera diariamente cerca de mil milhões de dólares com as exportações de energia.

Apesar da considerável subida da taxa de câmbio nominal do rublo, a taxa de câmbio real não melhorou assim tanto, pois na verdade a inflação na Rússia duplicou desde a invasão e fixou-se em 17,8% em abril. Também as perspetivas são de uma contração significativa do PIB em 2022.

PMR In VE 19


maio 2022



sexta-feira, 13 de maio de 2022

Inflação ajuda contas públicas, mas inflação importada…

As principais contas públicas de um governo são o balanço anual das suas contas e o somatório desse mesmo apuramento anual ao longo dos vários anos, ou seja, a execução orçamental e o total da dívida pública, respetivamente. Mas como os números absolutos de pouco servem, tal como uma média de pouco vale sem o respetivo desvio padrão, estes dois números são dados como rácios do défice público e da dívida pública relativamente ao PIB nominal, recorrendo, assim, à relatividade para uma cabal compreensão. 

Por exemplo, a dívida pública portuguesa no final de 2021 fixou-se em quase 270 mil milhões de euros, mas a da Suíça era superior (296 mil milhões de euros). Além disso, o país helvético tem uma população de 8,5 milhões de pessoas e que é inferior aos 10,3 milhões de portugueses. Logo, cada cidadão suíço deve 35 mil euros e um cidadão português 26 mil euros. Porém, o PIB nominal da Suíça foi de 715 mil milhões de euros em 2021, quase 3 vezes e meia superior ao PIB nominal português que se fixou nos 212 mil milhões de euros. Em suma, a dívida pública portuguesa foi de 127,4% em 2021 face ao PIB nominal, mas a da Suíça foi de apenas 41,4%.

Na proposta de orçamento do Estado para 2022 (POE22) do passado mês de outubro, o executivo esperava um défice orçamental de 3,2% e reduzir o rácio da dívida para 122,8%. Entretanto, a invasão da Ucrânia pela Rússia acelerou as subidas dos preços do petróleo e do gás natural, dos produtos agrícolas e dos metais industriais, agudizando o cenário macroeconómico, impulsionando a inflação e aumentando os receios de estagflação. Na atual nova proposta de orçamento do Estado para 2022 (NPOE22), neste mês de abril, o executivo espelhou esse mesmo receio de estagflação, reduzindo o crescimento económico em 6 décimas para 4,9% e aumentando as projeções da inflação de 0,9% para 4% em 2022. Todavia, espera uma melhoria considerável do rácio da dívida pública para 120,7% (122,8% na POE22). Apesar das perspetivas para o crescimento do PIB real terem diminuído para 4,9%, as do PIB nominal aumentaram de 6,9% para 7,5% devido ao esperado impulso da inflação. O deflator do PIB é o rácio entre o PIB nominal e o PIB real, e representa a inflação implícita entre aquilo que é produzido (PIB real) e o valor dessa mesma produção (PIB nominal).    

No cálculo do PIB na ótica da despesa, o consumo privado responde em Portugal por dois terços do PIB nacional, uma particularidade das economias avançadas, aproximando, assim, o deflator do PIB e o índice de preços no consumidor. O impacto da inflação no aumento do PIB nominal será tanto maior quanto maior for a capacidade de as empresas e a economia portuguesa repercutirem esses preços no consumidor. Mas… a inflação é sobretudo energética e importada. O preço do petróleo é uma variável exógena, cujo aumento subtrai riqueza ao PIB nacional. Sendo assim, o impacto no crescimento do PIB nominal pode ficar aquém do esperado, e, por conseguinte, os rácios da dívida pública e do défice orçamental ficarem acima do estimado.   

Portugal importa anualmente cerca de 80 milhões de barris de petróleo e à cotação de 110 dólares o barril, ao câmbio de um euro por cada 1,1 dólares, representa 8 mil milhões de euros, ou seja, quase 4% do PIB nacional. Os combustíveis fósseis ainda respondem por 70% da matriz energética portuguesa e o petróleo representa perto de 45% do mix energético. E se o peso do petróleo desceu ligeiramente, o peso do gás natural triplicou nos últimos 20 anos e representa, hoje, 25% do mix energético primário. (O carvão respondia por 12% em 2018, 5,6% em 2019 e 2,7% em 2020 no consumo de energia primária nacional, mas a sua utilização é cada vez mais residual). Em 2021 metade do gás natural consumido em Portugal veio da Nigéria, um terço dos EUA e 10% da Rússia via barco (GNL-Gás Natural Liquefeito). Apenas 7% veio por gasodutos de Espanha e da Argélia. A tendência é para intensificar as importações norte-americanas e diminuir as russas. Portugal importou em 2021 cerca de 56 milhões m3 de gás natural, ou seja, o equivalente a 59 TWh. Se o preço médio do MWh nos últimos 10 anos foi de 20 euros, o valor das importações de gás rondou os 1200 milhões de euros, pouco mais de 0,5% do PIB nacional. Mas desde setembro do ano passado, os preços têm subido consideravelmente e aceleraram com a invasão da Ucrânia, cotando atualmente acima dos 100 euros o MWh, ou seja, cerca de 2,5% do PIB.

Se a inflação importada não ajuda as contas públicas, também a subida dos juros da dívida pública em mercado secundário penaliza as novas emissões de dívida ao longo do ano e influencia negativamente o défice.

PMR In VE 29 abril 2022




Bitcoin e Nasdaq lideram quedas

Desde os máximos históricos alcançados em meados do passado mês de novembro, a bitcoin (BTC) já perdeu metade do seu valor e o Nasdaq um quarto. A significativa subida das taxas de juro, imposta pela aceleração da inflação, ditou a atual tendência de baixa no mercado acionista.

Se no início do ano, os investidores apostavam num melhor desempenho das ações europeias relativamente às norte-americanas em 2022, o início da guerra na Ucrânia, em fevereiro, inverteu essa perspetiva. Todavia, a intensificação da alta dos juros, mais penalizador dos setores mais sensíveis às variações das taxas de juro como o tecnológico, reverteu novamente essa tendência e as ações norte-americanas retomaram um desempenho marcadamente mais fraco, baseado nos seus índices acionistas mais de estilo ‘crescimento’ (‘growth’). Sendo assim, entende-se uma correção mais acentuada do índice tecnológico norte-americano Nasdaq.  

Quando os juros sobem, a cotação dos títulos tende a descer, e este princípio é tanto mais visível e penalizador quanto mais elevadas forem as expetativas para os lucros futuros de determinado ativo financeiro. O setor tecnológico lidera as empresas de crescimento, e estas apresentam perspetivas maiores para os seus resultados futuros e reinvestimento dos mesmos, por isso, também evidenciam cotações mais elevadas e rácios entre cotação e lucro mais altos. Por exemplo, se a taxa de juro hoje for de 1%, um lucro de 1000 euros daqui a um ano vale atualmente 990,1 euros, mas caso a taxa de juro suba para 5%, esses mesmos 1000 euros, a receber daqui a um ano, já só valem hoje cerca de 952 euros. Lucros projetados para daqui a 10 anos de 1000 euros, atualizados para o dia de hoje a um juro de 1% representam 905 euros e a um juro de 5% significam 614 euros. Em suma, a evolução da taxa de juro influência muito mais o valor de uma empresa cuja maior parte dos lucros sejam gerados e esperados num futuro mais longínquo. Por isso, o Nasdaq foi o índice acionista mais beneficiado pelos juros baixos da política monetária energicamente expansionista, encetada pela Reserva Federal dos EUA (Fed) para enfrentar a crise pandémica na primavera de 2020, e é atualmente o mais penalizado pela crescente alta dos juros. 

Também a BTC é um dos ativos financeiros mais sensível aos movimentos das taxas de juro. A principal criptomoeda global, tal como o ouro, não gera qualquer rendimento, apenas ganhos de capital, e, sendo assim, tende a apresentar melhores desempenho diante de posturas mais moderadas dos bancos centrais. Ou seja, quanto mais baixas forem as taxas de juro maior será a atratividade da BTC, bem como do metal amarelo, em relação às moedas fiduciárias. Mas ao contrário do ouro, a BTC tende a comportar-se melhor em momentos de estabilidade, em ambientes favoráveis e num contexto de baixas taxas de juro. Para descontentamento dos entusiastas desta criptomoeda, a BTC, e ao contrário do ouro, não se apresenta como um ativo de refúgio perante a incerteza, a instabilidade e a volatilidade. A principal criptomoeda global é um ativo de risco e tende a desvalorizar em momentos de ‘risk-off’ do mercado e na presença de crescentes receios de recessão.

De relembrar que a BTC desvalorizou cerca de 70% em 2018, aquando do primeiro Quantitative Tightening da Fed. Mas o encerramento do ciclo de subida dos juros pela Fed, na reunião de 20 de março de 2019, marcou um novo período de alta da BTC impulsionado pela perceção de um abrandamento económico e, consequente, aumento das perspetivas de um regresso à redução dos juros, culminando com a descida dos mesmos a 31 de julho de 2019, a primeira baixa de juros desde 16 de dezembro de 2008.

Também a crescente adoção institucional de criptomoedas aumenta a correlação destas com o mercado de ações. A guerra na Ucrânia, a crescente inflação e a política monetária restritiva da Fed penalizam as carteiras e a BTC, percecionada como um ativo de risco, é também vítima do ‘selloff’. Normalmente são os investidores mais propensos ao risco que investem em criptomoedas, ou seja, as pessoas que aplicam dinheiro em BTC são geralmente as mesmas que investem em ações, nomeadamente tecnológicas. É muito pouco provável que as pessoas que compram obrigações sejam as mesmas que adquirem BTC. E, assim sendo, para compensar as perdas nas ações ou chamadas à margem, os investidores são obrigados a alienar parte dos seus ativos em criptomoedas e vice-versa, agravando ainda mais as quedas do mercado. Neste particular, é importante conhecer o nível de alavancagem destes ativos, porque quanto maior for a alavancagem, maior será a volatilidade e desvalorização do mercado, e maior será a probabilidade de contágio à ‘economia real’. Há seis meses a capitalização de mercado das criptomoedas, em máximos históricos, era de 2,9 biliões de dólares e hoje é de 1,2 biliões. Um montante equivalente ao PIB do Canadá desapareceu.

Escasseiam os catalisadores para uma recuperação do mercado acionista, mas uma provável desaceleração da inflação nos próximos meses reduziria as expetativas de aumento dos juros e melhoraria as perspetivas dos mercados. Todavia, uma descida da inflação também poderia ser percecionada como uma crescente ameaça de recessão e validar o ‘sell in may and go away’. No auge das ‘dotcoms’, o Nasdaq valorizou mais de 300% nos 18 meses anteriores aos máximos de 2000 e perdeu esse mesmo valor nos três anos seguintes. A presente queda do Nasdaq será um ‘déjà vu’? Não parece. A atual robustez das empresas tecnológicas é maior, mas há sempre que distinguir o ‘trigo do joio’. 

PMR In VE 13 maio 2022






sexta-feira, 6 de maio de 2022

Mundo mais verde tem custos, mas compensa

Na prossecução da transição energética, tem-se intensificado o debate sobre os recursos minerais, principalmente os metais industriais, necessários às tecnologias de geração de energia limpa, nomeadamente as ditas energias renováveis, e sobretudo se o fornecimento desses mesmos minerais pode representar uma ameaça à transição para a energia limpa. 

A crescente utilização de energias renováveis requer um aumento substancial na produção de painéis solares, turbinas eólicas, baterias, veículos elétricos, equipamentos de eletrólise da água para produção de hidrogénio, entre outros. E de acordo com a Agência Internacional de Energia (AIE), essas tecnologias são muito mais intensivas em minerais do que as tecnologias equivalentes de combustíveis fósseis. Por exemplo, um carro elétrico necessita, em média, seis vezes mais recursos minerais do que um carro convencional. E uma central eólica terrestre consome nove vezes mais recursos minerais do que uma central a gás natural com a mesma capacidade.

Na mineração dos metais industriais ocorre emissão significativa de gases de efeito estufa, sobretudo dióxido de carbono (CO2), e neste processo há utilização intensiva de energia. Impactos ambientais são visíveis, desde a poluição do ar e da água, contaminação dos solos devido aos resíduos, perturbação social, e perda de biodiversidade. Todavia, essa contribuição negativa para as emissões não nega as vantagens climáticas das tecnologias de energia limpa quando consideradas em conjunto com as emissões do ciclo de vida completo de outras tecnologias. As emissões totais de gases de efeito de estufa no ciclo de vida dos veículos elétricos são, em média, cerca de metade das emissões dos carros com motor a combustão interna, e com potencial para uma redução adicional de 25% quando utilizada eletricidade de baixo carbono proveniente das renováveis.  

As tecnologias subjacentes às energias renováveis – de turbinas eólicas e painéis solares aos veículos elétricos e ao armazenamento de energia em baterias – exigem um vasto conjunto de minerais e metais industriais, desde o cobre, o cobalto, o níquel, o lítio até ao grafite, crómio, zinco e alumínio. Assim sendo, e no intuito de poupar o planeta, a maximização do ‘reciclar’ da política dos 3 Rs deve-se sobrepor, sempre que possível, aos acréscimos de mineração.

Talvez a maior poluição na extração de minerais seja a dos cursos de água. Por exemplo, o níquel, o lítio e o cobre poluem mais a água do que o cobalto. E o lítio é o que utiliza mais intensamente água. Os tipos de recursos minerais utilizados variam de acordo com a tecnologia. Lítio, níquel, cobalto, manganês e grafite são cruciais para o desempenho e longevidade das baterias. As redes elétricas precisam de uma enorme quantidade de cobre e alumínio, sendo o cobre transversal a todas as tecnologias relacionadas com eletricidade, fazendo jus à designação de principal metal industrial a nível mundial. Na produção de veículos elétricos, o cobre e o grafite representam cerca de 60% dos recursos minerais utilizados, o níquel à volta de 20% e o lítio responde por 4%, de acordo com a AIE. Nas turbinas eólicas, o cobre responde por mais de metade e o zinco um terço. No solar é quase 60% de silício e mais de 40% de cobre. Na energia nuclear, o cobre e o crómio são os metais industriais mais utilizados. 

Nos próximos anos, o Lítio, o cobalto e o níquel deverão ter um acréscimo de procura superior ao cobre, este último há muito que é largamente utilizado na economia. As maiores necessidades de sempre de lítio e de cobalto nascem com a atual transição energética. Sendo assim, o preço do lítio quadruplicou nos últimos anos e a cotação do níquel triplicou nos últimos dois anos. Enquanto isso, o preço do cobre, apesar de cotar em máximos históricos, está ligeiramente acima dos anteriores máximos de 2011 e duplicou de preço nos últimos dois anos.

Em suma, atualmente os combustíveis fósseis representam 84% da matriz energética mundial, por isso um processo de descarbonização nas próximas décadas só poderá ser exequível com um elevado investimento nos metais industriais e recursos minerais indispensáveis à produção de turbinas eólicas, painéis solares, pequenos reatores nucleares modulares (SMR) e carros elétricos.

 


PMR In VE 6 maio 2022





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Naturalidade Angolana
Licenciado em Economia pela Faculdade de Economia da Universidade do Porto.