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sexta-feira, 26 de junho de 2020

A NECESSIDADE AGUÇA O ENGENHO

Poderá ter sido o "bear market" mais rápido de sempre, cerca de duas semanas no mês de março, e o início do "bull market" mais odiado de sempre, com muitos investidores a ficarem de fora do "rally". Mas o fator TINA ("There Is No Alternative") alimenta a FOMO ("Fear Of Missing Out").

As taxas de juro próximas de zero, devido às reforçadas políticas monetárias expansionistas dos principais bancos centrais do mundo, deixam poucas alternativas aos investidores que procuram rentabilidade. O mercado perdeu cerca de 40%, mas muitas bolsas já recuperaram parte dessas perdas e algumas já estão em máximos históricos novamente.

Não será fácil voltarmos a ver mínimos no mercado por causa da Covid-19. Perante uma segunda vaga, haverá muita resistência a um novo confinamento global, e, eventualmente, poderemos ter confinamentos localizados à medida que os novos casos aumentem significativamente. População e autoridades estão atentas, conscientes e zelam pela saúde com meios de higiene e uso de máscara.

No inverno de 1918/19, na fase mais mortífera da gripe espanhola, o Dow Jones perdeu cerca de 11 % em três meses, desde o seu ponto mais alto em outubro de 1918 ao ponto mais baixo em fevereiro de 1919, e S&P500 à volta de 15%. Na gripe asiática de 1957/58, o S&P 500 perdeu quase 21%, em três meses, do máximo de julho ao mínimo de outubro 1957, sendo novembro desse ano e março de 1958 os picos do número de mortes. Nestas duas pandemias não houve confinamento global.

A necessidade de novas formas de trabalho para contornar, e debelar, a pandemia de Covid-19 abriram um mundo novo de oportunidades, competências, aptidões e capacidades.

Parte destas mudanças e alterações vieram para ficar, e a pandemia veio acelerar a quarta revolução industrial.

Poderemos estar no arranque de um novo ciclo económico, mais digital, automatizado e robotizado, com o teletrabalho como principal pilar desta nova economia digital.

Nas últimas semanas, o aumento de novos casos de Covid-19 foi, em parte, negligenciado pelo mercado.

Mas perante a contração do balanço da Reserva Federal norte-americana, na semana passada, pela primeira vez desde janeiro, os receios dos investidores podem regressar, diante de uma segunda vaga, e colocar em causa o atual formato de recuperação em "V" descontado pelo mercado.

A evolução do valor dos ativos financeiros deverá continuar a ser influenciada pela atuação dos bancos centrais. Quando o otimismo é demasiado, os bancos centrais tendem a refrear os estímulos monetários, e reforçá-los perante um agravamento do pessimismo. Os bancos centrais que, grosso modo, já controlam a "yield curve", também influenciam as cotações das ações.

Os investidores e os bancos centrais estarão atentos aos indicadores económicos para aferirem se a recuperação económica é mais ou menos forte, e se as cotações correspondem ao real valor das empresas e se são necessários ajustes nas políticas monetárias e orçamentais.

A não ser que existam outros fatores atualmente desconhecidos, o próximo mercado em alta estará em construção, apesar de muitos acharem que não faz sentido. A negatividade e o medo reinam sempre no início de um ciclo de alta devido ao cansaço mental. Foi assim em outubro de 2002, e no início de 2009, quando poucos acreditavam nos pacotes de estímulos das autoridades europeias, norte-americanas, e pelo incentivo chinês de 500 biliões de dólares. O atual ciclo de baixa começou com mais força do que nunca, antecipando quase imediatamente a recessão que seria desencadeada como resultado das medidas de confinamento e distanciamento social. Quando as expectativas são baixas, praticamente qualquer cenário estimula as ações.

A maioria geralmente despreza a recuperação, considerando-a uma armadilha para os incautos. Presta-se mais atenção às más notícias, negam-se os possíveis fatores positivos, e surge o pessimismo da desconfiança...

Paulo Monteiro Rosa, In Vida Económica, 26 de junho de 2020

 

terça-feira, 23 de junho de 2020

Mais estímulos monetários relativizam eventuais segundas vagas localizadas

Novos estímulos monetários e orçamentais chegam à economia e reforçam a confiança na recuperação em "V" mais ou menos cavada. 

PAULO ROSA Economista Sénior, Banco Carregosa

12 de junho 2020, Jornal Económico

A administração norte-americana pretende investir 1 bilião (trillion, em inglês) de dólares em infraestruturas, desde estradas e pontes degradadas ao cabal acesso à internet nas zonas rurais, e intensificar a implementação do 5G. A Reserva Federal (Fed) reforçou a compra de obrigações de empresas, agora alargada a títulos individuais e num montante de pelo menos 250 mil milhões de dólares. Este movimento ocorre quase três meses após a inauguração do mecanismo de crédito empresarial no mercado secundário (SMCCF, Secondary Market Corporate Credit Facility, lançado a 23 de março) e um mês após o início da compra de ETFs de crédito empresarial. O presidente da Fed, Jerome Powell, disse perante o Senado que a economia pode estar perto do seu ponto mais baixo, mas as taxas de juro manter-se-ão próximas de zero enquanto a economia não recuperar plenamente.

O Japão estendeu o seu QE em cerca de 300 mil milhões de dólares, do anterior valor à volta de 700 milhões para cerca de 1 bilião de dólares.

As bolsas foram suportadas por mais estímulos. Uma economia americana em recuperação e mais estímulos monetários anularam a preocupação à volta do aumento significativo de novos casos do coronavírus, em várias geografias, tais como Texas e China. Mas, os receios de uma segunda vaga, alguma apreensão em torno do aumento das tensões com a China, o imposto sobre as empresas tecnológicas que agrava tensões entre os EUA e a Europa, perdem visibilidade perante os estímulos do governo de Trump, a compra de ativos empresariais pela Fed, o aumento dos estímulos do Banco do Japão e os 100 mil milhões de libras de estímulo adicional por parte do Banco de Inglaterra (BoE) no programa do QE do Reino Unido. A baixa inflação, de apenas 0,5%, valor mais baixo dos últimos quatro anos, possivelmente pesou na decisão do BoE de implementar mais estímulos monetários. O Banco Nacional da Suíça mantém taxa de juro inalterada nos -0.75%.

As vendas a retalho nos EUA subiram 17,7%, níveis históricos, e bastante acima do estimado de 8%, dando também suporte aos mercados perante o agravar dos surtos. Os pedidos de subsídio de desemprego foram de 1,5 milhões, acima do esperado de 1,3 milhões, mas continua abrandar o ritmo. Foi a 13a semana consecutiva em que os registos ultrapassaram um milhão. Até à crise do novo coronavírus, o número mais elevado, numa única semana, era de 695 mil, em 1982.

O índice manufatureiro Philadelphia Fed mostra sinais de melhoria em junho. Subiu para 27.5 em junho, face aos -43,1, a primeira leitura positiva desde fevereiro. O barómetro de novas encomendas aumentou para 16.7 em junho, de uma leitura negativa de 25,7. O índice de envio de encomendas subiu para 25,3, face aos 30,3 negativos em maio.

Florida, Arizona, Texas apresentam níveis recorde de novos casos de Covid-19. O sul dos EUA, Brasil e Rússia são das geografias mais atingidas.

AÇÕES EUROPA

A Wirecard AG, empresa alemã de pagamentos, adiou a publicação dos resultados financeiros anuais pela quarta vez depois dos auditores não terem conseguido encontrar evidências de cerca de 1,9 bilião de euros de saldos em dinheiro. Norwegian Cruise Une estendeu a suspensão de travessias de algumas das maiores rotas até setembro. A receita dos três primeiros meses do anototalizou 7,7 milhões de dólares, uma queda de 19,8% dos 9,6 milhões no mesmo período do ano passado. A receita cresceu 64,0%, impulsionada por software de jogos de internet a dinheiro.

AÇÕES EUA

O lucro por ação da Oracle, de 0,05 dólares, foi acima do esperado, mas a receita caiu mais do que a empresa havia previsto. McDonaWs recupera, suportada pelas vendas melhores do que o esperado. As vendas comparáveis caíram apenas 29.8% entre o final de março e maio, uma queda de 12% nos EUA, e de 53.4% nos mercados internacionais. Espera investir cerca de 200 milhões de dólares em marketing. A PetroTal Corp obteve lucro em 2019 e a produção diária média foi quatro vezes maior que no ano anterior. O lucro antes dos impostos foi de 10,2 milhões de dólares, face a uma perda de 4,6 milhões em 2018.

METAIS RÁCIO OURO/COBRE

Desde finais de abril que o rácio ouro/cobre tem descido, após o máximo de 26 de março, ainda no rescaldo do significativo selloff nos mercados devido pandemia da Covid-19.0 cobre é sensível ao crescimento e o ouro à procura de refúgio perante o agravamento do risco e as alterações nos rendimentos reais. A 23 de março o cobre registou um mínimo de outubro de 2016 nos 2,10 dólarespor libra, e desde essa altura segue uma tendência de alta e cota atualmente nos 2,63 dólares. O ouro, hoje em dia, é também um adequado refúgio para as moedas fiduciárias que têm a sua taxa de juro subjacente à volta de zero. 


Os estímulos monetários e as bolsas


Na semana passada, o balanço da Reserva Federal norte-americana não se expandiu, algo que não acontecia desde meados de janeiro. Em simultâneo, assistimos a um "sell-off" nos mercados e as ações tocaram em mínimos das últimas três semanas. Desde o início do confinamento, o balanço do Banco Central dos EUA cresceu cerca de 75%, quase 3 mil milhões de dólares ou 15% do PIB norte-americano. Esta expansão equivale a um ritmo médio superior a 100 mil milhões de dólares semanais e, neste período, ainda não se havia expandido menos de 60 mil milhões de dólares em termos semanais (saliente-se que os dados são divulgados a cada quinta-feira, referentes à semana de quarta-feira a quarta-feira).

Há 10 dias, a 5 de junho, as ações subiram em resultado de uma lei de estímulo orçamental de um bilião de dólares que estaria a ser ponderada pela Administração de Donald Trump.

Neste início de semana, as bolsas abriram em baixa pressionadas pelos receios de uma segunda vaga, com o agudizar de novos casos do surto virai no sul dos EUA, em Pequim e no Brasil, mas encerraram a sessão a aliviar e, recuperar dos mínimos.

Na terça-feira, abriram em forte alta, impulsionadas pelos estímulos em infraestruturas de um bilião de dólares apresentados pelo governo de Trump. Um pacote para reconstruir estradas e pontes degradadas, investir em indústrias futuras e tecnologia 5G.

Em simultâneo, este pacote, "grosso modo", parece ter afastado os receios, pelos menos temporariamente, de uma segunda vaga global da Covid-19.

A Reserva Federal dos EUA referiu também que em breve começará a comprar dívida empresarial individual, estendendo um programa que antes estava limitado à compra de fundos negociados em bolsa de valores.

Na terça-feira, o Banco Central do Japão seguiu a FED e ampliou o seu pacote de empréstimos empresariais à volta de 700 mil milhões de dólares para cerca de um bilião de dólares. Esperam-se ainda mais desenvolvimentos por parte de Jerome Powell, presidente da Reserva Federal norte-americana, e do Banco da Inglaterra, particularmente depois dos dececionantes dados do desemprego que espelham dificuldades económicas acrescidas no Reino Unido.

Além disso, o italiano Fábio Panetta, membro do conselho do Banco Central Europeu, instou a União Europeia a decidir urgentemente sobre um pacote de medidas orçamentais para amenizar a crise económica provocada pela pandemia de Covid-19. Após as notícias dos estímulos, o petróleo voltou aos ganhos, o VTX desceu para quase 30 pontos, depois de ter tocado nos 41 pontos, e o Dollar índex permaneceu abaixo dos 97 pontos, refletindo alguma tranquilidade do mercado, menos incerteza e volatilidade. Os investidores voltaram a assumir uma postura de "risk-on". Os mercados de dívida pública norte-americano e germânico, refúgios a semana passada perante o "sell-off" acionista, voltaram às quedas e os juros subiram.

O tamanho e o ritmo da expansão do balanço da Reserva Federal, dos restantes principais bancos centrais do mundo (BCE, BoJ, BoE e BNS) e os estímulos governamentais "monetizados" irão ditar o desempenho dos mercados de ações globais?

Paulo Rosa, 12 junho 2020, Vida Económica








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Licenciado em Economia pela Faculdade de Economia da Universidade do Porto.