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terça-feira, 18 de julho de 2017

Como a fusão da Amazon com a Whole Foods lembra a bolha das dotcom



A 16 de junho, a Amazon anunciou a compra da cadeia de supermercados de produtos de agricultura biológica, Whole Foods, por 13,4 mil milhões de dólares. Esta aquisição permite à empresa pioneira nas compras online ter lojas físicas em centenas de cidades dos EUA, numa estratégia que pode ser extensível à Europa, Japão e resto do mundo.
A oferta pública de aquisição (OPA) espelha a grandeza do negócio dos supermercados - cerca de 800 mil milhões de dólares em gastos anuais nos EUA - e a pretensão da Amazon de se tornar, através do hábito das compras online, no maior distribuidor e retalhista de alimentos e bebidas.
Durante quase uma década a Amazon não conseguiu, por conta própria, penetrar neste mercado. A compra da Whole Foods representa uma vantagem na longa batalha com a maior retalhista de supermercados do mundo, a Walmart, que se tem esforçado no crescimento das compras através da internet.
A Walmart anunciou há semanas um acordo de 310 milhões de dólares para adquirir a Bonobos, empresa de venda online de vestuário, e no ano passado pagou 3,3 mil milhões dólares pela Jet.com e colocou o CEO da Jet, Marc Lore, como responsável pelo negócio global de comércio eletrónico da Walmart.
O mercado percecionou essa mudança de paradigma com o anúncio da aquisição da Whole Foods pela Amazon há quase um mês, através da queda das ações de todas as empresas retalhistas detentoras de supermercados, entre 5% e 15%, quer nos EUA, quer na Europa. Houve perdas avultadas nas ações da holandesa Ahold e na portuguesa Jerónimo Martins.  
 
Atualmente o online está a esmagar as lojas físicas. A Amazon, que ganhou o estatuto de potência no mundo empresarial, está a preparar-se para passar a incluir no seu portfolio de atividades as compras em supermercados e farmácias com a aquisição da Whole Foods, a cadeia de alimentos saudáveis.
Já passaram quase duas décadas desde a bolha das “dotcom”, do final dos anos 1990. No setor dos media, o surgimento de novos meios de comunicação em massa (baseados na Internet) veio desvalorizar a comunicação social “antiga” como revistas, jornais e TV, que publicava notícias de “ontem”. Isso refletiu-se nas avaliações relativas das ações, o que deu à AOL, empresa de Internet, a capacidade de comprar a gigante de comunicações a Time Warner por uma quantia muito significativa.
Mas a fusão da AOL/Time Warner foi um dos maiores fracassos de todos os tempos. Pode acontecer novamente, e ironicamente pelas mesmas razões, com a Amazon e a Whole Foods.
A AOL era líder na internet e tinha uma posição dominante. A avaliação do mercado tornou a jovem empresa AOL mais valiosa em termos de capitalização bolsista do que muitas “blue chips”. A Time Warner tentou, e falhou, estabelecer uma presença online.
Segundo a fusão, a Time Warner ganharia dezenas de milhões de novos assinantes. AOL beneficiaria do acesso à rede de cabo da Time Warner e aos conteúdos.
Porém, a irreverência e criatividade da AOL esbarraram com o lado mais corporativo da Time Warner. As sinergias prometidas não se materializaram. O colapso da bolha das “dotcoms” e a recessão económica penalizaram a publicidade. A AOL perdeu assinantes. O seu valor em bolsa caiu de 226 mil milhões para 20 mil milhões de dólares em pouco tempo.
As baixas taxas de juro e a falta de alternativas levaram as “dotcoms” em 2000 e as “Big Tech”, atualmente, a percecionarem o risco de forma diferente da recomendada pelos livros. Pagar 13 mil milhões de dólares para apostar numa ideia nova e não testada pode ser arrojado demais, como se verá quando chegar a correção do mercado… 
Ações em máximos históricos combinadas com baixa volatilidade, rendimentos negativos das obrigações do tesouro, aumento do rácio dívida/PIB e baixa inflação não são bons augúrios para o futuro da fusão entre a Amazon e a Whole Foods.

Paulo Monteiro Rosa, In "Vida Económica", 4 de julho 2017


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Licenciado em Economia pela Faculdade de Economia da Universidade do Porto.