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sexta-feira, 9 de abril de 2021

Renminbi digital, vigilância acrescida

O Banco Popular da China (PBoC) iniciou a emissão de moeda digital suportada pela tecnologia blockchain, ainda que de forma restrita e meticulosamente controlada. Nos últimos meses, o Governo chinês distribuiu os montantes avultados de Yuan digital através de lotarias em algumas cidades, como Shenzhen e Chengdu. O “Wall Street Journal” referiu que 750 mil destinatários foram determinados pelo aludido sistema de lotaria e, agora, podem gastar o Yuan digital em lojas físicas ou via 'online através da utilização de uma aplicação própria criada pelo Governo chinês.


Os pagamentos suportados por aplicações são os ser comuns em empresas físicas chinesas e os comerciantes adaptam-se rapidamente à nova realidade e à oferta de moeda digital suportada pelo PBoC, sob a orientação do Governo. A Starbucks e o McDonalds estão entre as empresas que já aceitam o Yuan digital, assim como o Partido Comunista Chinês.

Pagamentos digitais com a omnipresença e rígida vigilância governamental permite às autoridades chinesas ter acesso privilegiado a uma infinidade de dados. O conhecimento sobre como as pessoas gastam o dinheiro crescerá consideravelmente com a implementação do Yuan digital, embora o PBoC tenha dito que vai limitar o seguimento e percursos da moeda digital e criar o que chama de “anonimato controlável”. Com o lançamento da moeda digital, cada Yuan em circulação existirá como moeda física ou digital. Alguns analistas educação que o Governo chinês aumente a quantidade de moeda digital no futuro e reduza, assim, a quantidade de moeda física disponível no mercado.

Todavia, este procedimento gerará incerteza e alguma entropia no mercado para determinar qual será a melhor moeda para pagar e a melhor para entrar, numa alusão à lei de Gresham. O Yuan digital está suportado pelo balanço do PBoC, enquanto a moeda fiduciária ou física é garantida, em grande parte, pelos balanços dos bancos comerciais e por garantias de depósitos. Mas, em última instância, o Governo, que força o seu curso legal, tem a obrigação de manter a sua estabilidade. Há um conflito latente entre um CBDC (Moeda Digital do Banco Central) do PBoC e a moeda fiduciária chinesa, 'trade-off’ que poderá ser ultrapassado pela adoção chinesa do Renminbi digital como moeda única, abandonando uma moeda fiduciária e a possibilidade de controlar crises financeiras e manipulares o mercado cambial, conceber um padrão de moeda. Mas, no futuro, seria o potencial Yuan digital uma moeda escassa e representativa de uma norma padrão? E provável que não haja limitação à quantidade de moeda, ao contrário do Bitcoin, e o PBoC pode criar a moeda digital quando necessário, para financiar o Governo ou mitigar crises. Neste caso, e após uma volta de 360 ​​graus, estaríamos na presença novamente de uma moeda fiduciária e inflacionada ...

A China é apenas o segundo país e a primeira grande economia a lançar oficialmente uma versão blockchain da sua própria moeda. O 'dolar areia' digital do Banco Central das Bahamas foi lançado no dia 20 de outubro do ano passado e é aceite nas lojas da capital Nassau. A Bloomberg identifica mais quatro países - África do Sul, Índia, Paquistão e Tailândia - com planos concretos para lançar como suas próprias criptomoedas oficiais em breve. Como CBDC têm a capacidade de facilitar os pagamento das pessoas que não têm conta bancária, mas possuem um smartphone e acesso à internet, o que torna interessantes para o mundo em desenvolvimento. De acordo com a “Bitcoin.com”, cerca de 33% dos nigerianos utilizam ou possuem criptomoedas, uma solução mais barata para o envio de dinheiro de e para o estrangeiro. De acordo com um bitcoin. com, o Banco Central das Filipinas aprovou várias trocas de criptografia para operar como “empresas de remessas e transferências” no país. O Governo filipino promove a negociação de títulos do Governo no retalho usando um aplicativo da blockchain e o Unionbank para distribuição dos títulos do Governo. O Unionbank também instalou uma ATM Bitcoin em Makati (Metro de Manila).

Paulo Monteiro Rosa, 9 de abril de 2021, Vida Económica



quinta-feira, 1 de abril de 2021

A Bitcoin poderá vir a ser moeda?

Em termos económicos, moeda é tudo aquilo que é aceite nas transações de bens e serviços e pagamento de dívidas, ou seja, de acordo com esta definição, qualquer coisa pode ser moeda, desde que aceite como forma de pagamento e seja capaz de servir cabalmente de meio de troca. Além disso, a moeda desempenha a função de unidade de conta, isto é, fornece um referencial para os preços dos bens e serviços. Por último, a moeda deve manter o seu poder de compra ao longo do tempo, ou seja, cumprir a função de reserva de valor.

A Bitcoin (BTC) é garantida pela fidúcia nos seus algoritmos e gradualmente pode ser trocada por bens e serviços. Cumpre muitos requisitos de reserva de valor, mas no que concerne à estabilidade as dúvidas persistem. A volatilidade da BTC poderá ser invocada por muitos como um motivo pela qual ela não é, atualmente, uma cabal reserva de valor. Também a reserva de valor da BTC depende da sua utilidade como meio de troca. Para que algo seja usado como reserva de valor precisa de ter algum valor intrínseco e se a BTC não tiver sucesso como meio de troca, não terá utilidade prática e, portanto, não terá qualquer valor intrínseco e não será atrativa como reserva de valor. Outro problema é o seu 'status' como unidade de conta, nem a maioria das empresas, nem nenhum país, a aceitou como pagamento.
 
As moedas hegemónicas ao longo da História têm seis atributos principais: a escassez, a divisibilidade, a utilidade, o transporte, a durabilidade e a falsificação. A BTC é escassa, é divisível em 100 milhões de Satoshis, mas tem que provar a sua utilidade e apesar do fácil transporte há dificuldades no armazenamento de criptomoedas e poucos espaços de troca e, nos últimos anos, as trocas foram afetadas por 'hacks', roubos e fraudes. Tem durabilidade, mas a falsificação estará no futuro sujeita à capacidade dos computadores quânticos quebrarem a criptografia. Atualmente, há quem veja vulnerabilidade na atuação dos desenvolvedores, na centralização da mineração em 4 ou 5 'pools' e no crescente poder de validação das transações. 

Atualmente, a BTC cumpre os três principais requisitos de moeda? Talvez cumpra mais do que algumas moedas dos países emergentes. Cumpre mais do que o bolívar venezuelano, mas fica muito aquém das principais moedas mundiais: dólar, euro, iene, renmimbi, libra e franco suíço. Todavia, os principais bancos centrais mundiais manifestam receios e estudam o lançamento de CBDC.

A BTC é uma moeda digital sem valor intrínseco tangível. Um Picasso, um Van Gogh ou vinhos raros têm valor, mais subjetivo do que objetivo. As moedas fiduciárias são já digitais entre as populações jovens das principais cidades mundiais onde quase tudo se paga com 'smartphone', 'homebanking' e NFC.  

Na autenticação de uma transação de BTC, cada utilizador tem a sua própria chave privada ('password') e uma chave pública que todos podem ver ('username'). Uma vez acordada uma transação entre utilizadores, antes de ser adicionada ao último bloco da cadeia, ela precisa de ser validada pelo consenso da maioria dos 'nós' (computadores na rede), sobretudo 'nós completos' que têm acesso a toda a rede e que concordam se a transação é válida. Os 'nós de mineração' possuem 'potentes computadores' (ASIC) que resolvem um complexo algoritmo e calculam o 'hash' correto (um código e elo de ligação entre blocos), necessário para adicionar um novo bloco ao último da rede, validado pelos próprios mineradores e pelos restantes 'nós' da rede. Pelo seu trabalho, a 'prova de esforço', os 'mineradores' são recompensados
com BTC e comissões. Uma transação pode ser validada e adicionada ao último bloco minerado (em média a cada 10 minutos) se pagar uma comissão elevada aos 'mineradores' ou demorar dias. O poder de mineração concentrou-se nas mãos de alguns e há quem defenda uma validação pela 'prova de participação'. Os participantes, por possuírem parte da criptomoeda, têm interesse em verificar e validar transações, têm computadores básicos, menos gastos de energia, menor pegada ambiental, mas dão menor segurança à rede…


Paulo Monteiro Rosa, In Vida Económica, 1 de abril de 2021




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Licenciado em Economia pela Faculdade de Economia da Universidade do Porto.