Portugal e a maior parte dos países ocidentais descuraram o sector industrial, onde reside a riqueza e o valor acrescentado para as exportações e a sustentabilidade de um Estado Social.
A nossa indústria é o turismo. Temos excedente comercial no sector vinícola, no montante de 550 milhões de euros, e em mais alguns sectores de actividade. O défice comercial ronda os 16 mil milhões de euros, 10% do PIB. Importamos petróleo, bens duradouros, carros da Alemanha...
Os salários alemães são praticamente os mesmos de há 10 anos atrás. Os salários alemães são superiores aos portugueses, mas estão de acordo com PIB per capita germânico...
A vantagem da Alemanha está na indústria ligeira. O sector industrial corresponde a 50% da actividade económica, um valor semelhante aos serviços. A agricultura tem um valor residual como é característica dos países desenvolvidos. A Alemanha, alguns países nórdicos e Irlanda não descuraram a importância fulcral da indústria numa economia. E como o sector industrial está na base do Estado Social, Welfare State, que tem a sua fase de experimentação com Otto Bismark, na Alemanha, no séc. XIX, no auge da revolução industrial. Os benefícios que traria para uma sociedade mais equitativa e com uma reduzida e mesmo ausência de atritos sociais. Uma repartição pelos trabalhadores dos ganhos gerados pelo forte crescimento económico, baseado na indústria e nas suas exportações.
O "Welfare state" foi aprofundado pelo pensamento Keynesiano e surge como resposta ao evoluir da economia na Europa. Apesar de ser um sistema em crise nos dias de hoje, esteve bastante presente durante toda a segunda metade do século XX.
Entre os seus objectivos há dois essenciais: a garantia do bom funcionamento do mercado, segundo o pensamento de Adam Smith e a defesa dos direitos dos cidadãos na saúde, educação e igualdade de oportunidades.
Os salários deveriam ser mais elevados se tivermos em conta a teoria dos salários de eficiência, que motivam mais o trabalhador? Provavelmente. Mas para isso é preciso ter dinheiro. Um banco Central próprio que não existe neste momento. Imprimir moeda e esperar que o trabalho gere mais riqueza, para não ser absorvido pela inflação. Na teoria quantitativa da moeda, a massa monetária é igual ao produto dos preços pelo volume produzido, tendo em conta a velocidade de circulação da moeda constante no longo prazo. A equação: MV=PT (massa monetária X velocidade circulação = Preços X Volume produzido).
Neste momento não podemos emitir moeda. Entregámos essa função ao Banco Central Europeu (BCE), em troca da participação numa moeda e numa zona monetária, apesar desta mostrar debilidades, porque carece de uma política orçamental centralizada.
A questão não está na austeridade, no honrar das nossas dívidas, que obviamente queremos cumprir. Mas do querer cumprir ao conseguir cumprir vai uma distância abismal. O problema está precisamente no crescimento. Sem crescimento não há pagamento da dívida. O problema é que o nosso crescimento assenta em premissas erradas, baseado no consumo interno, e parte deste consumo é realizado a crédito proveniente do estrangeiro. Temos que crescer com base no investimento, na redução das importações e aumento das exportações. Refrear o consumo interno e as importações só se consegue com políticas económicas, nomeadamente orçamentais, que penalizem o consumo interno e as importações e incentivem o investimento e as exportações.
Provavelmente e infelizmente teremos que contrair para ganhar balanço para um novo paradigma de crescimento. Provavelmente a nossa economia padece de uma bolha, porque está alavancada com capitais externos. Não existem só bolhas no imobiliário, acções, obrigações... E sem crescimento é possível que uma reestruturação da nossa dívida seja uma realidade num futuro próximo.
Muito se tem falado de Keynesianismo no último ano e a adopção de políticas keynesianas para resolução da actual crise financeira. Depois da grande depressão de 1929, Keynes elaborou a Teoria Geral do emprego, taxas de juro e moeda em 1936. Chegou à conclusão que havia um desfasamento entre a produção e a procura. Como as pessoas não tinham dinheiro para comprar a tudo que era produzido, então teria que haver alguém a substituir as pessoas e fazer essa despesa. O Estado deveria injectar dinheiro na economia, para o crescimento económico voltar. Mas a teoria keynesiana funciona numa economia fechada. Hoje as economias, nomeadamente depois de 1990 com a liberalização do comércio internacional, são globalizadas.
Se alguém receber do Estado 200 euros, provavelmente, vai gastá-lo logo num produto importado. Vai comprar um carro novo e o dinheiro vai parar ao estrangeiro. Uma empresa recebe incentivos às exportações e compra matérias-primas na China. A população recebe subsídios e abonos e provavelmente irá comprar roupa chinesa porque é mais barata que a nacional - Existem muitas empresas portuguesas de marca com relativa qualidade que produzam na China, o caso da "Sacoor Brothers". Então a política de maiores gastos públicos para fazer crescer a economia, será contraproducente, principalmente numa economia bastante aberta como a portuguesa. Quanto mais aberta for a economia, menor será o efeito keynesiano. Poderá fazer ainda algum sentido nos EUA, onde o comércio internacional tem um peso de apenas 10%. Mas em Portugal com um peso de 50% faz menos sentido. O dinheiro vai parar ao estrangeiro, ou através de consumo de produtos importados ou mesmo colocando dinheiro em bancos estrangeiros.
"A riqueza das nações" de Adam Smith explica com clareza quais são as políticas que devem ser levadas a cabo por um governo, estimulando o sector secundário para depois exportar e obter divisas aos países estrangeiros. A desindustrialização foi um erro quer em Portugal, quer em muitos países da Europa e nos EUA. Devemos procurar excedentes comerciais. E não podemos conviver com sucessivos défices públicos. Este ano será, se tudo correr bem, de 5,9%. Mas deveria ser perto de zero, caso contrário estamos sempre a acrescentar mais peso à dívida pública.
Existe uma latente decadência da economia ocidental. A globalização trouxe com ela o aparecimento de novas potências económicas como a China, o Brasil e a Índia.
O crescimento económico no ocidente é idêntico a uma função que, em matemática, se apelida de função potência. Cresce a ritmos decrescentes. O crescimento era de 7% na década de 50 e 60, nos anos 70 e 80 de 4%, na década de 90 de 3%. E entre 2000 e 2010 cresceu a um ritmo anual inferior a 2%. Os excedentes comerciais deram lugar a défices comerciais. A indústria foi deslocalizada para a China. Este país, maior exportador mundial de bens, a par com a Alemanha, produz hoje todas as grandes marcas europeias e norte-americanas. A Dell, a Microsoft, a Nokia, a Apple, e muitas outras empresas têm fábricas na China. Neste momento é provável que esteja a ler este artigo num computador de marca ocidental, mas fabricado na China...
Paulo Monteiro Rosa, economista, 31 Outubro de 2011.
Publicado na ATM - Analistas de Mercados de Capitais
http://www.associacaodeinvestidores.com/index.php/artigos-e-teses/63-artigos/185-a-decadencia-da-economia-ocidental-a-globalizacao-e-o-keynesianismo
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