As operações de
empréstimos de longo prazo (LTRO - Long
Term Refinancing Operations) do BCE têm sido infrutíferas, quanto ao objectivo
de ceder liquidez à economia. Implicitamente o BCE está a substituir-se, sem
sucesso, ao Mercado Monetário Interbancário (MMI) que não exerce cabalmente a
sua função. No que concerne à última operação de 28 de Fevereiro, o dinheiro
foi revertido para o BCE no dia seguinte (num “reverse carry trade”,
porque os bancos irão receber 0.25% pelo depósito que pagam a 1%) após o
empréstimo histórico de 529 mil milhões de euros, a 3 anos, a 800 bancos. No
dia 21 de Dezembro, 1º LTRO, foram emprestados 489 mil milhões de euros e
acorreram 523 banco. Em Junho de 2009 houve um LTRO, mas com um prazo de 1 ano
e um montante recorde nessa altura de 442 mil milhões de euros.
A atitude dos bancos
pauta-se pela segurança e prudência, porque vão utilizar grande parte do
dinheiro na compra de dívida pública e o “carry trade” será uma
realidade. O banco transalpino Intesa Sanpaolo é um dos exemplos
paradigmáticos, que usufruiu de 24 mil milhões de euros na LTRO, 5% do
empréstimo de 28 de Fevereiro e adiantou que irá utilizar esses fundos para a
compra de títulos de dívida pública italiana. O BCE, ao contrário dos seus
propósitos, serve de mutualista às dívidas dos Estados Europeus em maior
dificuldade. O dinheiro não chega às famílias, às empresas, em suma à economia
real… O balanço do BCE triplicou desde 2008, mas serão precisos mais 2 ou 3
LTRO para o dinheiro chegar à economia real? Vide Balanço 1 e Balanço 2.
Por alguma razão, Axel
Weber desistiu de presidir ao BCE no passado dia 9 de Fevereiro de 2011, por
não concordar com a compra de dívida pública, pelo incremento do balanço do
BCE. Para Axel Weber, o BCE estava e está a fazer a mesma coisa que a FED, mas
apelidando o Quantitative Easing do BCE por LTRO…
Mas a compra de
obrigações do tesouro tem um risco inerente, que hoje em dia é bastante
significativo, digamos que não é linear o ganho dos bancos através do Carry Trade [crédito cedido a 1% e compra de títulos com
rentabilidade de 6%], veja-se o caso grego. Ainda paira muita incerteza na
Europa e as dívidas públicas vão levar muitos anos até reverterem a sua
evolução desfavorável, nomeadamente com a despesa social a ter um peso cada vez
maior quer no Orçamento dos Estados quer no PIB europeu. Os bilhetes do tesouro
como têm alguma salvaguarda e são percepcionados pelos investidores como sempre
pagos, podem ser um refúgio. No entanto, como as emissões são para prazos
curtos e os montantes menos significativos, não será neste segmento de instrumento
de dívida pública que os bancos vão, provavelmente, apostar mais
agressivamente…
Um descontrolado
aumento da massa monetária da Zona Euro é um problema que, talvez, não se
coloque actualmente. O BCE falhou no passado dia 29 de Novembro de 2011 uma
esterilização, não conseguindo drenar 9 mil milhões de euros gastos na
compra de obrigações do tesouro. O BCE vai fazendo a esterilização (manter a
mesma massa monetária ou crescimento normal de 2%) através de operações de Open Market, com a retirada de liquidez do mercado. Mas os montantes a esterilizar neste momento
são bastante significativos e não há uma esterilização possível para as
operações de LTRO. Também não faz sentido, esterilizar todo o dinheiro
emprestado, porque o BCE estaria a colocar em causa o próprio empréstimo e
cedência de liquidez! Mas, extraordinariamente, a operação é esterilizada,
torna-se inócua, através da atitude dos próprios bancos ao recolocarem o
dinheiro junto do BCE que receberam emprestado no dia anterior. Não há qualquer
alteração na massa monetária…
Será relevante verificar a evolução dos balanços dos dois maiores bancos centrais do mundo: O Banco Central Europeu e a Reserva Federal norte-americana, espelhados nos gráficos 1 e 2.
A significativa subida
do balanço do BCE já ultrapassa o incremento do balanço da FED [com todas as
injecções de capital e os dois Quantitative Easing]. De resto é uma característica de todos os
bancos centrais dos países desenvolvidos. Neste momento os activos dos bancos
centrais equivalem a cerca de 20% a 30% do seu PIB, quando há 4 anos atrás
representavam cerca de 5% do PIB e a alavancagem dos bancos centrais era de 10
vezes. Hoje o BCE tem uma alavancagem de 36 vezes… Ver gráfico 3
Por último, de realçar
a correlação positiva entre o EURUSD e o rácio do balanço Fed/Balanço BCE
(Gráf. 4). Quando o balanço do BCE aumenta, o euro tende a depreciar-se contra
o dólar. Fá-lo desde 2008 e o final do 2º e último Quantitative Easing norte-americano em Junho de 2011 espelha bem
essa correlação. A descida é contrabalançada pelo défice comercial dos EUA que
impede a apreciação do USD, enquanto a Zona Euro têm um défice comercial
praticamente nulo. Os países setentrionais excedentários nas suas contas externas
e os países periféricos com défices comerciais crónicos.
Paulo Monteiro Rosa, economista, 15 de Março de 2012
Publicado na Associação de Analistas técnicos
http://www.associacaodeinvestidores.com/index.php/artigos-e-teses/63-artigos/224-a-ineficacia-dos-emprestimos-de-longo-prazo-ltro-do-bce