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sexta-feira, 26 de abril de 2019

"Via Crucis" natalidade


A baixa natalidade é, muito provavelmente, o maior problema que as economias desenvolvidas enfrentam atualmente. Em termos de sustentabilidade financeira, a diminuição dos nascimentos nos países ocidentais e no Japão, nas últimas décadas, em si mesma não seria um problema se não tivesse associado o envelhecimento da população. Existem cada vez menos pessoas em idade produtiva para assegurar a sobrevivência e o bemestar das pessoas de faixas etárias mais avançadas, com menor ou mesmo nenhuma capacidade produtiva.

As pessoas não conseguem trabalhar quando estão doentes, seja uma gripe mais severa ou uma doença prolongada, espelhando-se na produtividade da empresa onde trabalham, na comunidade onde vivem ou no país a que pertencem.

Se, por absurdo, todas as pessoas em idade e com força para trabalhar estivessem doentes, a produção seria nula, não existiriam bens e serviços à disposição para consumir.

A consequência seria a extinção da restante população, crianças em tenra idade e idosos incapacitados, incapaz de produzir alimentos, medicamentos, roupas, habitações, e demais bens e serviços de primeira necessidade para garantir a sua sobrevivência.

A baixa natalidade e o virtuoso envelhecimento da população nos países desenvolvidos, fruto dos avanços da medicina e dos inovadores modos de produção de alimentos, podem acarretar, num futuro próximo, uma diminuição da produtividade e uma redução e mesmo desaparecimento, talvez em duas ou três gerações, da riqueza acumulada durante séculos. Muitos dirão que não existe e não veem qualquer problema porque no "longo prazo estaremos todos mortos", parafraseando John Maynard Keynes, economista britânico da primeira metade do século XX, endossando esta questão para as gerações futuras.

O que está na origem deste problema? Muitas razões. Com os avanços na agricultura e na medicina, as pessoas vivem cada vez mais e muito menos crianças morrem em idade jovem. O aumento da urbanização significa que as famílias não precisam de tantas crianças para trabalhar nos campos. Cada vez mais as mulheres atrasam o casamento e os filhos, para se dedicarem, quase exclusivamente, a uma educação mais esmerada, e que paulatinamente passa por um doutoramento e uma carreira de sucesso no mundo do trabalho.

A evidência empírica corrobora uma relação inversa entre a fertilidade e o rendimento. À medida que o PIB per capita aumenta as mulheres tendem a ter menos filhos. Crescentemente, as famílias pretendem dar aos seus filhos uma educação de qualidade que, obviamente, requer mais recursos financeiros, e limita o número de filhos.

No entanto, nos países pobres a taxa de natalidade é elevada. O tempo é relativamente barato nestes países.

O tempo gasto longe do trabalho para cuidar de uma criança não é tão caro como num país rico, onde uma mãe que trabalhe longe de casa terá um custo superior para cuidar do filho.

Uma criança precisa de mais educação para ter sucesso num país rico. Em suma, uma criança é "mais cara" num país rico e a opção das famílias acaba por ser a de ter menos filhos, mas mais educados.

A mortalidade infantil pode desempenhar um papel relevante, e quando é elevada mais nascimentos podem ser necessários para alcançar um número desejado de crianças sobreviventes, que podem cuidar dos pais quando estão velhos. Nos países ricos existem sistemas de segurança social e mercados financeiros desenvolvidos onde as pessoas têm o aforro de uma vida para a velhice. Estão menos dependentes dos filhos, que têm de trabalhar e não têm tempo para cuidar dos pais (ou não querem!).

As políticas governamentais, por sua vez, reduziram drasticamente os nascimentos entre adolescentes, nomeadamente na China. Há várias décadas que os governos franceses estimulam financeiramente ou através de benefícios fiscais os nascimentos para colmatar a fraca natalidade.

Na Alemanha a previsão para o crescimento económico foi revista em baixa para apenas 0,5% em 2019, e o país atingiu um recorde de 83 milhões de habitantes, atribuído à chegada de imigrantes, num contexto de défice de nascimentos.

Paulo Rosa, In "Vida Económica", 18 de abril 2019



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Licenciado em Economia pela Faculdade de Economia da Universidade do Porto.