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sexta-feira, 21 de junho de 2019

Semana de mínimos históricos das taxas de juro

Principais bancos centrais sinalizaram novamente uma política monetária expansionista, o que teve efeitos na rentabilidade das obrigações.

Na quarta-feira, em Sintra, o presidente do Banco Central Europeu comprometeu-se, implicitamente, com novos cortes de taxas de juro, para níveis históricos, e mais política monetária expansionista com um novo QE (Quantitative Easing). O mercado reagiu de imediato, e passou a descontar uma queda dos juros em 10 pontos base de 0% para -0.1%. A maior parte das rentabilidades das obrigações soberanas por toda a Europa registou novos mínimos históricos. As Bunds alemãs registaram mínimos de sempre nos -0,325%, e as rentabilidades negativas não param de cair. As yields a 10 anos das Obrigações do tesouro francês e sueco desceram para 0% pela primeira vez, e as rentabilidades das obrigações soberanas da Áustria registaram mínimos históricos nos -0,04%. A rentabilidade das Obrigações portuguesas a 10 anos registaram mínimos históricos nos 0,531% e o spread diminui bastante face à Bund alemã e atualmente é de 0,8% contra os 1,2% de há uma semana.

As expectativas de inflação também estão em baixa. Mário Draghi teve um discurso muita mais detalhado e preciso, em Sintra, do que havia deixado "no ar" na reunião do BCE há duas semanas. Chegou mesmo a deixar pistas quanto ao timing de uma potencial descida em torno de cortes das taxas de juro.

As cotações nos mercados acionistas europeus reagiram em alta, com ganhos perto dos 2% do DAX30 e do CAC40, claramente beneficiado pelas palavras de Mário Draghi. As palavras de Donald Trump quanto a um acordo comercial com a China também favoreceram positivamente o desempenho dos mercados.

Na quarta-feira, a Reserva Federal norte-americana manteve as taxas de juro, mas Powell abandonou a posição de "paciente" iniciada no final do ano passado, abrindo a porta a cortes das taxas de juro nas próximas reuniões.

Os futuros sobre a probabilidade de alterações nas taxas de juro, negociados na bolsa de derivados de Chicago, esperavam que a taxa de juro se mantivesse, com uma probabilidade de 76%, e indiciam uma descida das taxas de juro de referência da Reserva Federal apenas para a próxima reunião do banco central dos EUA, no final de julho, em 0,25 pontos percentuais de 2,5% para 2,25% como limite máximo do intervalo.

Em contraciclo com os restantes principais bancos centrais, o Banco Central da Noruega subiu a taxa de juro para 1,25% pela terceira vez desde setembro do ano passado, suportado pela riqueza do petróleo. O Estado Português financiou-se em 250 milhões a uma taxa negativa histórico de -0,425%, através da emissão de Bilhetes do Tesouro a três meses, inferior aos — 0,4% que o BCE remunera os depósitos, e a procura superou a oferta em 71%. Portugal também emitiu mil milhões de euros em bilhetes do tesouro ali meses à taxa negativa de -0,395%.

CRIPTOMOEDAS FACEBOOK

A criptomoeda mais famosa e prestigiada no mercado, a Bitcoin, regista máximos desde início de maio de 2018, nos 9.300 dólares por cada moeda virtual. O Facebook anunciou que irá lançar no primeiro semestre de 2020 uma moeda virtual, denominada de Libra, que vai servir para transações entre particulares e estabelecimentos, estando integrada nas plataformas digitais WhatsApp e Messenger. A criação desta nova moeda virtual tem também mão portuguesa, da Farfetch, no seu desenvolvimento. A Libra é suportada por cabaz de moedas, como o euro e o dólar, ao contrário da Bitcoin.

COTAÇÕES

PETRÓLEO E OURO

As cotações do petróleo seguem em alta, depois de dois petroleiros, um norueguês e outro japonês, terem sido alvo no dia 13 de junho, de um ataque no mar de Omã, em pleno Golfo, e do recrudescimento das tensões entre os EUA e o Irão. No entanto, a Associação Internacional de Energia (AIE) cortou as previsões para a procura global de petróleo, tal como havia feito a OPEP. O ouro beneficia das políticas monetárias expansionistas dos principais bancos centrais a nível mundial. A cotação do ouro está em máximos desde setembro de 2013, perto dos 1.400 dólares por onça, impulsionada pelas palavras de Mário Draghi e Jerome Powell.

EMPRESAS

PSI20

As acções portuguesas recuperaram ligeiramente esta semana, impulsionadas também pelo discurso de Mário Draghi. O BCP tem recuperado terreno, tendo sido um dos títulos que mais subiu na semana, e estuda fusão do Banco de Investimento Imobiliário.

A EDP reafirma que não há 'rendas excessivas' pagas aos produtores, e lança nos EUA o primeiro grande projeto de armazenamento de energia solar.

Pela negativa, destaque para as empresas do universo Sonae, que perderam cerca de 3% na semana. As empresas exportadoras de pasta de papel, Altri e Navigator, continuam penalizadas pelas incertezas da guerra comercial. 

Paulo Monteiro Rosa, 21 junho 2019, Jornal Económico

https://leitor.jornaleconomico.pt/noticia/semana-de-minimos-historicos-das-taxas-de-juro







Ouro e criptomoedas

Atualmente, a Rússia detém cerca de 2200 toneladas de ouro, um impressionante aumento superior a 250% em menos de dez anos, das 600 toneladas que tinha em 2009. Aquele pais é agora a sexta maior potência de ouro do mundo depois dos EUA, Alemanha, FMI, Itália e França. Porém, o ouro por si detido é apenas 25% do ouro possuído pelos EUA. No entanto, como a economia russa representa 10% da economia norte-americana, o rácio entre o ouro por si detido face e ao seu PIB é quase três vezes superior ao dos EUA.

A Rússia é um dos maiores produtores de energia do mundo, que é exportada em grande parte em dólares. A compra de ouro, segundo este país, poderá trazer estabilidade quanto a uma potencial inflação do dólar. Também é uma forma de evitar eventuais sanções dos EUA. O ouro não é digital e não se move através de sistemas de pagamentos eletrónicos, então é muito difícil para os EUA impedirem a sua transação, mesmo que equacionasse uma massiva alienação deste ativo.

No entanto, segundo alguns analistas, existe uma razão mais profunda para a acumulação de ouro por parte da Rússia, que terá um plano de longo prazo para diminuir a influência do dólar como principal moeda de reserva global. Obviamente, o rublo russo não está posicionado para ser uma moeda de reserva, mas uma nova criptomoeda apoiada pelo ouro seria um bom candidato. Um regresso ao padrão-ouro estará a ser equacionado pelo Banco Central da Rússia, e não é o único país com esse objetivo. A China faz parte também dessa lista.

O ouro é uma forma de dinheiro, e tem propriedades únicas como o dinheiro. Mas a baixa volatilidade do ouro, nomeadamente nos últimos anos, e em relação ao dólar (e este continua aqui como principal referência), pode não compensar o potencial risco que o ouro representa no que concerne aos ciclos económicos. Imaginemos que é descoberta uma mina incomensurável de ouro ou uma forma de aceder ao centro da Terra, que é em parte constituído por ouro, estaríamos então perante uma inflação enorme de ouro oferecido.

A Rússia, a China, o Irão e outras nações poderão estar concertadas para usar uma criptomoeda com apoio de ouro para comércio internacional para afastar a hegemonia do dólar americano como moeda de reserva global dominante.

Mas a cotação do ouro não teve movimentos significativos com estas notícias. Os preços do ouro são muito mais propensos a serem afetados pela força ou fraqueza do dólar, taxas de juros reais, perspetivas quanto à inflação da economia norte-americana e tensões geopolíticas.

Mas o anúncio é altamente significativo de outra maneira. Isso sinaliza que a procura por ouro físico pelos principais bancos centrais está aqui para ficar. Se uma nova criptomoeda com apoio de ouro emerge, no próximo ano ou daqui a cinco anos, tal facto não altera a necessidade de o deter para ter uma moeda suportada pelo ouro.

Nem a Rússia nem a China têm todo o ouro necessário para esse fim, pelo que a procura por ouro físico tenderá a permanecer forte. O ouro cota atualmente nos 1350/60 dólares dos EUA /onça troy (31,1034768 gramas). Nos últimos dez anos, a Rússia tem comprado, em média, cerca de 15 toneladas de ouro mensalmente. As compras de ouro pela China são menos transparentes, mas detém também mais de 2000 toneladas, e alguns analistas pensam mesmo que terá talvez muito mais.

Para alcançar uma paridade estratégica de ouro com os EUA, a China e a Rússia, deveriam ter uma quantidade maior de ouro. O que todas essas estratégias de compra de ouro têm em comum é o desejo de escapar à hegemonia do dólar e à imposição de sanções pelos EUA. A implicação prática para os investidores de ouro é um provável suporte para as cotações do ouro desde que a Rússia e a China comprem sempre que se verifique uma correção em baixa.

O principal fator que talvez mantenha os preços do ouro nos atuais níveis, e não mais acima, é o dólar forte. A moeda norte-americana foi suportada por uma política da FED de aumento das taxas de juros e redução da oferta de moeda, o chamado "aperto quantitativo" ou QT ("quantitative tightening"). No entanto, a FED reverteu o curso de aumento das taxas em dezembro passado e anunciou que encerrará o QT em setembro, e baixará mesmo as taxas em 25 pontos base a 31 de Julho e mais 25 pb a 18 de setembro, segundo os futuros sobre a probabilidade de mexidas de taxas negociados na bolsa derivados de Chicago. Estas medidas podem tornar o ouro mais atrativo para os investidores em dólares. 

Paulo Monteiro Rosa, In "Vida Económica", 21 de junho de 2019
 




sexta-feira, 7 de junho de 2019

A ECONOMIA E A FÍSICA: O EFEITO GRAVITACIONAL

As leis da física também se aplicam à economia, nomeadamente o efeito gravitacional. Os corpos mais pequenos são atraídos pelos maiores. Os planetas gravitam à voltam de corpos maiores, de estrelas. As galáxias gravitam em torno do seu próprio centro.

No modelo de Von Thünen, as cidades maiores atraem mais pessoas.
E quanto mais atraem, maior será o seu poder de atração. A medida que a sua massa vai aumentando, incrementa também o seu poder de atração, pelo que tenderá a ser maior a sua gravidade.
Quanto maior, mais centros de decisão se fixarão nessa cidade, quer públicos quer privados, e logo mais crescem e assim sucessivamente. Em princípio, um círculo virtuoso de crescimento para a cidade em causa, mas que acarreta os problemas de crescimento, como trânsito caótico, poluição...
Acontece também na física. Os corpos maiores atraem os menores. A Terra atrai a Lua. O Sol atrai a Terra e os restantes planetas do sistema solar.

Em termos financeiros, as maiores praças influenciam as bolsas mais pequenas. Em suma, podemos "grosso modo" dizer que todas as praças financeiras mundiais gravitam em torno das bolsas norte-americanas, nomeadamente do que se passa em Nova Iorque, mais particularmente em Wall Street.
Os dados macroeconómicos norte-americanos, desde o mercado de trabalho nos EUA ao PIB, são os mais importantes a nível mundial e influenciam o andamento das bolsas norte-americanas e, consequentemente, as restantes praças mundiais. É o poder gravitacional da maior massa crítica de Wall Street em relação aos poios bolsistas mais pequenos.

As cotações dos títulos sobem paulatinamente, sobem devagar, porque existem sempre vendedores no mercado, é preciso por vezes realizar dinheiro, arranjar liquidez para pagar um empréstimo que venceu, para realizar um investimento, para algum imprevisto que surja. No entanto, as cotações dos títulos descem bastante mais rápido do que sobem, porque para comprar, perante a incerteza, temos tempo. Não devemos "apanhar facas a cair", logo existem menos compradores, ou por vezes nenhum mesmo, como aconteceu no dia 24 de outubro de 1929, quinta-feira negra, na bolsa de Nova Iorque, quando 12 milhões de títulos foram colocados à venda e não existiam compradores, criando-se o "crash" bolsista. Toda a gente queria vender...

Atualmente, os gráficos mostram essa evidência empírica. Sobem devagar e com volume crescente, e os topos fazem-se sem liquidez. Depois caem, e à medida que vão descendo a liquidez aumenta e os fundos são realizados com liquidez.
Parafraseando alguns investidores, "as cotações das ações sobem pelas escadas e descem pelo elevador", e por vezes acabam mesmo por cair pela janela.
Subir um prédio pelas escadas custa, a gravidade, o efeito gravitacional puxa- -nos para baixo, para o centro da Terra.

Pode-se subir por elevador, mas existem sempre gastos de energia, neste caso elétrica. Subir uma rampa de bicicleta custa bastante, mas descê-la é bastante rápido.
A criação de uma empresa e o seu crescimento demoram muito tempo a construir, mas são destruídas facilmente, depressa ou mesmo em instantes perante erros de gestão.
Na física, uma casa demora tempo a construir, bem como um prédio, uma ponte, mas bastam alguns segundos para serem implodidos.

As guerras destroem em poucos anos países, cidades, património que levaram décadas, séculos a serem construídos.

Hoje, com o armamento nuclear, que os atuais conhecimentos da física nos colocou nas mãos, poderemos estar a falar de minutos para o extermínio da humanidade...
A economia e os mercados financeiros gravitam em torno de si próprios, com a ação humana a criar centros de gravidade que aumentam com uma voracidade cada vez maior, e o colapso de um "buraco negro" bolsista pode estar ao virar da esquina... entrando, então, num evento "espaço-tempo em que os campos gravitacionais são imensos", como disse Herman Minkowski, professor de Albert Einstein.

Paulo Rosa, In semanário "Vida Económica", 7 junho 2019



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Licenciado em Economia pela Faculdade de Economia da Universidade do Porto.