A inflação de preços no consumidor é influenciada sobretudo pela oferta e procura de moeda e pela oferta e procura de bens e serviços. O modelo macroeconómico IS-LM procura responder às interações existentes das taxa de juro e do PIB nos mercados monetário e de bens e serviços, onde a curva “IS” identifica o equilíbrio no mercado de bens e serviços, enquanto na curva “LM” é representado o equilíbrio no mercado monetário. Aumentos da oferta de moeda pelos bancos centrais, base monetária, espelhados na expansão da moeda na economia, massa monetária, são fatores inflacionistas, bem como uma diminuição da procura de moeda, ou seja, uma redução da preferência por liquidez (menor entesouramento).
A nova moeda criada pelos bancos centrais não é neutra quando entra no sistema financeiro e económico, e primeiro favorece quem está mais perto dela, tal como referiu Cantillon. O aumento da oferta monetária pela Reserva Federal norte-americana (FED) através da compra de ativos, nomeadamente títulos do tesouro e títulos garantidos por hipotecas, impulsiona a cotação não só destes títulos, cuja rentabilidade diminui, mas também de ativos de maior risco, como as ações e o imobiliário, na contínua procura dos investidores por rentabilidade, cuja relação é inversa à cotação. Habitualmente, mais tarde, o novo dinheiro acaba por chegar aos consumidores e impacta o nível da inflação. Atualmente, os pacotes de estímulos do governo norte-americano, cheques e aumento dos subsídios de desemprego, bem como os apoios governamentais às pequenas e médias empresas, que acabam também por gerar dinheiro novo para pagar salários, nomeadamente através de empréstimos com juros baixos, podem redundar em inflação.
A administração de Joe Biden pretende aumentar o salário mínimo para 15 dólares por hora, uma medida potencialmente inflacionista, mas transitória no índice de preços no consumidor se não existirem sucessivos aumentos ao longo do tempo. O aumento do salário mínimo elevará os custos das empresas, e algumas preferem reduzir a produção a ter prejuízos, o que resultará na perda de empregos, mais subsídios de desemprego, mais pessoas a consumirem, menos produção e consequente subida da inflação. A taxa de desemprego de 14,8% em abril do ano passado, a mais elevada desde a grande depressão há 90 anos, tem recuperado rapidamente e está aos níveis de 2014, e Janet Yellen pretende atingir o pleno emprego em 2022. Aquando da grande recessão de 2008-09, foi necessária quase uma década para a recuperação do pleno emprego nos EUA. Porém, há muito que o fator trabalho é deflacionista, motivado pela descida do peso dos salários dos 48% no ano 2000 para 43% atualmente.
Existem também forças deflacionistas do lado da oferta do mercado de bens de consumo. A aceleração da quarta revolução industrial significa mais e melhores produtos e serviços, a um custo menor. O comércio internacional permite maximizar as reservas mundiais de mão de obra e produzir mais bens a um custo menor, mas os custos da mão de obra chinesa integrados na economia mundial tendem a ser menos deflacionistas, no entanto a Indochina, a índia, a América Latina e o continente africano podem tomar o seu lugar na globalização mais deflacionista. O excesso de capacidade instalada permanece elevado e permite menores custos de produção, e é um dos principais fatores deflacionistas do lado da oferta, como se pode ver pela capacidade de utilização da indústria manufatureira medida pela FED nos 73%.
A pandemia criou um pontual cenário deflacionista do lado da procura, normal nas recessões económicas, desde congelamentos de rendas das casas, menos procura de bens e serviços e maior procura por liquidez. E, singular a esta crise pandémica, a substituição de 7,5% de serviços por bens, tendencialmente mais baratos. Todavia, nos próximos trimestres é esperada uma reversão e consequente pressão inflacionista. As rendas das casas, após a retoma do emprego e dos rendimentos das famílias, serão renegociadas em alta. Porém, a habitação no PCE, medida da inflação utilizada pela FED, pesa apenas 15%, contra 31% no IPC, e justifica, em grande parte, o menor valor do PCE em relação ao CPI.
PAULO ROSA Economista Sénior do Banco Carregosa, In Vida Económica, 12 de fevereiro de 2021
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