Nas últimas 3 semanas, o Banco Central Europeu (BCE) comprou mais 41
mil milhões de euros em títulos do sector público, ao abrigo do
"Quantitative Easing", o programa de compra de dívida pública, iniciado a
9 de março.
O BCE funciona como uma fábrica de dinheiro que
não vende ao público. O artigo 123º do Tratado de Lisboa veda ao BCE
qualquer empréstimo aos Estados, mas permite-lhe comprar títulos de
dívida pública em mercado secundário, baixando, indiretamente os custos
de financiamentos dos Estados.
São os bancos, como instituições de
retalho, que fazem chegar o dinheiro às pessoas e empresas. Uma fábrica
de sapatos não vende ao público, são as sapatarias que têm essa função…
Esse esmagamento das taxas de juro provocado pelo BCE proporciona, pela
diminuição de alternativas de investimento, uma valorização dos títulos
de dívida das empresas, das ações e também do imobiliário e,
consequentemente, os detentores destes títulos beneficiam de um
incremento patrimonial que poderá resultar numa maior propensão ao
consumo e crescimento económico por esta via…
Este plano tem um
objetivo: injetar liquidez na chamada "economia real", isto é, famílias
e empresas. O BCE cria o dinheiro e concede-o aos bancos (OIM, Outras
Instituições Monetárias) mas para chegar a quem o pede tem que passar o
crivo do analista de crédito. Esse crivo é mais ou menos apertado,
consoante a política que a administração do banco defina para o risco de
crédito.
Tal como uma garrafa que, apesar de já estar cheia, é
pressionada quase a dilatar-se a cada dia que passa, forçando o
apertado gargalo a alargar-se… O BCE está a tentar empurrar os bancos
para empréstimos que antes estariam fora de questão.
Para que o
dinheiro chegue à economia é preciso, em primeiro lugar, que os agentes
económicos - famílias e empresas - estejam recetivos a tomar dívida ou
mais dívida para além daquela que têm e essa decisão depende do preço
desse crédito, ou seja a taxa de juro a que os bancos (OIM) emprestam.
Como num outro qualquer setor, os bancos tentam vender crédito a um
preço superior ao que compraram ao BCE ou captaram através dos depósitos
aos seus clientes. E como acontece com outros bens ou serviços, a
propensão para o consumo aumenta à medida que o preço diminui. Os
agentes económicos só tomarão novo dinheiro se esse crédito for mais
barato. A base monetária, ou seja a moeda emitida pelo BCE, pode
aumentar indefinidamente mas se se mantiver nos bancos (nas OIM) a massa
monetária como um todo não aumenta.
O total do stock de moeda
numa economia é designado por massa monetária. Ou seja, os bancos
comerciais, através do multiplicador monetário sobre a base monetária,
também criam moeda a qual é denominada por moeda crédito (massa
monetária = multiplicador monetário X base monetária). Se os bancos não
emprestarem, o multiplicador monetário mantém-se inalterado, logo a
massa monetária não aumenta.
No entanto saliento que a base
monetária é constituída pela moeda em circulação, notas e moedas,
acrescida das reservas dos bancos, compulsórias e livres, junto do banco
central. E como estas reservas bancárias não estão na posse dos agentes
económicos – logo não estão na economia - para um cálculo mais
fidedigno, fará algum sentido expurgar o seu montante do total da massa
monetária.
Penalizados com o crédito malparado dos últimos
anos, a análise de risco de crédito dos bancos ficou mais exigente. A
situação é quase paradoxal: os bancos estão inundados de dinheiro vindo
do BCE, a um preço (taxa de juro) de 0%, mas nem por isso estão a
conceder mais crédito.
O programa de compra por parte do BCE de
ativos aos bancos melhora os rácios dos bancos. Com melhores balanços e
mais almofadas, as administrações dos bancos ficam mais confortáveis
para alargar o mercado do crédito, oferecer mais produtos e vender mais.
O problema é que uma parte dos agentes não tem mesmo capacidade para
solver os seus compromissos e pagá-los, e a outra parte não precisa de
crédito.
Podemos concluir que um "quantitative easing da banca"
só acontecerá se o risco das famílias e empresas, tal como percecionado
pelos bancos, for diminuindo.
Por isso, a melhor forma para
estimular a economia é diminuir os impostos e a despesa pública, papel
que cabe aos governos, e para o qual o BCE já alertou.
Paulo Monteiro Rosa, economista.
In Vida Económica, 2 de abril.
A transversalidade e Universalidade da ciência económica. O objecto de estudo da economia é a maximização do bem-estar do ser humano, mas não deixa de ser em sentido estrito. A ciência económica é mais abrangente. A todos os seres vivos e não vivos. Ver página "descrição do blog".
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