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quarta-feira, 26 de agosto de 2015

E agora, lutar ou fugir?



A Correção chegou ao outro lado do Atlântico. Os mercados acionistas norte-americanos registaram a pior semana desde 2011, a refletir não só o abrandamento da produção industrial chinesa dos últimos 6 anos, mas também o receio quanto ao arrefecimento da economia dos EUA.

Os alertas não são de agora. Há vezes meses, mesmo já durante o ano de 2014, os sinais de correção estavam de certa forma implícitos. O imobiliário na China e Hong Kong está a níveis exorbitantes há vários anos e mesmo nos EUA já se encontra neste momento aos níveis de 2006, perto do auge antes da crise do imobiliário neste país. O esmagamento das taxas de juro pelos principais bancos centrais do mundo, através de agressivas políticas monetárias inflacionistas, através da criação de mais dinheiro, através de cedência de liquidez aos bancos e mais tarde sucessivos “Quantitative Easings” (QE), bem como pela descida das taxas de juro de referência para valores praticamente de 0%, descidas artificiais e a pisar terreno jamais experienciado no passado. A queda das obrigações. A descida acentuada das bolsas chinesas tem arrastado os mercados dos países emergentes, nomeadamente os asiáticos, e agora está a atingir as praças europeias e norte-americanas. Os problemas geo-políticos em várias regiões.

A desvalorização da moeda chinesa, o yuan-renminbi, há duas semanas, não é mais que um reflexo à desvalorização consecutiva do dólar americano (USD), do iene japonês (JPY) nos últimos anos e à queda do euro no último ano, tudo reflexo dos “Quantitatives Easings” e das descidas das taxas de juro pelos bancos centrais destas zonas económicas. As autoridades chinesas estão apenas a ajustar a sua moeda às principais moedas mundiais. No entanto esta atitude demonstra também a fraqueza que se assiste na China, plasmada na correção dos mercados acionistas e no abrandamento, para mínimos dos últimos 6 anos, do forte ritmo de crescimento da produção industrial a que todos estavam habituados a assistir na segunda maior economia do mundo.

O preço das matérias-primas em mínimos espelha a diminuição da procura mundial. O petróleo cotado nos EUA, o WTI de nova Iorque, baixou, pela primeira vez desde 2009, dos 40 USD/Barril. Este é a maior referência para a cotação do petróleo mundial a par do Brent de Londres. O petróleo desce há 8 semanas consecutivas, o maior ciclo de quedas desde 1986.

No 2º trimestre do ano os lucros das empresas que compõe o S&P500, um dos principais índices acionistas norte-americanos, cresceram ao ritmo mais baixo dos últimos 6 anos. Os lucros subiram em média apenas 0.07 USD/ação relativamente ao trimestre homólogo de 2014. A preocupação da Reserva Federal dos EUA deixou de ser o “timing” da subida das taxas de juro, e passou a ser a baixa inflação e o abrandamento económico. A bolsa de Shanghai registou nesta segunda-feira a maior queda desde 2007.

O que os investidores devem fazer agora? Lutar ou fugir? A emoção não se deve apoderar das decisões dos investidores. Este devem ser racionais, disciplinados. Perante a forte queda das bolsas americanas muitos investidores, que até agora se mantinham fieis e firmes a aguentar as suas carteiras, não acreditando que os mercados poderiam encetar uma correção a qualquer momento, descurando os sinais que iam surgindo, entraram agora em pânico e querendo desfazer-se de todos os títulos em carteira, alienar tudo. Um “panic sell” não é salutar…

O ser humano, a par dos animais mais evoluídos, é dotado de uma parte primitiva junto ao tronco cerebral, o complexo reptiliano. Uma ferramenta de sobrevivência imprescindível, que nos diz, perante uma ameaça, se devemos lutar ou fugir. O investidor que não consegue lidar com estes sinais emanados do nosso cérebro vai entrar em pânico, não conseguindo perceber se perante a ameaça da queda dos mercados deve fugir, alienando toda a carteira, ou enfrentar a correção dos mercados e esperar por um “pullback”, uma recuperação em alta depois das fortes descidas, porque por vezes os mercados amplificam as quedas. Deve, racionalmente, enfrentar a ameaça e analisar se consegue superá-la ou não.
Um investidor assustado não deve descurar o seu instinto de sobrevivência: Lutar ou fugir. Este existe para o ajudar. Jamais deve entrar em pânico, sob pena de ser mal sucedido…

Paulo Monteiro Rosa, 24 de Agosto de 2015

segunda-feira, 17 de agosto de 2015

O colapso do BES. Um ano depois e 12 mil milhões de euros a menos.


Um ano após a resolução do Banco Espírito Santo, decidida pelo Banco de Portugal a 3 de agosto de 2014, a bolsa portuguesa não é mais a mesma e as metamorfoses são evidentes, desde a perda generalizada de valor à constituição do PSI20, hoje, com apenas 18 empresas. A desconfiança no banco e a descapitalização nos meses antecedentes, nomeadamente depois de uma empresa do Grupo Espírito Santo (GES) no dia 25 de junho de 2014 não ter honrado o pagamento de uma dívida, acabariam por culminar na queda do BES.

Em julho ocorreu a derrocada do GES, com o pedido de proteção contra os credores do Espírito Santo Financial Group. Devido à ligação umbilical entre o BES e GES, o contágio ao banco foi inevitável, e era uma questão de dias para o banco, que perdia crédito e o crédito dos investidores a cada hora que passava, colapsar. Havia várias hipóteses para tentar solucionar o problema do BES e restaurar a confiança no sistema bancário português como um todo. A liquidação, a nacionalização, a recapitalização através de um aumento de capital a realizar pelos acionistas ou pela entrada de um novo acionista privado, apesar de nenhum grupo bancário suficientemente robusto ter mostrado interesse nesta última hipótese, e por fim a resolução do banco, medida que viria a ser adotada. A resolução, por parte do Banco de Portugal, centrou-se na cisão do BES em duas novas instituições financeiras: o "bad bank", constituído pelos ativos de cobrança duvidosa e sem licença bancária e o Novo Banco para onde transitaram a generalidade da atividade e do património do BES, devidamente capitalizado e expurgado de ativos de difícil cobrança ou de complexo aferimento do seu valor. O capital social do Novo Banco, de 4,9 mil milhões de euros, foi integralmente subscrito pelo fundo de resolução, constituído pelos bancos portugueses, tendo a Caixa Geral de Depósitos e o BCP como principais acionistas, e capitalizado com um empréstimo de 4 mil milhões de euros do Estado Português. Os depósitos foram salvaguardados, bem como as obrigações não subordinadas.

A queda do BES não arrastou só o maior grupo português de sempre das telecomunicações, gerou uma significativa desconfiança no setor financeiro português, espelhada nas cotações dos bancos nos dias seguintes à resolução. Originou também um pleno descrédito abrangente a toda a praça portuguesa. O PSI20 perdeu 20% até ao final de 2014, movimento contrário ao verificado nas principais bolsas mundiais. Os investidores estrangeiros alienaram os títulos que tinham em carteira, quer fossem financeiros ou não. A cotação do BES foi suspensa, a 1 de agosto, a 0,12 €. O acabaria por ser retirado do PSI20, a valer zero, no dia 11 de agosto, subtraindo 675 milhões de euros ao índice. O BES cotava a 1,30 em maio e representava cerca de 12% do PSI20. O empréstimo de 897 milhões de euros da Portugal Telecom, atual Pharol, à Rio Forte enviesou a fusão da operadora portuguesa com a OI e levou, a par do fraco desempenho da empresa brasileira, à queda de 80% num ano. Hoje cota a 0,33 €, e cerca de 6% foram subtraídos ao PSI20. índice PSI20 perdeu 20%, desde a resolução do BES até ao final do ano de 2014, devido à desconfiança em torno do BES e da Portugal Telecom. Se, por hipótese, desses 20% metade for da responsabilidade do descrédito provocado pelo BES, podemos avançar, grosso modo, que muito provavelmente o colapso deste banco, retirou à bolsa portuguesa entre 25% a 30%, à volta de 12 mil milhões de euros cerca 7,5% do PIB português.

In Vida Económica, 7 de Agosto de 2015



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Licenciado em Economia pela Faculdade de Economia da Universidade do Porto.