Uma reestruturação da dívida pública implica uma renegociação com o
objetivo de reduzir o valor do stock de dívida. Por definição, está
ligada a um incumprimento que pode passar por um mero atraso no
pagamento dos juros ou na amortização de capital, ou, mais grave para a
credibilidade e novo acesso aos mercados, um "haircut", ou seja a perda
de parte do capital dos credores.
Normalmente, e assim
aconteceu na Grécia, as perdas são infligidas apenas aos detentores de
obrigações do tesouro (OT, dívida com prazo superior a um ano). Os
bilhetes do tesouro (BT, dívida de prazo igual ou inferior a 12 meses)
não são abrangidos pelos "haircut". Os Certificados do Tesouro e de
Aforro, financiamentos ao Estado por parte essencialmente das famílias,
também não costumam ser alvo de reestruturações.
Por isso a
Grécia viu vedado apenas o mercado de OT e continuou a financiar-se
através da emissão de BT, apesar de taxas bastante elevadas. Os BT
seguem, como referência, as taxas das OT do mercado secundário.
Caso a reestruturação seja unilateral, o evento é considerado um
incumprimento e as agências de rating imediatamente classificam a dívida
com o nível "D" de "default". Caso haja uma participação voluntária dos
credores, pode existir ou não um incumprimento ou apenas renegociação.
De qualquer forma, falar-se em incumprimento pode espoletar, só
por si, uma subida significativa das yields das OT porque os
investidores apressam-se a vender as OT, a cotação desce e a sua
rentabilidade (yield) sobe.
Não será exato dizer que os
mercados "atacam a dívida" de determinado país. Os mercados defendem-se
da expectativa de perdas futuras mais avultadas. Não devemos
esquecer-nos de que o mercado está sempre na mão dos compradores. Não é
imperativo para um investidor comprar dívida pública portuguesa, ou
outro ativo financeiro qualquer.
O comprador vai esperar pela
oportunidade certa para entrar no mercado. Porém, existem vendedores que
não podem esperar. Existe sempre a propensão para efetuar vendas,
porque poderemos precisar de realizar dinheiro para investir noutro
ativo financeiro, na compra de uma casa, na aquisição de uma empresa.
Por isso as descidas são rápidas quando quase não há compradores, e as
subidas se fazem mais devagar, pois existem sempre vendedores. Os
credores serão os principais penalizados. Se alguém empresta dinheiro,
obviamente quer receber o dinheiro emprestado, com os juros acordados e
no tempo estipulado. Caso haja um incumprimento, ninguém emprestará mais
dinheiro a essa pessoa. Quem empresta perante a probabilidade de não
reaver o seu dinheiro?
Porém, os fundos especulativos estarão
propensos a emprestar dinheiro passados poucos anos do “default”. Além
disso a memória de muitos investidores é curta… e voltam mais cedo, do
que seria de esperar, a comprar dívida de países que incumpriram.
Apesar do Banco Central Europeu estar a comprar dívida pública
nacional, há duas semanas a taxa de juro implícita (yield ou
rentabilidade) da OT a 10 anos portuguesa cotou ligeiramente acima dos
4.5%. Nestes valores é muito difícil um financiamento através do
mercado, porque o serviço da dívida aumentaria substancialmente e
consequentemente o défice orçamental. Mesmo aos valores atuais de 3.5%,
seria mais vantajoso ser financiado pela Troika, mas teríamos que seguir
o guião, para as metas das contas públicas. Dirão alguns que um
orçamento do Estado elaborado sob a rigidez da Troika seria mais
saudável para as contas públicas devido ao seu rigor, do que por um
governo legitimamente eleito pelo povo. Será assim? Sabemos de antemão
que as populações querem dinheiro no bolso no presente, o futuro é o
futuro…
Existem apenas quatro agências cujo rating serve de
referência para a elegibilidade para a compra do BCE, que tem que ser
"investment grade": a S&P, a Fitch e a Moody's, que mantêm a dívida
pública portuguesa como "não investimento", ou seja, "junk bond". A
única agência de rating que nos permite aceder às compras do BCE, porque
mantém o nosso rating um patamar acima de "junk bond", e assim torna a
nossa dívida elegível para ser comprada pelo BCE no âmbito do QE
iniciado em março de 2015, é a DBRS. Ela irá pronunciar-se novamente a
29 de abril.
Paulo Rosa In "Vida Económica", 26 de fevereiro de 2016.
A transversalidade e Universalidade da ciência económica. O objecto de estudo da economia é a maximização do bem-estar do ser humano, mas não deixa de ser em sentido estrito. A ciência económica é mais abrangente. A todos os seres vivos e não vivos. Ver página "descrição do blog".
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