Quem trabalha numa sala de mercados, já atendeu muitos clientes a
perguntar por títulos seguros. Estes investidores querem comprar algo
que seja seguro e chegam mesmo a sugerir algumas hipóteses, acreditando
que há casos de empresas que seria impossível vê-las falir ou
desvalorizar muito. Estas perguntas abundam em períodos em que, como
agora, "os depósitos a prazo no banco não dão nada!"
Não há títulos seguros em termos absolutos. Há apenas títulos mais seguros que outros, em termos relativos.
A casa financeira Jefferies, no passado 2 de setembro, reviu em baixa o
preço alvo dos CTT de 11 para 7 euros, alterando a recomendação de
comprar para manter. O título CTT é visto por uma boa parte dos
investidores como um "título seguro". Se cair um pouco é de comprar
porque vai sempre recuperar e dar um bom encaixe no futuro. No entanto,
no último ano, os resultados não superaram as expetativas dos
investidores. O negócio tradicional dos CTT e que corresponde à área não
liberalizada, o correio postal, está em declínio. A distribuição de
encomendas postais tem muitos concorrentes e mais eficientes. O
recém-criado Banco Postal, apesar dos custos terem sido baixos, não tem
sido a mais-valia que se esperava, não só porque o negócio ainda tem
muito caminho para fazer até chegar ao break-even (ponto de equilíbrio
no balanço) mas principalmente pelo momento menos favorável que o setor
bancário está a passar.
Pois este título, que aparentemente os
investidores têm como seguro e sólido, já perdeu cerca de 40% desde
novembro do ano passado. Títulos seguros? Podemos afiançar títulos mais
seguros que muitos outros, mas não conseguimos apontar um que seja
seguro e totalmente isento de risco. Até um certificado de aforro, dos
ativos financeiros mais seguros que existem, tem o seu risco inerente.
Esta conclusão sobre o risco dos ativos financeiros ficou mais
percetível desde a crise financeira de 2008...
A Navigator,
antiga Portucel Industrial, é um bom título, uma exportadora de
excelência, com elevada rentabilidade do dividendo (dividend yield). É
um título seguro? Vamos ganhar sempre dinheiro? Ninguém pode garantir. A
procura de pasta de papel pode diminuir caso se passe a utilizar menos
papel por alguma razão tecnológica. Mas a Navigator também produz
energia através da biomassa! E quem nos garante que não aparecem outras
empresas com uma energia nova no futuro?
No curto prazo –
durante uma semana ou alguns meses haveralgum desfasamento entre a
cotação de uma ação e o valor da empresa, mas no longo prazo a cotação
reflete quase sempre o valor da empresa. Exceção feita, muitas vezes, às
ações de empresas muito especulativas, em fase de falência ou que
apresentam os relatórios e contas atrasados em mais de três anos.
Ou seja, quando existe uma significativa assimetria de informação, a
negociação destes títulos é realizada exclusivamente por especuladores
e/ou profissionais, não se aconselhando o investidor particular a
alimentar qualquer propensão para investir nestas empresas.
Paulo Rosa, In jornal semanário "Vida Económica", 30 de setembro de 2016
A transversalidade e Universalidade da ciência económica. O objecto de estudo da economia é a maximização do bem-estar do ser humano, mas não deixa de ser em sentido estrito. A ciência económica é mais abrangente. A todos os seres vivos e não vivos. Ver página "descrição do blog".
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sexta-feira, 30 de setembro de 2016
sexta-feira, 23 de setembro de 2016
A Queda de um Anjo
Soubemos há poucos dias que os EUA têm a intenção de multar o
Deutsche Bank (DB) em 14 mil milhões de dólares para dar como terminado
um processo ligado à crise do “subprime”. O banco alemão, tal como
outros, é acusado de ter vendido, antes da crise financeira de 2008,
créditos imobiliários de elevado risco, os denominados RMBS (Residential
Mortgage-Backed Security). Em abril o banco norte-americano Goldman
Sachs pagou uma multa de 5 mil milhões de dólares num caso semelhante. O
montante de 14 mil milhões de dólares equivale a quase 80% do valor em
bolsa do DB, cerca de 8% do PIB português e ronda o valor atual das
reservas de ouro portuguesas. O banco alemão já colocou de parte 2 mil
milhões de dólares, mas diz que não tem intenção de pagar o total da
dívida.
Desde o dia 16, em apenas três dias, as ações do DB perderam 14%, mas o mais impressionante foi a queda de 15% das obrigações perpétuas, batendo nos mínimos de fevereiro. O Deutsche Bank reportou, a 28 de janeiro, um surpreendente prejuízo de 6.8 mil milhões de euros relativos aos resultados de 2015 como consequência dos custos com litígios e reestruturações. Nas duas semanas seguintes, as obrigações perpétuas caíram 20% de 88 para 70 e as ações sofreram quedas na ordem dos 22%. Após algum alívio, e correção em alta, os títulos do DB voltaram às quedas mais acentuadas depois de ter sido divulgado o chumbo do banco alemão nos testes de stress feitos nos EUA, a par do Santander.
A elevada alavancagem em derivados do Deutsche Bank é
mais um ingrediente para uma situação bastante delicada quer para o
banco, para a Alemanha e também para o sistema financeiro mundial.
Alguma coisa a Alemanha terá que fazer se quiser salvar o DB.
Segundo um relatório do FMI no final de junho, o Deutsche Bank é o banco com o maior risco sistémico do mundo e afirma mesmo que no exterior supera o risco da própria Alemanha. As taxas de juro muito baixas, quase de zero ou mesmo negativas nalguns prazos, alicerçadas numa política monetária fortemente expansionista do Banco Central Europeu (BCE) potenciam também, e significativamente, esse risco. Na lista apresentada pelo FMI e encabeçada pelo Deutsche Bank, seguem-se o HSBC, o maior banco da Europa, e o Crédit Suisse.
Estará todo o sistema bancário mundial depauperado e a precisar de um resgate? Muito provavelmente, sim. A banca chinesa está, de dia para dia, numa situação cada vez mais difícil. Ainda esta semana vimos, através da divulgação do BIS, o significativo “gap” entre o crédito e o PIB chineses, que atinge os inimagináveis 30.1%. Acima de 10% já se está numa situação bancária bastante delicada. Os maiores bancos europeus não param de surpreender negativamente os investidores. Também os bancos da Europa mediterrânica, nomeadamente em Itália e Portugal, o BCP e o Monte Dei Pachi de Siena, com um Texas Ratio bastante elevado, espelham uma preocupante carteira de crédito malparado. O risco de uma crise do sistema bancário é bastante plausível…
Publicado In "Vida Económica" a 23 de setembro
Escrito a 20 de setembro
Desde o dia 16, em apenas três dias, as ações do DB perderam 14%, mas o mais impressionante foi a queda de 15% das obrigações perpétuas, batendo nos mínimos de fevereiro. O Deutsche Bank reportou, a 28 de janeiro, um surpreendente prejuízo de 6.8 mil milhões de euros relativos aos resultados de 2015 como consequência dos custos com litígios e reestruturações. Nas duas semanas seguintes, as obrigações perpétuas caíram 20% de 88 para 70 e as ações sofreram quedas na ordem dos 22%. Após algum alívio, e correção em alta, os títulos do DB voltaram às quedas mais acentuadas depois de ter sido divulgado o chumbo do banco alemão nos testes de stress feitos nos EUA, a par do Santander.
Segundo um relatório do FMI no final de junho, o Deutsche Bank é o banco com o maior risco sistémico do mundo e afirma mesmo que no exterior supera o risco da própria Alemanha. As taxas de juro muito baixas, quase de zero ou mesmo negativas nalguns prazos, alicerçadas numa política monetária fortemente expansionista do Banco Central Europeu (BCE) potenciam também, e significativamente, esse risco. Na lista apresentada pelo FMI e encabeçada pelo Deutsche Bank, seguem-se o HSBC, o maior banco da Europa, e o Crédit Suisse.
Estará todo o sistema bancário mundial depauperado e a precisar de um resgate? Muito provavelmente, sim. A banca chinesa está, de dia para dia, numa situação cada vez mais difícil. Ainda esta semana vimos, através da divulgação do BIS, o significativo “gap” entre o crédito e o PIB chineses, que atinge os inimagináveis 30.1%. Acima de 10% já se está numa situação bancária bastante delicada. Os maiores bancos europeus não param de surpreender negativamente os investidores. Também os bancos da Europa mediterrânica, nomeadamente em Itália e Portugal, o BCP e o Monte Dei Pachi de Siena, com um Texas Ratio bastante elevado, espelham uma preocupante carteira de crédito malparado. O risco de uma crise do sistema bancário é bastante plausível…
Publicado In "Vida Económica" a 23 de setembro
Escrito a 20 de setembro
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