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sexta-feira, 28 de outubro de 2016

87 ANOS DEPOIS DO CRASH DE 1929

A 29 de outubro de 1929, terça-feira negra, quantidades massivas de ações da Bolsa de Nova Iorque foram postas à venda, mas não havia compradores. Anos antes, no meio da euforia, os bancos permitiam a compra de 10 ações a quem tivesse dinheiro para uma. À medida que as cotações subiam, a bolha ia sendo alimentada.

A crise financeira de 2008, como a de 1929, tiveram na génese políticas monetárias expansionistas das autoridades monetárias. A evolução das taxas de juro da FED na década anterior a cada uma das crises parece tirada a papel químico, como se vê no gráfico.

A Reserva Federal dos EUA, FED, desceu as taxas de juro de referência, de 6% em 2000 para 1% em 2003, para tentar controlar os efeitos do rebentamento da bolha das "dotcom", causada pelo acesso ao capital barato na década de 90. Acabou por criar uma falsa poupança e crédito barato, que levaram à duplicação dos preços das casas nos EUA, de 2003 a 2006.

Quando a Reserva Federal subiu as taxas de 1% para 5%, entre 2003 a 2006, os agentes económicos não conseguiram pagar as prestações e os preços das casas caíram. A falência das famílias aumentou e culminou na crise do sub-prime. Mais tarde, viria a resultar na crise das dívidas soberanas dos países periféricos da Zona Euro e a colocar em causa a sobrevivência da moeda euro.

Em 1929 aconteceu o mesmo: a taxa de juro da FED era de 7% em 1921 e de 2,5% em 1925. No final de 1929 já se encontrava de novo nos 6%. A história já mostrou que os bancos centrais só compram tempo. Apesar de atualmente os Estados não poderem ser financiados diretamente pelos bancos centrais, as operações de cedência de liquidez pelos bancos centrais são feitas convencionalmente com títulos da dívida pública. Os bancos compram obrigações do tesouro aos Estados, financiando os orçamentos dos governos, que usam como garantia para obter financiamento e nova moeda junto dos bancos centrais. Os bancos centrais mais não fazem do que financiar as dívidas dos Estados, com a intermediação dos bancos.

Há vários filmes e documentários sobre a crise de 2008. O "Inside Job" é um dos mais conhecidos e realista, mas conta a história do meio para a frente. Como numa ecografia feita no 4º mês de gestação, o "Inside Job" nada refere a respeito dos primeiros 4 meses.

Em 1929, os carros ficaram na linha de produção das fábricas. Não houve uma crise de superprodução porque a maior parte das pessoas não tinha automóvel. Os carros não tiveram compradores devido ao desfasamento entre a poupança e a política monetária da FED. O governo dos EUA, tentou travar a queda dos preços, através da manutenção dos salários nominais. O resultado foi a falência das empresas pelo aumento dos custos laborais reais e subida do desemprego. As autoridades optaram por políticas económicas expansionistas. O aumento de impostos para compensar a despesa pública, o protecionismo e a diminuição das taxas de juro agudizaram a crise.

Esta política, ainda hoje em voga, parte erradamente do princípio de que o consumo é o motor da economia, mas o verdadeiro fermento do crescimento económico é o investimento. Para haver consumo, tem que existir antes poupança e investimento. São o aforro, o investimento e a propensão do ser humano pelo conhecimento do mundo que o rodeia que estão na génese do crescimento económico.

Paulo Rosa, In Jornal Semanário "Vida Económica" 28 de Outubro 2016.





sexta-feira, 14 de outubro de 2016

A UBER já chegou a todo lado menos à bolsa

Foi criada em São Francisco em 2009 e lançou o serviço nesta cidade em 2010.

Hoje, a UBER está em mais de 350 cidades, espalhadas por 67 países, através de uma aplicação que é utilizada por mais de três milhões de clientes diariamente. Está em Portugal desde julho de 2014.
Foi mais um unicórnio - uma startup de rápido crescimento - que nasceu na Califórnia e que se tornou num caso global, apesar (ou por causa) das inúmeras resistências à mudança. A UBER parece ser uma boa experiência para os consumidores que têm escolhido os seus serviços.
No primeiro semestre deste ano, a UBER teve um prejuízo na ordem dos 1300 milhões de dólares. A percentagem paga aos motoristas, de 8 0%, é responsável pela maior parte das perdas da empresa a nível mundial.

Em 2015, a UBER teve receitas de 1500 milhões de dólares, mas as perdas foram de 2 mil milhões de dólares. Em sete anos perdeu pelo menos 4 mil milhões de dólares. Segundo alguns analistas é difícil encontrar uma empresa tecnológica que perca tanto dinheiro. Há um ano, a Bloomberg noticiava que a aplicação móvel estava a negociar uma ronda de investimento, que já avaliava a empresa em 62,5 mil milhões de dólares.

Num ambiente de taxas de juro próximas de zero, há uma maior propensão para ativos alternativos. Pode ter sido por isso que, entre 2009 e 2015, a UBER captou uns impressionantes 8,2 mil milhões de dólares, junto de investidores privados, nomeadamente empresas de capital de risco que financiam em grande parte as startup. Enquanto isso, as receitas não devem passar dos 2 mil milhões de dólares no final deste ano. Os múltiplos são uns surreais 25 e 50 para uma avaliação de 50 mil milhões ou 100 mil milhões de dólares, respetivamente. Por exemplo, o Facebook levantou junto de investidores, entre 2004 e 2011, um quarto desse montante, 2.4 mil milhões de dólares.
É difícil encontrar uma empresa tecnológica com perdas tão avultadas. A Amazon é famosa por perder dinheiro na sua fase de crescimento, mas a sua maior perda foi de 1400 milhões de dólares há 16 anos, no ano 2000. A UBER ultrapassou esse número em 2015 e está a caminho de fazê-lo novamente este ano…

É nestes momentos de alta que as empresas escolhem entrar na bolsa (através de um IPO, "Initial Public Offer"). Os IPO destas startups são importantes também porque o escrutínio dos mercados acionistas é crucial para aferir o seu real valor no longo prazo.
O Nasdaq está perto dos máximos de sempre, com uma forte subida no último ano e meio. Está, aliás, a lembrar os valores que tinha quando rebentou a bolha das tecnológicas, em 2000. Haverá uma bolha tecnológica ainda na fase pré mercado? Muito provavelmente. Os múltiplos são elevados, em muitos casos, cerca de 30 vezes as receitas geradas no ano.

O sentimento de que é iminente o rebentamento da bolha tecnológica pode ser uma razão para que a UBER não se tenha apressado a dispersar capital em bolsa.
Uma notícia recente citava o blogue pessoal do investidor norte-americano Mark Cuban, jurado do Shark Tank: "a bolha que se está a viver agora é pior do que a de 2000, ano marcado pelo estoirar da bolha das dotcom, empresas que atuavam no setor da internet. A crise desse ano culminou numa das correções mais fortes de sempre nos mercados financeiros internacionais e numa recessão económica nos EUA. Mark Cuban refere que, agora, a bolha acontece no investimento privado – um mercado sem avaliações e sem liquidez".

Paulo Rosa, In "Vida Económica"


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Licenciado em Economia pela Faculdade de Economia da Universidade do Porto.