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sexta-feira, 10 de março de 2017

O "DEBT-CEILING" FAZ CEM ANOS EM 2017. PARA QUE SERVIU?

O "debt-ceiling" representa o limite de endividamento dos EUA. Trata-se de um limite, definido no Congresso, ao montante de dívida que pode ser contraído pelo governo federal. O primeiro limite foi estabelecido em l917, há 100 anos, nos 11,5 mil milhões de dólares. Hoje está muito perto dos 20 biliões de dólares, 1700 vezes superior ao inicial, e representa cerca de 110% do PIB norte-americano.
Em outubro do ano passado os republicanos, que eram e continuam a ser maioria no Congresso após as eleições de novembro, acordaram com a antiga administração Obama uma extensão do "debt-ceiling" até 16 de março de 2017. O acordo previa a suspensão do limite de empréstimos por parte do Tesouro norteamericano com o intuito de evitar o incumprimento e era justificado com a subida de gastos na defesa.
Para a semana esse acordo vai terminar, mas muito provavelmente o Congresso renovará a suspensão ou decidirá até aumentar o limite ao endividamento, uma vez que os republicanos estão na administração e dominam o Congresso. Mas o problema permanece e agudiza-se porque a dívida pública dos EUA está em níveis preocupantes, e poderá aumentar devido aos possíveis défices orçamentais fruto da política orçamental da administração de Donald Trump refletida na diminuição de impostos e aumento da despesa pública.
Desde 2010, a dívida pública norte-americana quase duplicou. Os entraves legais ao aumento da dívida soberana, com os seus freios e contrapesos, têm sido inócuos a ponto de não terem impedido a subida exponencial da dívida pública. Para que serve, então, a existência de um teto para a dívida plasmado na lei quando é sistematicamente quebrada essa mesma regra? Há seis anos, em julho e início de agosto de 2011, os mercados foram marcados por um receio crescente, à medida que se aproximava o dia limite do "debt-ceiling", a 2 de agosto. A volatilidade e a incerteza marcaram várias semanas estivais nas bolsas a nível mundial. Uma luta de forças no Congresso entre democratas - que não tinham a maioria, mas era deles a administração Obama e pretendiam subir o teto - e os republicanos que não cederam até a última hora em que o país iria ficar sem dinheiro para pagar aos funcionários públicos e todos os compromissos que o Tesouro norte-americano tinha assumido. Teria sido a falência dos EUA. As próprias casas de rating de crédito ameaçaram com isso mesmo, dispondo-se a cortar a notação de crédito dos EUA. A Moodys, em meados de julho de 2011, colocou sob "vigilância negativa" a dívida soberana dos EUA. Isso vem sendo feito há quase um século desde a criação dessa mesma regra. O "debt-ceiling" foi sempre sendo ajustado para cima, de acordo com as crescentes necessidades de financiamento para compensar por vezes os défices orçamentais, que seriam espelhados na subida da dívida pública...
Um ajustamento de acordo com a evolução da inflação não seria problemático, mas usá-lo para financiar o crescente e sistemático aumento da dívida pública é bastante perigoso para a economia dos EUA, que já padece de desequilíbrios ao nível orçamental e cronicamente há 40 anos a nível comercial, os denominados défices gémeos.

Em Portugal, há anos, nomeadamente desde a crise financeira de 2008 e a crise das dívidas soberanas dos países europeus periféricos, que se vem falando de um teto para a dívida pública. De uma dívida de 60% do PIB, o máximo permitido para a entrada no euro, para uma dívida de 130% do PIB, de hoje, vai um salto de gigante. Colocar esse entrave, esse teto na Constituição da República Portuguesa teria algum efeito? Não iria acontecer o mesmo que se verifica nos EUA?

Paulo Rosa, Jornal "Vida Económica", 10 de março 2017





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Licenciado em Economia pela Faculdade de Economia da Universidade do Porto.