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sexta-feira, 17 de março de 2017

PODE UMA EMPRESA DISTRIBUIR MAIS LUCROS DO QUE OS QUE TEVE? PODE, MAS RARAMENTE ACABA BEM.

No Jornal de Negócios de 14 de março, o jornalista Rui Barroso avisou: "as empresas do PSI 20 vão abrir os cordões à bolsa para premiar os acionistas. E há mesmo três cotadas que vão pagar aos investidores mais que o lucro que obtiveram no ano passado". O artigo explica que o dinheiro a entregar aos acionistas subiu 20% em relação ao montante distribuído em 2016. Com mais 350 milhões de euros, os dividendos das principais cotadas vão chegar aos 2200 milhões de euros. Distribuir a quase totalidade dos lucros pelos acionistas não costuma ser uma boa notícia para o futuro da empresa. Mas distribuir mais do que os lucros, é um caso que merece reflexão. Não que seja inédito.

Mas em 2017, depois de todas as lições que a crise, e a História, nos ensinaram, há três empresas que vão dar a ganhar aos donos mais do que elas próprias ganharam: Sonae Capital, Nos e CTT. Pelo interesse que desperta junto dos investidores particulares, vejamos o caso dos CTT. Em 2016, os resultados dos CTT desceram 14%, de 72 milhões de euros para os 62 milhões de euros (M€), abaixo dos 64 M€ esperados pelos analistas. O cash flow operacional desceu 24%, dos 134 M€ para os 102 M€, justificados principalmente pela queda do correio tradicional. A diminuição no uso de correio por parte da Autoridade Fiscal teve um impacto de cerca de 10 milhões de euros na redução das receitas. No último ano os resultados não vinham superando as expectativas, e na bolsa o preço da ação já tinha antecipado resultados fracos com uma queda de 50% desde os máximos nos 10.49 €/ação em 11 de novembro de 2015.

O correio postal está em declínio, a distribuição de encomendas tem muitos concorrentes e mais eficientes e o recém-criado Banco Postal, apesar dos custos terem sido baixos, não tem sido a mais-valia que se esperava, não só porque o negócio ainda tem muito caminho a percorrer até chegar ao break-even (quando a receitas ultrapassam as despesas) mas principalmente pelo momento menos favorável do setor bancário. Porém, a empresa liderada por Francisco Lacerda mantém um dividendo bastante atrativo de 0.48 euros por ação, algo que só se consegue justificar com o intuito da administração fidelizar ou agradar à estrutura acionista. Esta política de dividendos já foi adotada pela Portugal Telecom com os resultados que se conhecem, bem como pela Brisa com consequências nada positivas…

No curto prazo, uma rentabilidade elevada do dividendo ("dividend yield") na casa dos 10%, atrai investidores que procuram rendimento. Mas no médio/longo prazo, investidores que procuram estabilidade nos dividendos e crescimento da empresa tendem a afastar-se. Distribuir mais do que os resultados obtidos, não só não gera poupança para novos projetos, como retira dinheiro às poupanças que suportam o negócio ou, pior, implica aumento de dívida. Numa gestão mais prudente, com distribuição de metade dos lucros, o dividendo deveria ser de 0.20 €/ ação. Será de 0.48 euros por ação, com um payout ratio (parte dos resultados distribuídos) de quase 120%! Teve lucros de 62 milhões de euros e vai distribuir 72 milhões em dividendos! Se a principal empresa portuguesa de correios não conseguir nos próximos tempos melhorias nos resultados terá, então, apenas duas alternativas: ou mantém a sua política suicida de dividendo e a descapitalização da empresa, ou assume uma postura responsável e ajusta os dividendos aos resultados gerados.

Depois da divulgação dos resultados, a ação CTT registou um novo mínimo histórico nos 4.741€, 55% abaixo do máximo histórico. Os CTT entraram em bolsa há 3 anos a 5.52€. Onde é que já ouvimos esta história?

Paulo Rosa, Jornal "Vida Económica", 17 março 2017



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Licenciado em Economia pela Faculdade de Economia da Universidade do Porto.