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sexta-feira, 17 de agosto de 2018

As primeiras vítimas da guerra comercial


A guerra comercial iniciada pelos EUA contra as importações continua a penalizar os mercados, sem poupar ninguém. David Ricardo, economista britânico de origem sefardita portuguesa, já o tinha dito há mais de 150 anos na sua teoria das vantagens comparadas do comércio entre países. Esta guerra comercial era tudo o que a Turquia não precisava para suster a sua moeda. A lira turca fez novos mínimos históricos nos 7.2362 por dólar (USD/TRY), penalizada pela inflação de 16% em julho, a mais elevada desde 2004, por fatores políticos como o afastamento pelo regime turco de pessoas capazes, desde cientistas a professores, fundamentais para o crescimento económico, e pelas imposições alfandegárias dos EUA ao aço e alumínio da Turquia. A instabilidade turca pode, nos próximos tempos, colocar em causa a estabilidade política, económica e financeira ao nível mundial, sendo sempre uma justificação plausível para a correção dos mercados que permanecem inflacionados pelas baixas taxas de juro.
Os quatro bancos europeus mais expostos à Turquia - BBVA, Unicredit, ING e BNP - perderam cerca de 11 mil milhões de euros no início da semana.

As “big tech” norte-americanas continuam a suportar o mercado e a debelar as quedas das bolsas, porém na quarta-feira acabaram por ceder. Em julho, as vendas a retalho nos EUA, dado macroeconómico mais importante a seguir ao relatório de emprego, saíram acima do esperado e refletem a robustez da economia para sustentar as bolsas.

No plano nacional, a primeira vítima da guerra comercial foi a Navigator que arrastou o índice PSI 20 para uma queda de 3%. A guerra comercial chegou a Portugal, após o Departamento do Comércio norte-americano impor uma taxa de 37,34% às importações de papel da Navigator, aplicada retroativamente ao período compreendido entre agosto de 2015 e fevereiro de 2017. A empresa alertou que os lucros devem diminuir em quase 25% este ano e prometeu contestar a medida junto dos tribunais norte-americanos. Na segunda-feira, a Navigator registava, a meio da sessão, uma queda de 20%, a maior de sempre, arrastando a Semapa, com cerca de 70% da papeleira, e a Altri, a segunda maior produtora de pasta de papel portuguesa. O BBVA reviu em baixa o preço alvo da Navigator de 5.70 € para 5.20 €.

Com o pontual abrandamento da crise turca, regressou o tema Tesla e o maior LBO de sempre (leveraged buyout- compra alicerçada em dívida). A queda de 10% da Bayer, dona da Monsanto, que foi obrigada a pagar cerca de 250 milhões de dólares a um doente oncológico, penalizou o sector químico. A meio da semana, o mercado aliviou com o provável retomar das conversações entre os EUA e a China no final do mês.

Segundo dados do Eurostat a economia da Zona Euro cresceu ao ritmo mais lento dos últimos dois anos, 2%, aquém dos 2.1% esperados. A economia irlandesa é excepção com quase 10%. A economia portuguesa fixou-se nos 2.3% e a economia alemã cresceu acima das expectativas, impulsionada pelos gastos dos consumidores e do Estado.

Ações: Sonae SGPS e PSI20

As produtoras de pasta de papel Navigator, Altri e a Semapa, lideraram as perdas do PSI20. Seguiu-se a queda da Sonae, agora liderada por Cláudia Azevedo, que continua a acentuar as perdas, seguindo o comportamento negativo das congéneres europeias do sector do retalho. De salientar que a Sonae tem sido há muitos anos um barómetro fiável para aferir o comportamento do PSI20. A Jerónimo Martins, apesar de ter perdido esta semana cerca de 2%, apresenta um comportamento interessante, do ponto de vista da análise técnica. O BCP seguiu em baixa, com o setor bancário penalizado pelo comportamento da lira turca. A Galp recuou após a queda semanal de 2.5% do petróleo.

Commodities: Cobre

O cobre perdeu perto de 4% esta semana, e continua na sua tendência de queda, superior a 20%, desde os máximos atingidos nos 333 dólares por libra (0,4536 kg), alcançados no início de junho. Além de ser um indício de abrandamento económico mundial, esta descida é justificada. O cobre encontra-se em valores de junho de 2017, mínimos de há 14 meses. A queda da cotação do cobre agudiza-se com a escalada da guerra comercial entre os EUA e a China ameaçando o crescimento global, alimentando as preocupações dos investidores de diminuição da procura deste metal imprescindível para a construção de redes elétricas, casas, carros, aparelhos eletrónicos… Mas, atenção, as potenciais greves no Chile podem quebrar este ciclo de baixa.

Câmbios: USD/ZAR RAND sul africano

A fraqueza e os sucessivos mínimos históricos registados pela lira turca têm afectado as moedas dos países emergentes. A moeda sul-africana desvaloriza há vários dias, e na segunda-feira registou uma queda significativa de 9% contra o dólar americano. O USD/ZAR valia 14.13 no início do dia e a meio da sessão um dólar já comprava 15.55 Rand sul-africanos, o valor mínimo desde junho de 2016. A taxa de inflação aumentou para o máximo dos últimos 6 meses, porém mantém-se aparentemente controlada nos 4.6%. A taxa de juro do banco central sul africano (SARB, South Africa Reserve Bank) espelha isso, e até desceu dos 6.75% para 6.5% em março.



Paulo Monteiro Rosa, Jornal Económico, 17 de agosto de 2017


https://jornaleconomico.sapo.pt/noticias/as-primeiras-vitimas-da-guerra-comercial-345231




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Licenciado em Economia pela Faculdade de Economia da Universidade do Porto.