Desde março que a Reserva Federal dos EUA (FED) reforçou os mercados com mais
dinheiro na sua batalha contra a deflação. Apesar do balanço da FED ter
aumentado, em apenas dois meses, à volta de 3 triliões de dólares, cerca de
metade dessa subida deveu-se ao aumento de quase 1.5 triliões de dólares na
conta geral do Tesouro dos EUA junto da FED. Nem tudo é moeda, porque apesar do
passivo de um banco central refletir a base monetária de uma economia, porém,
essa igualdade é referente apenas ao passivo com outras instituições monetárias
(OIM), como sejam as reservas bancárias, e a moeda em circulação, ou seja, a
conta de depósito do Estado, apesar de estar no passivo da FED, não faz parte
do circuito monetário e bancário. Por que o Tesouro tem tanto dinheiro na FED,
e quais são as implicações? Desde meados de 2015, que coincide grosso modo com
a redução do balanço da FED (tapering), o Tesouro passou a ter como
objetivo manter um nível de dinheiro suficiente para cobrir despesas semanais e
sujeito a um saldo mínimo de 150 biliões de dólares. Como resultado das
inúmeras políticas económicas adotadas desde meados de março, em resposta à
pandemia, as saídas diárias do Tesouro são, sem surpresa, muito maiores agora
do que eram anteriormente. Atualmente, com o agravamento da pandemia, espera-se
um montante acrescido de estímulos fiscais, logo o sucessivo levantamento de
dinheiro pelo Tesouro poderá pressionar
em alta as taxas de juro através do efeito “crowding out”.
A Lei CARES, promulgada a 27 de março, foi criada para suportar o desemprego,
através de subsídios, e aumentar o rendimento das pessoas para manter a procura
agregada. Os riscos de inflação elevada só existirão se o dinheiro criado pela FED
acelerar sustentadamente a atividade económica e resulte um excesso da procura
em relação à capacidade produtiva. O aumento da oferta monetária pode-se
dissipar à medida que os bancos reduzem os empréstimos às empresas, as famílias
gastarem parte das poupanças depositadas e o governo terminar os programas de
apoio ao rendimento. Essa redução do crescimento monetário ocorreria mesmo com
a ininterrupta flexibilização monetária. Todavia, a segunda vaga de pandemia
pressionará o governo dos EUA a gastar mais e, gradualmente, o setor público,
nos próximos anos, tomará o lugar do setor privado e assumirá a despesa na
economia, por exemplo através de infraestruturas, realidade crescente desde a crise
financeira de 2008. Os EUA estão a começar a trilhar o mesmo caminho que o
Japão iniciou há 25 anos. Após a crise financeira no começo da década de 90, a
despesa na economia nipónica inverteu-se, passando o Estado a ser cada vez mais
preponderante e deficitário e o setor privado excedentário. A taxa de poupança
nos EUA atingiu máximos históricos nos 33% durante o confinamento. As economias
desenvolvidas estão a padecer de um crescente aumento da poupança privada, e a
Alemanha é um caso paradigmático.
A velocidade do agregado monetário MZM (Money Zero Maturity, dinheiro com
vencimento zero) habitualmente utilizado pela FED desde que o M3 foi
descontinuado em 2006, mede a frequência com que uma unidade de moeda é usada
para comprar bens e serviços produzidos internamente e caiu para mínimos
históricos de 1 no segundo trimestre de 2020. É um sinal deflacionário, mas é
importante que os investidores entendam que a inflação ainda é uma ameaça nos
próximos anos.
A inflação via custos diminuiu com o regresso da oferta agregada de bens e
serviços a níveis quase pré-covid. A inflação via aumento da procura agregada
(famílias, empresas, Estado e exterior) não é atualmente um problema. Há
aumento da procura de moeda, mais um fator deflacionário, espelhada na elevada
taxa de poupança. A crescente quarta revolução industrial e a consecutiva
descida do peso dos salários do PIB, hoje de apenas 43%.
Paulo Monteiro Rosa, Vida Económica, 20 de novembro 2020
A transversalidade e Universalidade da ciência económica. O objecto de estudo da economia é a maximização do bem-estar do ser humano, mas não deixa de ser em sentido estrito. A ciência económica é mais abrangente. A todos os seres vivos e não vivos. Ver página "descrição do blog".
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sábado, 5 de dezembro de 2020
Os gastos dos governos e a inflação
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- Paulo Monteiro Rosa
- Naturalidade Angolana
- Licenciado em Economia pela Faculdade de Economia da Universidade do Porto.
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