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sexta-feira, 9 de julho de 2021

Valor trabalho e inflação

A teoria quantitativa da moeda (TQM) é a relação entre a quantidade de moeda em circulação na economia e a produção ponderada pelo nível de preços e é expressa pela equação identidade entre quantidade de moeda e PIB nominal (MV=PT, Massa monetária x Velocidade da moeda = Produção x Preços). Uma equação identidade admite infinitas soluções e denomina-se identidade porque em algum momento ambos os lados da equação são idênticos. Antes do aparecimento da moeda, e da sua relevante utilidade na divisão e especialização do trabalho, as trocas eram efetuadas com os bens produzidos por cada um, a produção era a moeda de troca e a TQM seria dada pela igualdade entre produção e produção. No entanto, sem trabalho não existe produção de bens económicos, assim sendo a TQM em primeira instância é dada pela equação identidade “trabalho = trabalho”. Cada um de nós troca a maior parte do seu trabalho por quantidades pequenas do trabalho de inúmeras pessoas refletido em cada bem ou serviço que consumimos. 

No longo prazo o nível de preços será eventualmente determinado pela quantidade de moeda existente e pelos bens e serviços produzidos, mas no curto prazo a inflação de preços depende da interação entre procura e oferta de bens e serviços e procura e oferta de moeda. Num sistema de moeda fiduciária, a adoção pelo banco central de uma política monetária acentuadamente expansionista poderá não redundar em inflação, e a estabilidade de preços poder-se-á manter se a procura por moeda também crescer significativamente ou se a oferta de bens e serviços superar continuamente um potencial aumento adicional da procura. É uma conjugação de expetativas adaptativas no curto prazo, até se alcançar um reequilíbrio entre moeda e produção no muito longo prazo. John Maynard Keynes, um economista focado no curto prazo e na célere resolução das recessões económicas, defendia que o nível geral dos preços seria dado pela igualdade entre investimento e poupança e não pela variação da quantidade de moeda.

A produção resulta da conjugação do trabalho e do capital. No passado, e ainda em algumas economias de subsistência, a produção dependia quase exclusivamente do trabalho e o capital resumia-se a uma ferramenta de caça ou um arado para lavrar a terra. O fabrico de uma ferramenta de produção, ou seja capital, é resultado do trabalho de alguém. Em suma, o capital é trabalho e conhecimento acumulado, desde o mais rudimentar machado, apenas trabalho, à mais complexa e robotizada linha de montagem automóvel, com inúmero trabalho e conhecimento acumulado.

O trabalho precisa de ter utilidade. Um monte de lama pode levar horas a produzir, mas nada vale se não for útil para ninguém. Se numa comunidade a produção combinada entre o fator trabalho e o fator “trabalho acumulado” (capital) for superior ao consumo da sua população, então teremos mais “acumulação de trabalho”, espelhada em mais poupança, que suportará mais investimento reprodutivo e avanços tecnológicos. O trabalho é deflacionista quando supera o que consumimos. Contudo, o trabalho será inflacionista caso não atenda ao nosso consumo e às nossas necessidades. Por vezes, o poder de compra da “acumulação de trabalho” de uma vida inteira poderá ser insignificante, se o país onde temos o nosso património, as nossas poupanças e o nosso dinheiro não tiver mais trabalho produtivo que satisfaça o nosso consumo na velhice. 

A produção japonesa, medida pelo PIB, cresceu apenas ligeiramente nos últimos 25 anos. Todavia, o excedente da balança corrente externa nipónica mantém-se estável, média anual de 3% nos últimos 35 anos, devido à diminuição do consumo interno e aumento da poupança. Apesar do envelhecimento da população e da taxa de dependência (idades compreendidas entre os 0-14 anos e superior aos 65 anos face à faixa etária dos 15 aos 65 anos) ter subido dos 45% em 1971 para 69% em 2020, o Japão mantém uma taxa de participação no mercado de trabalho de 62%. Há trabalho produtivo no Japão que gera mais produção do que aquela que é consumida. Aquilo que é trabalhado a mais é exportado e cria poupança adicional que reduz o seu preço, a taxa de juro, mantém a inflação em níveis baixos e suporta o investimento. Mas as taxas de juro reais, predominantemente negativas nos últimos 5 anos, ameaçam o já frágil crescimento económico…

Paulo Monteiro Rosa, In Vida Económica, 9 de julho de 2021



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Licenciado em Economia pela Faculdade de Economia da Universidade do Porto.