Na última semana, a cotação do barril de petróleo desceu
mais de 30% e regressou a valores inferiores aos 100 dólares. A guerra na
Ucrânia tem pressionado os preços da energia, dos metais e dos produtos
agrícolas, mas o recente surto de Covid-19 na China, o pior desde março de
2020, poderá desencadear novas restrições nas principais cidades, abrandar a
economia chinesa e diminuir a procura de petróleo. Adicionalmente, a esperança
de que a Arábia Saudita e os Emirados Árabes Unidos possam aumentar a produção
de petróleo também aliviou a cotação. Preços dos combustíveis fósseis elevados
incentivam a procura de energias alternativas, nomeadamente renováveis, e
aceleram a transição energética, cenário que não interessa aos países cujas
economias estão sobretudo assentes nas receitas das exportações de petróleo e
gás natural. Entretanto, nos últimos dias o preço de um galão de gasolina nos
EUA atingiu os 4,69 dólares, recorde histórico, acima dos 4,10 dólares
registados em julho de 2008. Se em fevereiro a inflação nos EUA já havia sido
penalizada pelo preço da gasolina, em março a intensificação da inflação será
novamente uma realidade alicerçada na subida dos preços dos combustíveis.
Em fevereiro, nos EUA, o Índice de Preços no Consumidor
(IPC) subiu 7,9% em termos homólogos, e os aumentos dos preços da gasolina, das
rendas de casa, da alimentação e dos veículos usados representaram 67% dessa
subida.
Nos EUA, o preço da gasolina aumentou 38% entre fevereiro de
2021 e fevereiro de 2022 e respondeu por 1,3 pontos percentuais (pp) da subida
de 7,9% do IPC. O item gasolina pesa 3,72% no IPC norte-americano e nos últimos
12 meses foi responsável por quase um quinto do aumento no agregado dos preços
nos EUA. A subcategoria carros e camiões usados, cujo peso é de 4,17% no índice
de preços, subiu 41,2% e respondeu por 1,6 pp da subida do IPC. Os preços da
gasolina e dos veículos usados pesam menos de 8% na formação do IPC, mas foram
responsáveis por 37% da subida. Os preços da alimentação aumentaram 7,9% nos
últimos 12 meses, valores idênticos à subida do agregado do IPC, contribuindo
para 1 pp da alta dos preços. Os custos das mensalidades com a habitação
(‘shelter’), cujo peso de 32,8% é o mais elevado no índice de preços,
aumentaram 4,7% entre fevereiro de 2021 e fevereiro deste ano, e representaram
1,4 pp da subida de 7,9% do IPC. Os preços dos veículos novos pesam 4,1% no
IPC, subiram 12,4% em fevereiro relativamente ao mês homólogo do ano passado e
contribuíram para um aumento de 0,5 pp. As subcategorias mobiliário e
utensílios domésticos, e vestuário e calçado subiram 10,6% e 6,6%,
respetivamente, nos últimos 12 meses, talvez mais impulsionados pelo aumento da
procura reprimida pela pandemia.
Em termos mensais, a alta do preço da gasolina respondeu por
quase um terço da subida do IPC em fevereiro relativamente a janeiro, um
aumento de 6,6%. Todavia, em janeiro o preço da gasolina tinha-se mantido
inalterado, mas nesse mês o custo da eletricidade havia aumentado 4,2%, explicando
quase 15% do aumento do IPC. Gasolina e eletricidade representam 85% do item
energia. Os gastos com arrendamento de casa cresceram 0,6% em fevereiro,
significativamente acima da média mensal do último ano, e representaram 20% do
aumento do IPC. Os preços com alimentação aumentaram 1,1% e espelharam 15% da
subida mensal do IPC. Em fevereiro, os preços dos serviços de transporte
subiram 1,6%, e responderam por 9% da subida mensal, com maior destaque para a
manutenção e reparação de veículos, bilhetes de avião e seguro automóvel. Além
disso, os preços dos seguros sofreram um agravamento mensal generalizado, à
semelhança do mês de janeiro, tais como os seguros de saúde. Os preços dos
carros e camiões usados desceram 0,2% em fevereiro e desde o verão do ano
passado têm estabilizado, refletindo uma gradual melhoria nas cadeias de
abastecimento e na recuperação do setor dos semicondutores.
A NAIRU (‘non-accelerating inflation rate of unemployment’),
ou seja, o nível de emprego acima do qual não há aceleração da inflação é de
4,4% de acordo com a Reserva Federal de St. Louis. E o choque da oferta de
trabalho impulsionado pela covid-19 provavelmente aumentou ainda mais a NAIRU. Mas
a taxa de desemprego nos EUA de 4%, inferior à NAIRU, não tem acelerado a
inflação. O quase pleno emprego, refletido no nível histórico de ofertas de
emprego, tem impulsionado o aumento dos salários em boa parte das empresas
norte-americanas, subidas que têm sido absorvidos pelos ganhos de
produtividade. Os serviços são mais intensivos em mão de obra, mas os preços da
educação, cuidados de saúde, medicamentos, material escolar, comunicações,
entretenimento e tecnologia mantêm-se relativamente estáveis. Na alimentação a
subida dos preços é mais elevada em casa comparativamente a fora de casa. O
setor dos serviços representa 77% da economia norte-americana.
Paulo Monteiro Rosa, 16 de março 2022 In VE