Os rendimentos do tesouro norte-americano a dois anos tendem
a refletir as expetativas de política monetária da Reserva Federal dos EUA
(Fed). Ou seja, a evolução do rendimento das obrigações do tesouro a 2 anos é
talvez uma das melhores ferramentas de previsão da evolução das taxas de juro
da Fed, as taxas de fundos federais (Fed Funds Rate). Habitualmente os
rendimentos do tesouro a 2 anos incorporam não só as declarações dos vários
membros do banco central dos EUA, como também os dados macroeconómicos que vão
sendo divulgados desde o mercado de trabalho aos números da inflação. Sendo
percetível a influência do nível dos rendimentos das obrigações do tesouro
norte-americano na evolução da política monetária da Fed, corroborada pela
evidência empírica, terá assim a Fed todo o trabalho facilitado na prossecução
da sua política monetária de subida, descida ou manutenção das suas taxas de
juro? Sim, mas a Fed também trabalha para isso, tentando ser o mais
transparente possível nas semanas que antecedem as suas reuniões ordinárias de
política monetária. Em suma, ambas se influenciam entre si, rendimentos a 2
anos e Fed Funds Rate.
Quando os investidores esperam um movimento das Fed Funds Rate, por exemplo um
aumento de 75 pontos base, o banco central dos EUA tenta não surpreender o mercado,
facultando todas as atualizações e informações necessárias nas semanas
anteriores à FOMC (reunião ordinária da Fed). Esta postura de não surpreender o
mercado tem sido gradual ao longo das últimas décadas e, assim sendo, nos
últimos anos não têm existido surpresas. Portanto, a Fed preocupa-se em
promover uma gradual melhoria da sua comunicação acerca da evolução da sua
política monetária. A título de exemplo, em 2012 foi introduzido o gráfico de
pontos (dot plot), resumindo as perspetivas dos membros da Fed para as
taxas dos fundos federais no futuro, sendo mais um esforço da Fed para ser mais
transparente em relação às suas políticas. A par do dot plot divulgado
sempre na última reunião do trimestre, é também publicada a atualização das
perspetivas trimestrais, nomeadamente para a inflação, emprego e PIB.
A necessidade de uma melhoria futura na comunicação pela Fed ficou bem patente
em 1994, aquando do “massacre das obrigações”. Nesse ano, a economia
norte-americana emergia da recessão de 1990/91 e os rendimentos dos títulos do
tesouro começavam a subir ligeiramente em relação aos mínimos de 1993, à medida
que as perspetivas de crescimento melhoravam, embora sem que nenhum sinal de
inflação tivesse surgido. Entretanto, Alan Greenspan e a Fed surpreenderam os
mercados ao começarem a apertar a política monetária, e os títulos do tesouro
desvalorizaram substancialmente quando as Fed Funds Rate subiram
consideravelmente ao longo do ano. A capacidade preditiva da yield do
tesouro a 2 anos desapareceu durante alguns meses, sobretudo de março de 1994
até ao final desse ano (como observado no gráfico, círculo 1).
Entretanto, no último trimestre de 2021, depois de ano e meio à volta dos 0,15%
a 0,20%, o rendimento do tesouro norte-americano com maturidade a 2 anos inicia
a sua tendência de alta a partir de novembro de 2021, impulsionado não só pela
inflação cada vez mais elevada, nessa altura já acima dos 6%, percecionando-se
uma subida dos preços cada vez mais generalizada e contínua, mas também pelo
anúncio da Fed, em 3 de novembro, do começo do seu tapering no
mês seguinte, em dezembro. No entanto, a primeira subida das taxas de juro pela
Fed acontece apenas no dia 16 de março de 2022 (o último aumento havia sido em
dezembro de 2018), em 25 pontos base para o intervalo de 0,25% a 0,50%, mas
a yield a 2 anos era já nessa altura de quase 2%, antecipando
ainda mais aumentos das taxas de juro da Fed que se viriam a materializar meses
mais tarde (no gráfico podemos constatar essa capacidade preditiva,
círculo 2). Ainda no gráfico podem ser observados movimentos e comportamentos
semelhantes em ocasiões anteriores, corroborando assim o poder de antecipação
das futuras Fed Funds Rate, em vários meses, trimestres ou mesmo em mais de um
ano, pelos rendimentos das obrigações do tesouro a 2 anos.
Entretanto, a yield a 2 anos é também superior à yield do
tesouro norte-americano a 10 anos desde julho de 2022, identificando uma curva
de rendimentos invertida, indiciando recessão económica. Atualmente o
diferencial entre estas duas taxas de juro é negativo de -0,83%, o spread mais
elevado desde o início da década de 1980, aquando de uma recessão bastante
prolongada, como pode ser corroborado pelo gráfico.
Quanto mais elevada for a vida de um empréstimo maior é o risco associado a
esse mesmo empréstimo, sendo, desta forma, normal um declive positivo da curva
de rendimentos. Não é habitual, porém, uma curva de rendimentos com inclinação
negativa, mas quando acontece, este fenómeno reflete as expectativas dos
investidores de queda das taxas de juro de mais longo prazo e de descida da
inflação, normalmente contextos associadas a recessões.
Entretanto, a yield a 2 anos é também superior à yield do
tesouro norte-americano a 10 anos desde julho de 2022, identificando uma curva
de rendimentos invertida, indiciando recessão económica. Atualmente o
diferencial entre estas duas taxas de juro é negativo de -0,83%, o spread mais
elevado desde o início da década de 1980, aquando de uma recessão bastante
prolongada, como pode ser corroborado pelo gráfico.
PMR In VE 17 de fevereiro 2023
Sem comentários:
Enviar um comentário