Sempre que o Estado precisa de se financiar no mercado, emite
Obrigações do Tesouro (OT) e Bilhetes do Tesouro (BT), em operações
reservadas, e asseguradas, por um conjunto de instituições financeiras a
quem é dado acesso especial a esse mercado primário, um estatuto
reservado quase exclusivamente aos bancos. O público em geral só podia
comprar OT ou BT, "em segunda mão" aos bancos, no chamado mercado
secundário.
Ora, o governo criou um novo produto de poupança
para o retalho, as "Obrigações do Tesouro de Renda Variável" (OTRV),
permitindo ao público em geral comprar obrigações em mercado primário,
isto é, ao preço e no momento inicial da vida da obrigação.
O
investimento mínimo, por investidor, é de 1000 euros, podendo subscrever
apenas múltiplos de 1000 euros até um máximo de um milhão de euros.
Caso a procura exceda a oferta, há rateio. Os interessados devem
manifestar as intenções de compra junto dos bancos. O prazo desta 1ª
emissão é de 5 anos, mas pode haver emissões de até 10 anos, prazos em
que ocorre o reembolso total do investimento. O investidor pode
desinvestir antecipadamente vendendo na Euronext Lisboa, onde estes
títulos estarão cotados, tal como acontece nas ações, OT e obrigações
"corporate".
Novos investidores podem, a cada momento, adquirir
OTVR no mercado. Nesta 1ª emissão, que arrancou a 26 de abril e termina
a 16 de maio, o montante de colocação é de 350 milhões de euros, que
pode aumentar, consoante o interesse. A taxa de juro é de 2.2% acrescida
da Euribor a 6 meses que, caso seja negativa, não será tida em conta.
Se as taxas de juro subirem nos próximos 5 anos, então a remuneração
será maior. Há comissões bancárias de subscrição, guarda de títulos e
pagamento de juros a ter em conta, bem como 28% de imposto a pagar, como
acontece sempre que há pagamento de juros e dividendos.
Nestas
OTRV, há que avaliar os riscos de o emitente (o Estado) não pagar os
juros periódicos ou não reembolsar o capital investido na maturidade,
daqui a 5 anos. Haverá também risco de capital, se o investidor quiser
vender antes dos cinco anos, em mercado, numa altura em que o preço
esteja abaixo do preço a que comprou.
Estas OTVR são mais
semelhantes aos Certificados de Aforro e Certificados do Tesouro: têm um
caráter de aforro e a sua colocação é destinada ao público em geral,
pelo que, tal como esses instrumentos, deverão estar poupados a perdas
em caso de renegociação de dívida, ou bancarrota (default). O mercado de
dívida esteve vedado à Grécia e a Portugal durante os períodos de
resgate. Porém a República Helénica continuou a financiar-se no mercado
através da emissão de BT, por vezes com taxas de juro a rondar os 20%.
Portugal emitiu sempre BT entre abril de 2011, quando pediu ajuda
externa, e junho de 2014. Na Grécia a reestruturação da dívida pública,
de abril de 2012, com um "haircut" de mais de 50% no valor da dívida, só
se aplicou às OT. Os BT foram sempre pagos integralmente. Se os BT,
instrumentos de dívida de curto prazo e cuja emissão em mercado primário
é assegurada por bancos, foram sempre pagos, a probabilidade de um
instrumento de dívida criado para o retalho, como as OTRV, ser sempre
pago é mais elevada.
Tendo em conta o risco implícito, as OTRV
têm uma rentabilidade muito atrativa face às alternativas para o mesmo
nível de risco. A SAD do Benfica, por exemplo, tem em curso uma emissão
de 50 milhões de euros a 3 anos, com uma taxa de juro de 4.25%, porque o
Benfica é uma marca credível e reconhecida internacionalmente. No
entanto, o clube Benfica não é a SAD, que tem um risco acrescido. A SAD
pode ser reestruturada, no limite acabar, e o Benfica continuar… a ser
campeão?
Paulo Rosa, Jornal "Vida Económica" 29 de abril de 2016
A transversalidade e Universalidade da ciência económica. O objecto de estudo da economia é a maximização do bem-estar do ser humano, mas não deixa de ser em sentido estrito. A ciência económica é mais abrangente. A todos os seres vivos e não vivos. Ver página "descrição do blog".
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