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quarta-feira, 6 de julho de 2016

O Brexit e a Globalização



O Brexit fez renascer os nacionalismos? Nomeadamente na Europa, o crescimento do sentimento nacionalista das populações, bem como dos partidos nacionalistas, não é de agora. Desde a crise económico-financeira de 2008 a 2009, que teve como epicentro e móbil a crise no imobiliário, que mais tarde se viria a repercutir nas dívidas soberanas da Zona Euro, em 2010, principalmente nos países periféricos do sul da Europa, e bem espelhada na diferenciação e no alargamento dos spreads das yields destes países em relação à yield da Bund alemã.

O recrudescimento dos nacionalismos na Europa começou a verificar-se aquando das respostas aos ajustamentos orçamentais que os países tiveram que fazer. A República da Irlanda, Portugal e Grécia tiveram mesmo que ser intervencionados com um resgaste financeiro (Bailout) por parte de várias instituições: União Europeia (EU), Banco Central Europeu (BCE) e Fundo Monetário Internacional (FMI). Itália, Espanha e também a França tiveram, igualmente, que fazer ajustes orçamentais significativos.

O Reino Unido é neste momento um país dividido. Uma metade do povo que votou, na realidade, ficou sem voz ativa. Os referendos deveriam ser indicativos só a partir dos dois terços para uma efetiva mudança? Tal acontece nos parlamentos para mudar uma vírgula da Constituição, por exemplo. Os deputados, mesmo perdendo as eleições, têm assento e voz ativa.

É verdade que a UE é em termos de decisões muito centralizadora, estatista e burocrática. Até o calibre das maças passa pelo coração da União, Bruxelas. O povo europeu sente no seu quotidiano esta burocracia. Também o presente ciclo migratório, nomeadamente da Síria e do norte de África, parece não ter agradado à maioria dos europeus e o Reino Unido foi o primeiro membro a “bater com a porta”. Os ajustamentos após as crises económicas, das dívidas soberanas e do euro agudizaram o sentimento anit-europeu, e fizeram renascer os nacionalismos, estes não são nada positivos porque se traduzem em bens e serviços mais caros e de menor qualidade devido aos protecionismos industriais e afastam-nos daquilo que está no cerne da construção da UE, a paz que permanece na Europa há 70 anos. A globalização é uma realidade que não podemos olvidar nem criar uma segunda via. A globalização além de ter dado oportunidade a muitos países de saírem da pobreza, ela, tal como referia Adam Smith, com as vantagens absolutas ao nível do comércio, e mais tarde David Ricardo, com as vantagens comparadas, permite que muitos países mesmo que não sejam competitivos na produção de nenhum bem continuem a se especializar e produzir aquilo que fazem de melhor.

A existência de uma única moeda global, o dólar americano é quase uma realidade disso, que garanta previsibilidade e uma maior integração de todos os países a nível mundial, cujo embrião foi a “Sociedade das Nações” depois da 1ª GG, substituída pela mais eficaz “Nações Unidas” depois da 2ª GG, será provavelmente o caminho que trilharemos no futuro… e não nacionalismos. Essa moeda poderia estar alicerçada por exemplo no ouro, no entanto a sua volatilidade poderá ser geradora de ciclos económicos. O dólar, a libra, o euro, o franco suíço ou iene tiveram mais constância nos últimos 35 anos que a cotação do ouro. Uma moeda fiduciária com os elementos de segurança das notas de euro, a salvo das políticas monetárias dos bancos centrais e dos orçamentos do Estado, é neste momento é melhor opção… Uma garantia é pertinente! A hiperinflação alemã, após a 1ª GG, foi resolvida com a criação da moeda “RentenMark”, que tinha subjacente e como colateral terras agrícolas, comerciais e industriais alemãs.


O BCE entrou a “comprar tempo” desde 2008, com uma política inflacionistas mais enérgica com a entrada de Mário Draghi e com a implementação mais tarde do “Quantitative Easing” (QE), em 2015. Mas, apesar de correções orçamentais em diversos países da Europa e do esforço do BCE na compra de tempo com a sua política monetária, as reformas do Estado nunca foram realizadas… e sem estas, nunca o estado social, o peso do Estado e um menor efeito do “crowding-out” que liberte as empresas para novos investimentos, com uma menor carga fiscal, poderão ser garantidos. E… a política monetária expansionista do BCE, bem como dos restantes principais bancos centrais do mundo, mais cedo ou mais tarde terá que ser ajustada.

Neste momento, as taxas de juro negativas já estão a causar vários problemas à já débil situação do setor bancário. 
 

O QE foi um instrumento utilizado nos EUA e no Reino Unido com reconhecido sucesso. No entanto estes países apresentam uma dinâmica económica diferente, mais favorável, da observada na Zona Euro e no Japão, além de terem começado o QE muito mais cedo. O QE nipónico não resultou em nenhum crescimento económico e teve início em abril de 2013, praticamente quando a FED norte americana começou o “tapering” do seu QE – diminuição gradual dos seus estímulos. O Reino Unido tem um crescimento populacional, quer do saldo migratório quer do nível líquido positivo entre nascimentos e óbitos, a dinâmica financeira da City de Londres, que poderá ser posta em causa depois do Brexit, e é um país auto-suficiente em petróleo, que permanece como principal motor da economia. Ou seja, uma situação demográfica muito idêntica à dos EUA e que dá a estes países um dinamismo económico que não adveio de nenhum QE. O mesmo não poderemos dizer da União Europeia (EU) que continua com o envelhecimento da população, sem petróleo, um espelho do que se passa no Japão. Na UE e no Japão não existe nenhum QE que possa comprar tempo suficiente para mudar a demografia e gerar inflação, e poderemos inferir que as políticas monetárias dos bancos centrais acabam por ser estéreis ao nível económico e só contribuem para alimentar bolhas bolsistas e imobiliárias.


Apóstilas: Será o Brexit, a efetivar-se a saída do Reino Unido da União Europeia (UE), o Lehman Brothers europeu? Também existem incertezas no que concerne à realização de referendos quer dentro do próprio Reino Unido, quer de vários Estados-Membros da UE. A caixa de pandora foi aberta! Os protecionismos traduzem-se em produtos mais caros e de menor qualidade. A Europa vive em paz há 70 anos!
A City de Londres, a maior praça financeira da Europa, a maior de derivados do mundo, e a onde o mercado monetário tem o seu cerne, com a definição diariamente no mercado das LIBOR (London Inter Bank Offer Rate) das várias moedas mundiais, nomeadamente das principais como o dólar americano, o euro, o iene, o franco suíço e a própria libra esterlina que votou pela permanência, poderá perder, segundo alguns analistas, cerca de cem mil postos de trabalho nos próximos tempos. A Vodafone, bem como outras empresas, referiu que vai esperar pelos desenvolvimentos do “Brexit” para depois tomar uma decisão quanto à mudança da sua sede para um país da EU.
Se todos estes fatores caso se tornarem realidade poderemos assistir a um retrocesso no comércio não só ao nível intra-comunitária, bem como a nível mundial. O que poderá facilmente traduzir-se numa recessão no Reino Unido e na UE, ainda que provavelmente menos acentuada, e quiçá mesmo nos EUA. Não podemos esquecer que a economia norte-americana se encontra com algum arrefecimento ao nível do mercado de trabalho. Os EUA são o principal destino das exportações do Reino Unido, cerca de 45 mil milhões de euros, seguido da Alemanha à volta de 40 mil milhões de euros. Já as importações são mais elevadas, visto que o Reino Unido é deficitário comercialmente, com a Alemanha a ser o maior exportador para as ilhas britânicas  com um montante de 90 mil milhões de euros, e os EUA aparecem em quarto lugar com cerca de 40 milhões de euros. Se o Reino Unido permanecer no espaço económico da mesma forma especial como a Suíça e a Noruega, onde existe livre comércio, e uma relativa circulação de pessoas, com alguns entraves é certo e não comparável aos Estados-Membros. Tudo dependerá da forma de saída, caso ela exista, do Reino da UE…
Se os fatores acima mencionados se conjugarem, então poderemos ter recessão económica e queda das bolsas, nomeadamente do sector bancário que já se encontra frágil, e das bolsas norte-americanas que se encontram perto dos máximos e sobe consecutivamente há 8 anos. O catalisador que o mercado estava à espera para corrigir das subidas dos últimos anos poderá ser mesmo o “Brexit”, e este assemelhar-se ao que se seguiu depois da falência do Lehman Brothers em setembro de 2008, com a economia dos EUA a registar nessa altura a maior contração económica desde 1929 de 1 anos e 8 meses, e uma queda de cerca de 50% do principal índice bolsista norte-americano, o S&P500.

O “Brexit” - apesar dos mercados acionistas estarem relativamente caros, existir algum abrandamento nos EUA, e estarmos perante consideráveis e preocupantes dívidas do Estado Chinês, entre outros catalisadores que podem penalizar o desempenho das economias e das bolsa - só tomaria as proporções de um “Lehman Brothers” caso espoletasse uma desagregação do Reino unido e da União Europeia, seguida de um retrocesso no comércio europeu e mundial.

Paulo Monteiro Rosa, 24 de junho de 2016


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Licenciado em Economia pela Faculdade de Economia da Universidade do Porto.