Em Portugal, a Navitagor, antiga Portucel Industrial, apesar do seu atrativo dividendo com uma rentabilidade à volta dos 10%, viu a cotação ser penalizada nas sessões seguintes ao referendo em quase 10%. Uma parte das suas exportações é para o Reino Unido e, caso este entre em recessão ou sejam colocados entraves à livre circulação de mercadorias, a Navigator verá as suas receitas decrescer. A par do setor bancário, as empresas mais expostas ao comércio internacional têm sido as mais penalizadas. O BCP referiu que até o calendário para a venda do Novo Banco não será o melhor devido à incerteza gerada no mercado pelo "Brexit".
O Credit Suisse espera uma nova ronda de "Quantitative Easing" (QE) no montante de 75 mil milhões de libras. Em virtude do défice comercial do Reino Unido ser de 7% do PIB, dos mais elevados do mundo desenvolvido, está bastante dependente do fluxo de capitais. A dimensão da recessão dependerá desse fluxo e será menos expressiva caso o fluxo de capitais não diminua significativamente.
Apesar de correções orçamentais em diversos países da Europa e do esforço do BCE para ganhar tempo com a sua política monetária, as reformas nalguns Estados nunca foram realizadas e sem estas, o estado social, o menor peso do Estado e um menor efeito do "crowding-out" que liberte as empresas para novos investimentos, com uma menor carga fiscal, não poderão ser garantidos.
As políticas monetárias expansionistas dos bancos centrais, serão ajustadas mais cedo ou mais tarde. As taxas de juro negativas causam vários problemas ao débil setor bancário. O QE foi um instrumento utilizado nos EUA e no Reino Unido com reconhecido sucesso mas estes países apresentam uma dinâmica económica diferente, mais favorável do que a da Zona Euro e do Japão, além de terem começado o QE muito mais cedo.
O Reino Unido tem um crescimento populacional apreciável, uma forte dinâmica financeira e petróleo. Uma situação muito idêntica à dos EUA e que dá a estes países um dinamismo económico que não adveio de nenhum QE. O mesmo não poderemos dizer da União Europeia (UE) que continua com o envelhecimento da população e sem petróleo, um espelho do que se passa no Japão. Na UE e no Japão não existe nenhum QE que possa comprar tempo suficiente para mudar a demografia e gerar inflação. As políticas monetárias dos bancos centrais acabam por ser estéreis, contribuindo para alimentar bolhas bolsistas e imobiliárias.
A globalização trouxe crescimento a muitas economias e subidas significativas dos mercados bolsistas não só dos países emergentes, mas também das praças europeias e norte-americanas. O S&P 500 subiu cerca de 400% desde 1992. Proporcionou-nos bens e serviços mais baratos e de melhor qualidade. Nas últimas décadas a economia chinesa passou de um peso residual a nível mundial de 2% para os atuais 16%. Adam Smith ensinou-nos as vantagens absolutas do comércio internacional. David Ricardo, nas vantagens comparadas, demonstrou que mesmo que um país não fosse competitivo em nada, deveria especializar-se na produção dos bens e dos serviços onde for mais produtivo. A globalização é um "win-win". O "Brexit" poderá ser um "loose-loose", quer para o Reino Unido quer para a UE.
Em suma, apesar dos mercados acionistas estarem relativamente caros, do abrandamento nos EUA, da preocupante dívida do Estado Chinês, entre outros catalisadores que podem penalizar o desempenho das economias e das bolsas a nível mundial, o “Brexit” só tomaria as proporções de um “Lehman Brothers” caso se efetivasse e espoletasse uma desagregação do Reino unido e da União Europeia, seguida de um retrocesso no comércio europeu e mundial.
Paulo Rosa, In "Vida Económica", 1 de julho de 2016
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