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sexta-feira, 25 de outubro de 2019

Regresso ao padrão ouro?

O Banco Central Europeu, uma instituição convencional, continua a catapultar o seu balanço através de medidas pouco convencionais, como taxas de juro nominais negativas, e as taxas de juro reais são ainda mais negativas, visto existir inflação, ainda que próxima de zero. Há poucos meses, o Fundo Monetário Internacional (FMI) publicou um documento a criticar a adoção do padrão ouro pela Alemanha na década de 1870 como catalisador da instabilidade no sistema monetário mundial. Porém, há duas semanas o Banco Central holandês admitiu que o ouro não é apenas um subjacente e um suporte bastante plausível de uma moeda, mas que nunca desestabilizou o sistema monetário, e terá mesmo suportado o sistema financeiro quando tudo falhou.

E quando tivermos o ajustamento da atual política monetária expansionista dos principais bancos centrais mundiais, desde a Reserva Federal norte-americana ao BCE, passando pelo Banco do Japão (BoJ), pelo Banco Central da Suíça, pelo Banco de Inglaterra (BoE) e pelos Bancos Centrais escandinavos (Dinamarca e Suécia, que pertencem à União Europeia, mas têm moedas próprias, as coroas), o ouro deverá continuar a manter ou mesmo ganhar relevância.

Segundo o Banco Central Holandês, "Uma barra de ouro retém o seu valor, mesmo em tempos de crise". Enquanto que os títulos representativos de empresas, as ações, ou créditos sobre as mesmas, como sejam obrigações ou papel comercial, bem como títulos imobiliários, suportados por imóveis, desde casas e prédios a terrenos industriais e agrícolas, todos apresentam risco inerente de os preços poderem cair substancialmente num ajuste económico-financeiro.

O Banco holandês detém 615 toneladas, sendo que o ouro é a "âncora de confiança", porque o ativo sólido é tão importante para a criação de riqueza e a economia global, "Se todo o sistema entrar em colapso, as reservas de ouro fornecem uma garantia para recomeçar.

O ouro garante poder ao balanço do banco central".

A China e a Rússia têm acumulado reservas de ouro ao longo das últimas décadas. A China duplicou as suas reservas nos últimos dez anos, e multiplicou por quatro nas últimas décadas. No entanto, as reservas de ouro das autoridades monetárias chinesas ainda continuam proporcionalmente aquém das reservas da Alemanha ou dos EUA quando comparados os PIB.

No auge do período hiperinflacionário alemão, foi pensado criar uma moeda suportada por reservas de ouro, mas a Alemanha não detinha reservas suficientes, por causa da crise económica que se seguiu à Primeira Guerra Mundial, para assegurar o sucesso dessa política e combater a galopante subida dos preços. A 15 de outubro de 1923, foi criado o Rentenmark, que representava um primeiro vínculo imposto a todas as terras agrícolas do país e sobre todas as empresas, mas não era de curso forçado, embora as instituições governamentais fossem obrigadas a aceitá-lo. A nova moeda foi recebida ansiosamente pela população, que não possuía nenhum meio de pagamento estável para realizar as suas operações quotidianas. Vários fatores contribuíram para o êxito do Rentenmark, para a quebra do círculo vicioso da inflação hipergalopante pela introdução de uma moeda não suportada pelo ouro. A moeda estava suportada em ativos reais (terras agrícolas, e indústrias) e ganhou a confiança da população, nomeadamente no meio rural.

Com a reorganização do Banco Central Alemão e a aprovação do Plano Dawes no verão de 1924, uma moeda suportada pelo ouro nasceu e o padrão ouro voltou a ser reintroduzido, e o Rentenmark começou a ser retirado de circulação. Mas existiu também um fator decisivo para o sucesso dos novos marcos: a restrição imposta ao Banco Central Alemão de emitir moeda adicional. Como os títulos do Tesouro alemão não serviam de colateral (garantia) pelo Banco Central Alemão, foi imposto um rígido limite aos gastos governamentais, e ao crédito concedido às empresas, cujo crescente capital em circulação era um dos fatores que impulsionavam a inflação.

Mas qualquer moeda suportada por ouro pode redundar sempre em documentos que mais tarde se tornam notas de curso corrente, ou dígitos de um computador no atual avanço tecnológico, porque os pagamentos no dia a dia realizados com ouro físico não são exequíveis. 

Paulo Rosa, Vida Económica, 25 outubro 2019





















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Licenciado em Economia pela Faculdade de Economia da Universidade do Porto.