Os dados macroeconómicos nos próximos meses e as perspetivas futuras das
empresas, aquando da apresentação dos resultados trimestrais ao longo de julho
e agosto, serão muito importantes para perceber a evolução da inflação, o nível
de abrandamento económico, ou mesmo recessão, a postura mais ou menos
‘agressiva’ dos bancos centrais e a tendência dos mercados financeiros. Ao
longo do verão, os vários dados mensais do índice de preços no consumidor, os
relatórios do emprego nos EUA, os pedidos de subsídio de desemprego semanais, a
atividade empresarial medida pelo PMI e uma maior ou menor quantidade de
‘profit warnings’ emitidos pelas empresas irão testar a resiliência dos
mercados e clarificar a tendência. A contração monetária nos últimos meses tem
diminuído a liquidez, penalizando os mercados. Com o início do ‘Quantitative
Tightening’ e a aceleração da subida das taxas de juro, a Fed procura
intensificar o aperto monetário, mas esta postura mais ou menos enérgica
dependerá da evolução da inflação. Uma potencial recessão é cada vez mais
provável e uma reversão da atual política contracionista poderá ser uma
realidade em meados de 2023.
Depois do verão e à medida que o final do ano se aproxima e tem início 2023, os
efeitos de base subjacentes à inflação, que têm sido impulsionados pela subida
da energia, tendem a desaparecer e a inflação a baixar, todavia uma contínua alta
dos preços do petróleo não pode ser afastada. A OPEP ainda produz um milhão de
barris de petróleo a menos relativamente aos níveis pré-pandemia (cerca de 3,5
milhões de barris a menos relativamente a 2018), e os preços são determinados
marginalmente, pelo que a postura da OPEP acaba por ter um peso considerável na
formação dos preços. Além disso, a transição e segurança energética na Europa
impulsionam os preços dos combustíveis fósseis.
A diminuição da liquidez, nomeadamente no mercado monetário, é uma realidade.
Atualmente, a SOFR (Secured Overnight Financing Rate) nos EUA é de apenas
1,45%, abaixo do intervalo de taxas da Reserva Federal dos EUA de 1,50% a 1,75%,
refletindo a elevada liquidez ‘parqueada’ junto da Fed, cuja rubrica ‘acordos
de recompra’ no passivo do banco central dos EUA ascende a 2,23 biliões de dólares,
mas há um ano era de apenas 480 mil milhões. A SOFR norte-americana acompanha o
custo dos empréstimos de curto prazo, garantidos por títulos do tesouro dos EUA,
realizados no mercado de recompra ‘overnight’. No entanto, a LIBOR (London
Inter-Bank Offered Rate) a três meses é de 2,1%, fixando a TED spread em 0,50%,
de acordo com a taxa de juro subjacente à T-Bill dos EUA a 3 meses de 1,6%, o
valor mais elevado desde a primavera de 2020. A LIBOR representa o custo de
empréstimo não garantido a que os bancos comerciais estariam dispostos a
emprestar dinheiro entre si no mercado monetário interbancário, e, assim sendo,
introduz um elemento de risco de incumprimento para o credor. Devido a
manipulações da LIBOR, mais especificamente durante a crise financeira de 2008,
esta taxa está a ser gradualmente descontinuada e substituída por outras
referências, nomeadamente a SOFR. Durante períodos de maior ‘stress’
financeiro, como a Grande Recessão de 2008 a 2009, a TED spread aumentou para
4%. Níveis mais elevados de ‘stress’ nos mercados financeiros normalmente
acompanham períodos de contração monetária.
Os aumentos das taxas de juro pela Fed despertam receios de uma recessão e,
consequentemente, intensificam a perceção de risco nos mercados financeiros.
Níveis mais elevados de risco podem assumir muitas formas para devedores e
credores. Estes incluem risco de liquidez, refletidos na diminuição das
reservas bancárias dos níveis históricos de 4,273 biliões de dólares em 15 de
dezembro do ano passado, aquando do início do ‘tapering’, para os atuais 3,189 biliões
em 15 de junho e, assim, redução do montante de fundos disponíveis para
emprestar e, consequente, subida da LIBOR. A ameaça de uma recessão agudiza o risco
de crédito. E o aumento do risco de taxa de juro afeta negativamente os lucros.
O mercado antecipa uma subida da taxa de juro em 75 pontos base na reunião da
Fed em 27 de julho, mas um aperto mais gradual depois do verão. São esperados
50 pontos nas reuniões de 21 de setembro e 2 de novembro, e apenas 25 pontos na
última reunião do ano em 14 de dezembro, terminando 2022 no intervalo de 3,50%
a 3,75%, seguindo de perto o novo ‘dot plot’ da Fed.
Nos últimos meses, as expectativas para a taxa de inflação a 5 anos desceram de
3,6% no final de março para os atuais 2,8%, ou seja, o rendimento do tesouro
dos EUA a 5 anos é de 3,34% e o rendimento do título do tesouro norte-americano
a 5 anos indexado à inflação (TIPS) é de 0,54%. É certo que é um dado refletido
pelos mercados financeiros e não pela economia real, onde os ajustamentos
salariais são realizados de acordo com a atual inflação homóloga, mas é um
sinal positivo.
Paulo Monteiro Rosa, In VE 21 de junho 2022