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quinta-feira, 23 de junho de 2022

O verão quente de 2022

 



Os dados macroeconómicos nos próximos meses e as perspetivas futuras das empresas, aquando da apresentação dos resultados trimestrais ao longo de julho e agosto, serão muito importantes para perceber a evolução da inflação, o nível de abrandamento económico, ou mesmo recessão, a postura mais ou menos ‘agressiva’ dos bancos centrais e a tendência dos mercados financeiros. Ao longo do verão, os vários dados mensais do índice de preços no consumidor, os relatórios do emprego nos EUA, os pedidos de subsídio de desemprego semanais, a atividade empresarial medida pelo PMI e uma maior ou menor quantidade de ‘profit warnings’ emitidos pelas empresas irão testar a resiliência dos mercados e clarificar a tendência. A contração monetária nos últimos meses tem diminuído a liquidez, penalizando os mercados. Com o início do ‘Quantitative Tightening’ e a aceleração da subida das taxas de juro, a Fed procura intensificar o aperto monetário, mas esta postura mais ou menos enérgica dependerá da evolução da inflação. Uma potencial recessão é cada vez mais provável e uma reversão da atual política contracionista poderá ser uma realidade em meados de 2023.
Depois do verão e à medida que o final do ano se aproxima e tem início 2023, os efeitos de base subjacentes à inflação, que têm sido impulsionados pela subida da energia, tendem a desaparecer e a inflação a baixar, todavia uma contínua alta dos preços do petróleo não pode ser afastada. A OPEP ainda produz um milhão de barris de petróleo a menos relativamente aos níveis pré-pandemia (cerca de 3,5 milhões de barris a menos relativamente a 2018), e os preços são determinados marginalmente, pelo que a postura da OPEP acaba por ter um peso considerável na formação dos preços. Além disso, a transição e segurança energética na Europa impulsionam os preços dos combustíveis fósseis.  

A diminuição da liquidez, nomeadamente no mercado monetário, é uma realidade. Atualmente, a SOFR (Secured Overnight Financing Rate) nos EUA é de apenas 1,45%, abaixo do intervalo de taxas da Reserva Federal dos EUA de 1,50% a 1,75%, refletindo a elevada liquidez ‘parqueada’ junto da Fed, cuja rubrica ‘acordos de recompra’ no passivo do banco central dos EUA ascende a 2,23 biliões de dólares, mas há um ano era de apenas 480 mil milhões. A SOFR norte-americana acompanha o custo dos empréstimos de curto prazo, garantidos por títulos do tesouro dos EUA, realizados no mercado de recompra ‘overnight’. No entanto, a LIBOR (London Inter-Bank Offered Rate) a três meses é de 2,1%, fixando a TED spread em 0,50%, de acordo com a taxa de juro subjacente à T-Bill dos EUA a 3 meses de 1,6%, o valor mais elevado desde a primavera de 2020. A LIBOR representa o custo de empréstimo não garantido a que os bancos comerciais estariam dispostos a emprestar dinheiro entre si no mercado monetário interbancário, e, assim sendo, introduz um elemento de risco de incumprimento para o credor. Devido a manipulações da LIBOR, mais especificamente durante a crise financeira de 2008, esta taxa está a ser gradualmente descontinuada e substituída por outras referências, nomeadamente a SOFR. Durante períodos de maior ‘stress’ financeiro, como a Grande Recessão de 2008 a 2009, a TED spread aumentou para 4%. Níveis mais elevados de ‘stress’ nos mercados financeiros normalmente acompanham períodos de contração monetária.

Os aumentos das taxas de juro pela Fed despertam receios de uma recessão e, consequentemente, intensificam a perceção de risco nos mercados financeiros. Níveis mais elevados de risco podem assumir muitas formas para devedores e credores. Estes incluem risco de liquidez, refletidos na diminuição das reservas bancárias dos níveis históricos de 4,273 biliões de dólares em 15 de dezembro do ano passado, aquando do início do ‘tapering’, para os atuais 3,189 biliões em 15 de junho e, assim, redução do montante de fundos disponíveis para emprestar e, consequente, subida da LIBOR. A ameaça de uma recessão agudiza o risco de crédito. E o aumento do risco de taxa de juro afeta negativamente os lucros.

O mercado antecipa uma subida da taxa de juro em 75 pontos base na reunião da Fed em 27 de julho, mas um aperto mais gradual depois do verão. São esperados 50 pontos nas reuniões de 21 de setembro e 2 de novembro, e apenas 25 pontos na última reunião do ano em 14 de dezembro, terminando 2022 no intervalo de 3,50% a 3,75%, seguindo de perto o novo ‘dot plot’ da Fed.
Nos últimos meses, as expectativas para a taxa de inflação a 5 anos desceram de 3,6% no final de março para os atuais 2,8%, ou seja, o rendimento do tesouro dos EUA a 5 anos é de 3,34% e o rendimento do título do tesouro norte-americano a 5 anos indexado à inflação (TIPS) é de 0,54%. É certo que é um dado refletido pelos mercados financeiros e não pela economia real, onde os ajustamentos salariais são realizados de acordo com a atual inflação homóloga, mas é um sinal positivo.

Paulo Monteiro Rosa, In VE 21 de junho 2022



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