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sexta-feira, 1 de julho de 2022

O algodão não engana… da inflação à recessão?



Os preços do algodão, de acordo com as cotações dos contratos futuros no ICE, registam mínimos desde finais de setembro do ano passado, nos 98 cêntimos de dólar por cada libra (peso), e aceleraram as perdas nas últimas duas semanas, depois dos máximos à volta de 1,55 dólares alcançados no início de maio, pressionados pelas perspetivas de consumo mais fraco devido às crescentes preocupações sobre uma possível recessão. As perspetivas na China, principal consumidora, permanecem desanimadoras devido aos contínuos confinamentos. As projeções da procura do USDA (Departamento de Agricultura dos EUA) foram reduzidas no relatório de junho, devido ao menor consumo dos maiores produtores globais de vestuário. Um dos primeiros impactos, perante uma recessão, é a redução do consumo de algodão. Quando os tempos são mais difíceis, as roupas tornam-se bens discricionários.

Nas últimas semanas têm aumentado as probabilidades de uma recessão. Os receios e as atenções dos investidores afastam-se gradualmente da inflação e concentram-se cada vez mais num cenário de contração económica. A dinâmica de uma recessão económica explica este racional e justifica a contínua diminuição dos receios de uma inflação persistentemente elevada, porque os índices de preços no consumidor tendem a abrandar à medida que a procura privada diminui, as exportações descem, a produção industrial baixa e a recessão se instala. A queda dos mercados financeiros nos últimos meses, nomeadamente dos preços das obrigações e das ações, a desvalorização das criptomoedas e a desaceleração do mercado imobiliário são deflacionistas, confirmando uma desaceleração da inflação. No entanto, a cotação do barril de petróleo à volta dos 70 ou 80 dólares seria a principal variável deflacionista, associada a uma postura construtiva da OPEP de aumento da produção. O risco tende a ser cada vez mais de crédito, à medida que a perceção de uma recessão aumenta, e menos de taxa de juro, devido à potencial postura monetária menos restritiva dos bancos centrais.

Um cenário de estagflação, ou seja, elevada inflação associada a estagnação prolongada é uma ameaça cada vez mais presente. Devido ao forte aumento da inflação, o rendimento disponível das famílias é cada vez menor, o que penaliza a procura e a agrava as perspetivas económicas. O sentimento do consumidor na Zona Euro está em mínimos desde 2013, o dos EUA medido pela Universidade de Michigan em níveis de 2008 e do Conference Board norte-americano em mínimos desde fevereiro de 2021. O sentimento do consumidor alemão, medido pelo GfK, regista mínimos históricos. Os indicadores de atividade económica avaliados pelo PMI desceram para perto dos 50 pontos. O GDP Now da Fed de Atlanta projeta um crescimento de 0,3% no 2º trimestre, após contração no primeiro. A economia germânica cresceu apenas 0,2% no 1º trimestre.

A evolução da economia influencia o comportamento dos mercados financeiros e vice-versa. Os índices acionistas cotam atualmente no limiar do ‘bull’ e do ‘bear market’ e uma clarificação da sua tendência dependerá do rumo dos dados macroeconómicos. Um aumento da probabilidade de recessão diminui as perspetivas de alta dos juros, mas implica mais ‘profit warnings’ (revisões em baixa das perspetivas de lucros das empresas) nos próximos meses.
As cotações das ações das empresas têm sido penalizadas, nos últimos seis meses, pelas crescentes perspetivas de alta dos juros que diminuem a avaliação das empresas baseada na atualização dos lucros futuros. Um abrandamento da inflação implica taxas de juro menos elevadas e, assim sendo, um regresso de avaliações mais altas das empresas, mas uma possível recessão diminui os lucros e penaliza novamente as avaliações das empresas.

Por último, a relação entre o cobre e o ouro é talvez um dos principais barómetros para monitorizar as etapas do ciclo de negócios. Este rácio começa a apresentar os primeiros sinais de desaceleração do crescimento económico como resultado das pressões inflacionistas persistentes. O cobre é um metal cíclico com diversas aplicações industriais, que tende a valorizar durante o ‘boom’ económico, mas desvalorizou quase 20% nas últimas quatro semanas. Em contraste, o ouro é visto como um ativo clássico de refúgio durante períodos de fraco crescimento, ou recessão, e inflação crescente. O rácio entre o cobre e o ouro está correlacionado com a confiança empresarial, nomeadamente o índice ISM, um indicador da atividade económica no setor manufatureiro importante para avaliar a saúde da economia em geral.

PMR In VE 1 julho 2022



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Licenciado em Economia pela Faculdade de Economia da Universidade do Porto.