Since December 25th, 2010

Translate

sexta-feira, 14 de outubro de 2022

A inflação, as Euribor e o crédito à habitação

  

A política monetária do Banco Central Europeu (BCE), influenciada pelas expectativas quanto à evolução futura da inflação, determina geralmente as taxas de juro nos diferentes prazos e é a principal razão para as divergências que existem entre as várias taxas Euribor, nomeadamente as dos prazos a 3, 6 e 12 meses, as mais utilizadas como indexantes no crédito à habitação.


Habitualmente, a taxa de juro de um determinado prazo reflete a taxa de juro de um prazo inferior, acrescida das expectativas para a evolução da taxa de juro nesse mesmo período. Por exemplo, no dia 30 de setembro a taxa de juro diária da Zona Euro, a taxa “overnight” denominada de €STR, determinada pelo BCE de acordo com os relatórios estatísticos do mercado monetário do Eurosistema, fixou-se nos 0,642% e a Euribor a 3 meses nos 1,176%. O diferencial entre estas duas taxas representa as expectativas quanto à evolução das taxas de juro nos próximos 3 meses, de acordo com as perspetivas para a evolução da inflação nesse mesmo período. Quanto mais elevadas forem as expetativas para a inflação, mais elevadas serão também as probabilidades de os bancos centrais aumentarem as suas taxas de juro num horizonte temporal muito próximo.    

 

Na maioria das vezes, as taxas Euribor tendem a subir à medida que os prazos aumentam, nomeadamente quando se espera uma subida da inflação. Atualmente a diferença entre os prazos mais curtos e os mais longos tende a ser ainda mais visível e acentuada, refletindo as elevadas expetativas para a inflação na Zona Euro. A Euribor a 6 meses cotou no dia 30 de setembro a 1,809% e a Euribor a 12 meses bastante mais acima nos 2,556%, porque as expetativas para a inflação são elevadas, bem como se espera que o BCE acelere a sua política monetária contracionista de alta dos juros nos próximos meses para travar essa mesma inflação indesejável.  

 

A diferença das Euribor para outros indexantes de outras geografias fora da Zona Euro reflete, além das diferentes perspetivas para a inflação e evolução dos juros pelos diferentes bancos centrais, o risco subjacente a cada região.

 

Nos diferentes prazos da Euribor, a 3, a 6 e a 12 meses, qual seria a escolha mais acertada num crédito à habitação? Em boa verdade, tudo depende da evolução da inflação nos próximos meses, nos trimestres que se avizinham. Por exemplo, uma Euribor a 3 meses tem um juro subjacente bastante mais barato do que a 12 meses, mas esse mesmo juro, associado a um crédito à habitação, será renovado trimestralmente e as condições poderão ser muito diferentes diante da elevada incerteza, sobretudo nos próximos meses. Quando se realizar o novo acerto para Euribor a 12 meses, já a Euribor a 3 meses teve quatro revisões. Se a inflação tiver um pico de alta no próximo inverno e se ajustar gradualmente em baixa a seguir à primavera de 2023, a Euribor a 12 meses poderia ser mais vantajosa. Todavia, se a inflação se mantiver bem ancorada em alta, se se mantiver persistente, os juros tenderão a subir ainda mais e a penalizar provavelmente mais a Euribor a 12 meses. É uma questão de perspetivas para a inflação e consequentes respostas do BCE.

Em suma, quem tem por exemplo um crédito à habitação indexado a uma Euribor a 3 meses está a fixar o seu custo a 3 meses. Quem tem Euribor a 12 meses, fixa o seu custo a 12 meses.

 

As perspetivas quanto à evolução da Euribor dependem não só das expectativas para a inflação, mas também da postura do BCE e da evolução do dólar, cuja alta tem aumentado a inflação importada na Zona Euro, pressionando o banco central da área do euro a uma postura cada vez mais agressiva, refletida na expectativa de aumentos significativos dos juros para manter a atratividade da moeda única europeia diante da subida do dólar americano.

 

A evolução da guerra na Ucrânia, uma potencial intensificação da crise energética na Europa no próximo inverno e uma cada vez mais provável recessão na Zona Euro ditarão a evolução das Euribor nos próximos meses. A postura gradualmente mais agressiva do BCE, refletida na alta acentuada dos juros, acelera ainda mais as perspetivas de recessão já de si penalizadas pela agudização da crise energética. Caso a economia da Zona Euro entre numa recessão mais acentuada do que a esperada, a inflação tenderá a abrandar e o BCE poderá mesmo reverter a sua política de alta dos juros, possibilidade que aliviaria, ou inverteria mesmo, a atual tendência de revisão em alta das prestações relativas aos créditos à habitação de muitos portugueses.  

 

Todavia, a incerteza é a única certeza que temos quanto ao futuro das Euribor nos próximos trimestres.  

PMR In VE 4 outubro 2022



Sem comentários:

Enviar um comentário

Arquivo do blogue

Seguidores

Economista

A minha foto
Naturalidade Angolana
Licenciado em Economia pela Faculdade de Economia da Universidade do Porto.