A economia global continua a enfrentar consideráveis
desafios, materializados sobretudo nos efeitos persistentes de três importantes
forças: a invasão da Ucrânia pela Rússia, a crise do custo de vida determinada
pelas crescentes e generalizadas pressões inflacionistas e a desaceleração da
economia chinesa.
Os principais indicadores de atividade europeus, nomeadamente os germânicos Ifo
e Zew, refletem uma economia em forte desaceleração e perspetivam uma recessão
à medida que o inverno se aproxima e a crise energética se intensifica. A
inflação ainda não deu sinais de abrandamento na Europa e atingiu os dois
dígitos em algumas geografias, sendo esse fenómeno mais visível nas economias
mais dependentes do gás natural russo. Em setembro a inflação homóloga alemã
alcançou os 10%. Todavia, a elevada inflação tem permitido consolidar as contas
públicas de algumas economias europeias, criando “almofadas” capazes de
responderem a um eventual agravamento da crise económica nos próximos
trimestres. As contas externas continuam a deteriorar-se, fortemente atingidas
pela dependência externa europeia dos combustíveis fósseis. No entanto, o
mercado de trabalho mantém-se relativamente resiliente. A taxa de desemprego na
Alemanha subiu apenas 0,1 pontos percentuais no terceiro trimestre para os 5,5%
em setembro. Mas os indicadores de atividade medidos pelos PMI e o sentimento
do consumidor continuam a degradar-se na Europa, corroborando um cenário de
recessão ainda este ano ou em 2023. A par da crise energética na Europa, a
intensificação da postura agressiva do Banco Central Europeu (BCE) tem
aumentado também o risco de uma recessão.
Nos EUA, apesar de um ligeiro abrandamento da inflação, em resultado da
diminuição dos preços dos combustíveis fósseis, os números do Índice de Preços
no Consumidor, excluindo alimentação e energia, persistem elevados e junto aos
máximos dos últimos 40 anos. Mas o mercado de trabalho mantém-se resiliente e a
taxa de desemprego baixou para os 3,5% em setembro. As ofertas de emprego
permanecem elevadas e superam 1,7 vezes o número de desempregados
norte-americanos, sustentando a alta dos salários e reforçando o comportamento
contracionista da política monetária da Reserva Federal dos EUA (Fed), concorrendo
para uma desaceleração económica que poderá culminar numa recessão. No entanto,
o crescimento da massa salarial desacelerou para 5% em termos homólogos em
setembro.
O défice da balança dos EUA tem melhorado e as contas externas deverão
contribuir para uma recuperação do produto no terceiro trimestre, após uma
contração da economia no primeiro semestre. O GDP Now da Fed de Atlanta
antecipa um crescimento do PIB dos EUA de 2,9% no terceiro trimestre.
Os futuros associados à evolução das taxas de juro da Fed, negociados na bolsa
de derivados de Chicago, anteveem uma alta de 75 pontos base na próxima reunião
no dia 2 de novembro, cuja probabilidade é de 80%, e uma subida de pelo menos mais
50 pontos base, cuja probabilidade é de 91%, na última reunião no dia 14 de dezembro,
encerrando o ano no intervalo de 4,25% a 4,50%.
Na China, os sucessivos confinamentos localizados, ditados pela política “zero
covid”, têm penalizado a segunda maior economia do mundo, especialmente no
segundo trimestre de 2022. Além disso, o setor imobiliário, representando cerca
de um quinto da atividade económica chinesa, tem abrandado significativamente.
Assim sendo, e dada a significativa dimensão da economia chinesa, cerca de 18%
do PIB mundial em 2021, e sua importância para as cadeias de abastecimento
globais, o comércio internacional tem sido penalizado e o ritmo de globalização
tende a desacelerar, realidade crescente desde o primeiro confinamento
pandémico na primavera de 2020, acelerada pela guerra na Ucrânia. Em boa
verdade, a pandemia e a guerra na Ucrânia têm moldado substancialmente o mundo
e a economia.
O FMI estima que mais de um terço da economia global entre em recessão este ano
ou no próximo, enquanto as três maiores economias, EUA, União Europeia e China,
continuarão a desacelerar. O FMI refere no seu relatório de outubro que “o pior
ainda está por vir, e para muitos pessoas 2023 parecerá uma recessão.”
PMR In VE 14 outubro 2022
Sem comentários:
Enviar um comentário