O índice de preços no produtor (IPP) tem desacelerado
substancialmente nas economias avançadas, sobretudo nos principais blocos
económicos globais, EUA e Zona Euro, sendo um indicador avançado leading
indicator fidedigno para a evolução futura do índice de preços no
consumidor (IPC).
O IPP nos EUA iniciou a sua subida ainda no final de
2020, impulsionado pelas dificuldades nas cadeias de abastecimento (bottlenecks)
ditadas pelo confinamento global imposto pela pandemia, e acelerou a sua alta
ao longo de 2021, tendo em março de 2022 atingido o seu ponto mais elevado e começado,
deste então, a desacelerar. O IPC norte-americano iniciou o seu abrandamento
três meses mais tarde, em junho de 2022, evidenciando um desfasamento de três
meses. Tendo em conta os últimos 12 anos, o IPP e o IPC nos EUA têm tido
valores muito similares e uma trajetória muito semelhante, mas, no entanto, o
IPP mostra um comportamento líder, tendo iniciado a subida em janeiro de 2021,
meses antes do IPC (inflação no consumidor), este último iniciou o seu
agravamento em março ou abril de 2021, corroborando um desfasamento de dois ou
três meses. Entretanto, a atual e gradual desaceleração do IPP, tendo-se fixado
em 2,7% em março de 2023, promete indiciar uma tendência de abrandamento mais
acentuada do IPC nos EUA nos próximos meses, ainda de 5% em março (a inflação
homóloga). Essa desaceleração será tanto mais visível quanto maior for a
probabilidade de agravamento da atividade e eventual recessão económica.
Entretanto, o IPC core, que exclui energia e alimentação, tem um
desfasamento ainda maior, tendo sido o último indicador de inflação a iniciar a
sua subida, um ou dois meses depois do IPC e três ou quatro meses depois do
IPP, atingindo o seu ponto mais elevado nos 6,6% em setembro do ano passado e,
desde então, tem desacelerado muito ligeiramente, mantendo-se muito resiliente.
De salientar que a categoria shelter tem um peso substancial no IPC core norte-americano, pesando aproximadamente 42%, enquanto que no IPC responde por
cerca de um terço do índice. Ou seja, a subida do preço do shelter (rendas
de casas que os inquilinos pagam e o valor a que os proprietários de casas
estariam dispostos a arrendá-las) tem-se mantido resiliente, impulsionado pela
subida do preço do imobiliário e, consequente, dinâmica de alta das rendas nos
12 a 18 meses seguintes, estando atualmente muito provavelmente perto da sua
inversão, podendo descer substancialmente nos próximos meses se a economia dos
EUA entrar em recessão (o shelter tem habitualmente uma variação nula
em recessão), trazendo o IPC core para junto da sua tendência normal
nas últimas décadas em torno dos 2%, objetivo de estabilidade de preços dos
bancos centrais das economias avançadas.
Na Alemanha, a principal economia da Zona Euro e um
barómetro para a evolução da política monetária do BCE, a inflação mantém-se ainda
resiliente, tendo o IPC desacelerado pouco e o IPC core fixou um novo
máximo histórico de 5,9% em março, impulsionado pela generalização da inflação
a toda a economia, sobretudo aos serviços nos últimos meses, depois de ter
acelerado há um ano pelos efeitos nefastos da guerra na Ucrânia. No entanto, o
substancial abrandamento da inflação no produtor (IPP) na Alemanha para 7,5% em
março, após ter atingido 45,8% em agosto do ano passado, promete inverter a
tendência de alta da inflação germânica e trazê-la de volta aos 2%.
Os cheques pandémicos de ajuda do governo dos EUA deram
força a que uma inflação, inicialmente apenas do lado da oferta devido aos bottlenecks,
passasse a ser também do lado da procura. Na Zona Euro a inflação sempre foi
quase exclusivamente do lado da oferta e impulsionada pela guerra na Ucrânia.
Entretanto, o BCE faz o seu trabalho de alta dos juros, mas arrisca-se visível
e gradualmente a condenar a economia da Zona Euro a uma recessão nos próximos
trimestres e a um crescimento anémico nos próximos anos. E os decisores
políticos da Zona não parecem muito preocupados com uma recessão, aparentando
também alguma tranquilidade quanto à inflação, não tendo sido visível e evidente o esforço e o empenho dos governos e restantes autoridades no combate aos carteis e açambarcamentos. Decididamente, não se enfrenta uma inflação, sobretudo do lado da oferta, apenas com a alta dos juros, tendo também as restantes autoridades um papel muito importante para travar a alta dos preços. Ou seja, a elevada inflação
parece ter agradado a todos os governos europeus. A maior propensão à poupança
das populações do norte da Europa tem beneficiado com taxas de juro mais
elevadas e os rácios da dívida pública dos endividados governos dos países do
sul da Europa têm sido favorecidos com a elevada inflação.