Os portugueses estão encurralados numa caverna e de costas voltadas para a entrada, estão acorrentados, presos a grilhetas, prisioneiros da sua ignorância e vêem apenas sombras dos arquétipos que vão passando atrás deles. São reflectidas na parede sombras da realidade.
Vivem preocupados e obcecados em atingir um défice público de 3% do PIB, com receio de uma reprimenda e multa de Bruxelas, como os condutores de motociclos que usam capacete apenas para não levarem uma coima e não têm consciência de que o uso desse capacete é para lhes salvar a vida – os condutores que usam cinto com medo de serem autuados, os que circulam a 120km/hora porque não querem ser multados, na inocência de que andar a altas velocidades a probabilidade de morrer é elevada em caso de acidente. Respeitam o código, quando não está nenhum agente da autoridade por perto, para não serem multados e não para salvaguardarem a sua vida. Tentam respeitar a meta dos 3% de défice do PIB imposta pelo pacto de estabilidade e crescimento, para não serem multados pela União Europeia, e não para salvaguardarem sãs as suas contas públicas. Não se pode viver continuamente com défices públicos e essa situação acontece há 36 anos, agravando a dívida pública. Nos nossos lares quando o rendimento diminui procuramos diminuir também as despesas, muitas vezes dizendo aos nossos filhos que a partir de agora a mesada vai descer de 200 euros para 100 euros e explicar-lhes o porquê.
Um dia um dos prisioneiros consegue libertar-se das correntes e vira-se para entrada da caverna, a luz ofusca-lhe os olhos, está um pouco tonto, mas começa a aperceber-se da realidade. Todos os outros também lhe seguem os passos. Empresários, operários, políticos, professores, economistas, gestores, juízes, aposentados, médicos, empregados de limpeza, sindicatos, ricos, pobres, iluminados, ingénuos, todos tomam conhecimento da realidade do país – o mesmo se passa nos restantes países denominados de PIIGS, Espanha, Irlanda, Grécia e Itália. Em conjunto, pondo de lado o corporativismo e o egoísmo e chamando a si valores mais altos como a humildade, a compreensão e a solidariedade, todos os portugueses e os partidos políticos voltam-se em torno do bem comum - colocando de lado as suas pretensões e tricas partidárias – para alcançarem uma solução estrutural viável para o país. A “yield”da dívida pública portuguesa é neste momento 4.25%, 1 p.p. acima da alemã, e os credit default swap já estão nos 1.3%, na Grécia a yield”da dívida pública é neste momento 6.15%, quase 3 p.p. acima da alemã, e os credit default swap já estão nos 3.3%. É imperativo que se faça um Orçamento do Estado responsável.
Os prisioneiros estão fora da caverna, contemplam a luz do sul, a realidade, mas… por fim acordam, continuam acorrentados, virados para a parede da caverna, muito longe da realidade. A estadia fora da caverna não passou de uma utopia, mas poderá ser real caso as pessoas se unam e pensem não no que “Portugal pode fazer pelos portugueses, mas o que os portugueses podem fazer por Portugal”, parafraseando o malogrado e ex-presidente norte-americano, John Fitzgerald Kennedy.
Paulo Monteiro Rosa, economista, 15 Fevereiro 2010.
Sem comentários:
Enviar um comentário