Esta semana, na cimeira do BIS, Powell referiu que as criptomoedas continuam a ser uma reserva de valor instável, não são suportadas por nada e, essencialmente, são um substituto para o ouro, não para o dólar. Nos últimos anos, a Reserva Federal dos EUA (FED) tem trabalhado no seu próprio sistema de pagamentos que facilite a transferência mais rápida de dinheiro, trabalho que poderá ser divulgado nos próximos dois anos, no entanto, a FED não tem pressa em apresentar uma concorrente à bitcoin (BTC). Powell adiantou que o Congresso provavelmente teria que aprovar legislação adequada e precisaria da adesão do executivo Biden, antes que a FED pudesse prosseguir com a sua própria moeda digital. Mas há interesse em acelerar o processo quando Powell refere que a pandemia evidenciou a importância de desenvolver melhores sistemas de pagamentos para que o dinheiro chegue rapidamente aos mais necessitados.
O Banco Popular da China (PBoC) está a unir esforços num projeto de moeda
digital transfronteiriça com os bancos centrais dos Emirados Árabes Unidos,
Tailândia e Hong Kong através de uma tecnologia baseada num livro-razão
partilhado, denominado de distributed ledger technology (DLT). O PBoC
está mais à frente na corrida à CBDC, pelo menos na versão doméstica. Nos
últimos meses, a China distribuiu montantes avultados de yuan digital através
de lotarias em algumas cidades, como Shenzhen e Chengdu. Todavia, o objetivo
estratégico de longo prazo chinês é a internacionalização do renminbi.
Powell dá a entender que a BTC é uma ameaça apenas para o ouro, mas, para os
mais atentos, os EUA têm uma crescente concorrência do e-renminbi ao nível das
CBDC. Antes da pandemia, em 2019, a maioria das projeções apontavam 2035 como o
ano em que a economia chinesa superaria a norte-americana, mas, atualmente,
grande parte dos estudos indicam que é já nesta década que a China alcançará a
hegemonia global, e muitos estudos referem 2028, não só economicamente, mas
também militarmente. Uma economia chinesa mais forte e mais influente a nível
global serão os alicerces para uma nova moeda mundial: o e-renminbi, a grande
ameaça para o e-dólar.
No entanto, e de acordo com o comportamento dos bancos centrais, a verdadeira
ameaça às autoridades monetárias são as criptomoedas, caso contrário não se
justificaria uma corrida às moedas digitais mercadoria suportadas pelos bancos
centrais que tanto penalizam as convencionais moedas fiduciárias e o atual
sistema de cedência de liquidez aos mercados.
Em boa verdade, moeda digital já existe há alguns anos e algumas pessoas
utilizam quase exclusivamente no seu dia a dia o homebanking, NFC e
pagamentos online, mas com suporte das moedas fiduciárias e em última instância
do balanço do seu banco comercial, e uma salvaguarda dos depósitos à ordem até
100.000 euros. As CBDC serão suportadas pelos balanços dos bancos centrais e a
Bitcoin é garantida pela fidúcia nos seus algoritmos.
O Fórum Económico Mundial refere que 32% dos nigerianos possuem BTC para
pagamentos ponto a ponto. Na Rússia, e Bielorrússia, a utilização da BTC é
crescente.
A Universidade de Cambridge estima que o consumo anual de eletricidade da rede
BTC é de 130 TW/H, quase o triplo de Portugal, e revelou que 39% da energia
consumida pelas criptomoedas vem de fontes renováveis, em 2019 eram 28%. A
pegada ambiental e o consumo de energia do ouro é superior à BTC. Todavia, a
segurança da BTC depende dos “nós completos” e está cada vez mais centralizada. Os
mineradores são “nós completos” que adicionam blocos à rede, os validam e são remunerados,
e se não existir incentivo aos mineradores não há validação de transações e a
BTC nada vale. Os restantes “nós completos” que validam e verificam todas as
transações não são remunerados. Também futuros computadores quânticos podem
facilmente entrar na segurança do algoritmo criptográfico, o ECDSA, utilizado
pela BTC. Os desenvolvedores têm alguma influência na comunidade BTC e
capacidade de modificar o protocolo… Atualmente, Powell tem razão, a BTC é um
ativo altamente especulativo.
Paulo Monteiro Rosa, 26 de março de 2021, In Vida Económica
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