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terça-feira, 30 de março de 2021

A inflação é um risco? Para já, não...

Recentemente, a inflação regressou à mente dos investidores e alguns questionam-se como devem posicionar as suas carteiras para enfrentarem este potencial fenómeno de subida dos preços, ainda que temporariamente, como é atualmente esperado. Neste momento, há uma série de pressões inflacionistas que os investidores devem monitorizar.

O Presidente da Reserva Federal dos EUA (FED), Jerome Powell, tem minimizado as preocupações relativas à inflação, e refere mesmo que “os preços permanecem particularmente baixos”, mesmo para os setores que foram mais fortemente atingidos pela pandemia. Powell está correto. Quando medimos a inflação pelo indicador mais utilizado pelo Governo norte-americano, o índice de preços no consumidor (IPC), os preços subiram apenas 1,4% em janeiro, em termos anualizados, bem abaixo do objetivo da FED para a estabilidade de preços de 2%. Nos últimos 10 anos, a leitura mensal do IPC foi em média de 1,7%. Mesmo o indicador privilegiado pela FED para aferição da inflação, o PCE (despesas de consumo pessoal), nomeadamente o core, foi de 1,5%, ano a ano, em janeiro.

No entanto, há muitos preços que estão a aumentar a nível mundial, designadamente as commodities agrícolas, os metais industriais e o petróleo. De acordo com o índice de Preços de Alimentos da FAO, das Nações Unidas, o cabaz das commodities alimentares subiu pelo oitavo mês consecutivo em janeiro e registou a maior média mensal desde julho de 2014.

O aumento dos preços dos alimentos é, em grande parte, justificado pela considerável subida dos custos dos transportes internacionais. As sucessivas e crescentes interrupções nas cadeias de abastecimentos, quer pela falta de contentores quer pelo crescente congestionamento portuário, aumentaram o custo de envio de um contentor de 12 metros para mais de 4000 dólares, em comparação com os 1500 dólares há um ano. As taxas de frete do Extremo Oriente (China, Indochina e Japão) para a Europa foram as que mais subiram, em alguns casos cerca de 10 a 15 vezes. Todavia, estas pressões inflacionistas são estritamente riscos de curto prazo e muito pouco prováveis de persistirem durante um longo período de tempo. O mercado tende a reequilibrar-se, e a manutenção destes fretes nos atuais níveis incentiva as empresas a aumentarem o número de contentores ou a entrada de novas empresas no mercado.

Porém, o pacote de estímulos governamentais norte-americano de 1,9 biliões de dólares, de Joe Biden, é o segundo significativo incentivo nos últimos 12 meses, e não inclui os 900 mil milhões de dólares do final de dezembro de 2020. Estes estímulos podem empurrar o crescimento do PIB nos EUA, este ano, para níveis de há 40 anos, cerca de 7,5%, de acordo com os economistas Libby Cantrill e Tiffany Wilding da PIMCO. O GDPNow da Reserva Federal de Atlanta estima atualmente uma subida de 10% do PIB no primeiro trimestre. Poderemos ver inflação idêntica à da década de 1970? Dificilmente, em parte devido ao menor peso dos salários no PIB, ao excesso de capacidade, à crescente globalização e à entrada da China no comércio global. Todavia, provavelmente, a meta dos 2% da FED pode ser facilmente ultrapassada, mas a autoridade monetária norte-americana já o referiu, em agosto do ano passado, que pretende alcançar níveis de emprego mais elevados, nem que a inflação exceda temporariamente os 2%. Este ano, a nova secretária do tesouro, Janet Yellen, divulgou a intenção de alcançar o pleno emprego em 2022 e a FED está consciente, há mais de um mês, de uma subida dos preços na primavera.

Por fim, há a pretensão da subida do salário mínimo para 15 dólares/hora. Num estudo de 2017 realizado por economistas da FED de Boston, a um aumento de 10% no salário mínimo está associada uma taxa de inflação geral de 8 pontos base mais alta. Analogamente, baseados nas métricas do estudo da FED de Boston, a atual intenção de duplicar o salário mínimo aumentaria em 0,8 pontos percentuais a inflação.


PAULO ROSA Economista Sénior do Banco Carregosa 5 de março de 2021 Vida Económica



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Licenciado em Economia pela Faculdade de Economia da Universidade do Porto.