Os governos
pedem emprestado quando gastam mais dinheiro do que recebem. Quando as despesas
do Estado são superiores às receitas arrecadadas, nomeadamente impostos nas
economias capitalistas, surgem défices orçamentais que são colmatados através
da emissão de títulos da dívida pública. Consecutivos saldos negativos das
contas públicas aumentam gradualmente a dívida pública de um país.
Antes de 1917, o Congresso norte-americano autorizava o governo a pedir
emprestado um montante fixo de dinheiro durante um determinado período de tempo.
Quando os empréstimos eram pagos, o governo não podia contrair novos empréstimos,
a menos que fosse novamente autorizado a fazê-lo pelo Congresso.
O Second Liberty Bond Act de 1917 criou um teto para a dívida pública
norte-americana, conhecido por ‘debt ceiling’, fixado em 11,5 mil milhões de
dólares. Esta nova legislação permitiu ‘rollovers’ da dívida sem a aprovação do
Congresso, ou seja, a emissão contínua de títulos da dívida pública sem a
autorização do Congresso desde que o ‘debt ceiling’ não fosse atingido. Desde então,
o teto da dívida foi aumentado ou suspenso 98 vezes. O Congresso interrompeu o
limite da dívida sete vezes desde fevereiro de 2013 e a suspensão mais recente,
expressa na “Lei do Orçamento Bipartidário de 2019”, começou a 2 de agosto de
2019 e terminou no passado dia 31 de julho. Esse projeto previa um ajustamento
automático à atual dívida pública dos EUA, aproximadamente de 28,5 biliões de
dólares, a fim de contabilizar os empréstimos do governo norte-americano até
essa data. A resposta à pandemia alavancou significativamente a dívida… O
anterior teto era de 22 biliões de dólares. Efetivamente o limite da dívida
aumentou automaticamente em 6,5 biliões de dólares, para o atual nível de
dívida pública de 28,5 biliões de dólares no final de julho. Desde 1 de agosto
não é permitido ultrapassar esse limite e só há lugar a novas emissões de
dívida pública se existirem amortizações. O aumento do teto não autoriza novos
gastos do governo, apenas permite que o tesouro peça mais dinheiro emprestado
para pagar os gastos já aprovados.
A controvérsia em torno do aumento do atual teto resume-se, quase
exclusivamente, a uma decisão política e o nível do ‘debt ceiling’ diverge
entre republicanos e democratas, entre quem governa e quem está na oposição.
Além disso, os dois partidos também têm visões diferentes quanto à prossecução
de uma política orçamental expansionista, mais despesista do lado dos
democratas e mais centrada no corte de impostos do lado dos republicanos. Algo
semelhante acontece quanto à política monetária, sendo os republicanas pouco
expansionistas para evitar o imposto inflacionário e os democratas mais simpatizantes
de políticas monetárias mais acomodatícias.
O senado dos EUA é constituído por 100 senadores e são necessários 60 para
aprovar um aumento do teto, mas 46 senadores republicanos já alertaram que não
votarão a favor. Em 2011, a recusa do aumento do teto da dívida resultou na
redução do ‘rating’ pela Standard & Poor’s de AAA para AA +, a primeira vez
na história do país, penalizando os mercados financeiros.
A conta geral do tesouro dos EUA junto da Fed atingiu quase 2 biliões de
dólares em julho do ano passado, face à procura de liquidez do governo para
responder à crise pandémica. No início deste mês, a conta tinha apenas 277 mil
milhões de dólares, que só satisfazem despesas de um mês. Em setembro, há
pagamentos estimados de impostos de empresas e pessoas singulares ao tesouro. As
dificuldades começarão, talvez, a ser sentidas no mês de outubro…
O aumento do teto da dívida requer ação legislativa frequente e debates sobre o
‘debt ceiling’ geralmente ocorrem depois de as políticas que produzem a dívida
já terem sido implementadas, caso dos 6,5 biliões acima dos 22 biliões de
dólares do anterior teto.
O teto é um valor absoluto e, como tal, precisa por vezes de ser revisto para
acompanhar o crescimento económico, o aumento da população e a inflação. Um
valor relativo, como a dívida pública face ao PIB nominal, ou a vinculação da
subida do limite da dívida ao cumprimento de metas fiscais responsáveis
poderiam limitar a atuação do Congresso.
Paulo Monteiro Rosa, 10 de setembro de 2021 In Vida Económica
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