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sexta-feira, 1 de outubro de 2021

Crise energética precipita estagflação?

O crescente aumento dos preços da energia corroboram uma crise energética global. A elasticidade do consumo de energia é rígida e o inverno no hemisfério norte aproxima-se e com ele o frio. Em 1970, a crise energética culminou num período de estagflação. A atual inflação temporária caminhará para uma inflação mais persistente? Um período de inflação mais longo e níveis de preços indesejáveis poderiam ditar uma antecipação da redução das compras de ativos pela Reserva Federal dos EUA e uma subida, mais cedo do que esperado, das taxas de juro para mitigarem a subida de preços. Uma estagflação nos EUA seria, talvez, definida por um crescimento do PIB à volta dos 3% ou abaixo e uma taxa de inflação de 3% ou acima, medida pelo PCE ‘core’, talvez o critério mais apropriado para aferir a alteração de preços devido à atualização mais frequente do seu cabaz de bens e serviços e à sua cobertura mais abrangente relativamente ao IPC. A subida das taxas de juro acabaria por intensificar ainda mais uma hipotética estagflação espoletada por uma crise energética.

O Brent de Londres, referência mundial para dois terços da oferta de petróleo, atingiu os 80 dólares por barril pela primeira vez desde setembro de 2018 e o gás natural quadruplicou de preço nos últimos 12 meses, estando aos níveis do último trimestre de 2008, após o colapso do Lehman Brothers e, consequente, Grande Recessão. O fenómeno temporário de ‘contango’ do ano passado, reverteu gradualmente para um salutar ‘backwardation’, mas a inclinação negativa da curva de futuros do petróleo intensifica-se, num claro sinal de que os investidores acreditam que a oferta continuará a ser exígua e poderá redundar em estagflação, ou seja, crescimento anémico acompanhado de inflação.

Na Europa, o megawatt/hora (mwh) de eletricidade negociado na OMIP, MIBEL e EEX subiu dos 40 euros para cerca de 180 euros. Ou seja, o custo para as comercializadoras de eletricidade era de € 0,04 o KiloWatt/hora (kwh) até há alguns meses e atualmente é de € 0,15 a € 0,18/kwh. A subida dos preços das licenças europeias para emissão de CO2 é um dos principais impulsionadores dos custos da eletricidade. Por exemplo, as famílias portuguesas pagam cerca de € 0,17 ou € 0,18 kwh, a carga fiscal ronda os 60% e é transversal na Europa, mas agora os preços agravar-se-ão.

O carvão quadruplicou de preço nos últimos 14 meses e está em níveis recordes. A diminuição da oferta da China impulsiona o preço do carvão, à medida que o país promete atingir os padrões de emissões e alcançar a neutralidade de carbono até 2060.

O que fazer? Uma redução da carga fiscal conseguiria mitigar o problema, mas os atuais níveis de dívida pública, muito mais elevados que em 1970, são um entrave a mais endividamento e podem pressionar os juros pelo efeito de ‘crowding-out’. Uma transição energética mais gradual e faseada, abrandando o seu ritmo de forma a preservar o crescimento económico e o emprego. Algumas empresas não conseguem acompanhar a subida dos custos e na ausência de escala ou ‘pricing power’ serão obrigadas a encerrar. O regresso gradual do petróleo de xisto poderá atenuar a subida dos preços. Reverter o desinvestimento em energia nuclear seria uma opção?

A falta de energia poderá impulsionar os preços do aço e do alumínio. A escassez de semicondutores e outros ‘bottlenecks’ pressionam também os custos das empresas. Crescem as dificuldades para as famílias acompanharem a subida dos preços da energia e, neste contexto, um aumento substancial dos salários reforçaria ainda mais a estagflação. Todavia, este é o preço a pagar pela rápida transição para uma energia mais ‘verde’.

A estagflação ocorre quando uma economia enfrenta alterações repentinas e significativas na oferta de uma mercadoria ou serviço (choque da oferta), como um rápido aumento no preço da energia. A produção torna-se mais cara e menos lucrativa, desacelerando o crescimento económico. Atualmente, a subida é generalizada a todas as fontes de energia. A estagflação pode ser resultado também de uma política económica desfasada e imposta muito rapidamente. Por exemplo, políticas energéticas sem uma gradual e cuidadosa introdução podem penalizar muito os custos das indústrias e das empresas, e podem resultar num crescimento económico mais lento e numa inflação mais alta. As crescentes necessidades ambientais e cumprimento de metas de descarbonização podem condicionar os preços.




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Licenciado em Economia pela Faculdade de Economia da Universidade do Porto.