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sexta-feira, 19 de novembro de 2021

Proliferação de criptos facilita esquemas Ponzi?

Os esquemas fraudulentos são uma realidade desde os primórdios da civilização e acentuam-se em períodos de maiores debilidades financeiras e taxas de desemprego mais elevadas, acompanhados de um ambiente crescente de dinheiro fácil. Os poucos conhecimentos financeiros reforçam a proliferação e sucesso destas fraudes. As dificuldades financeiras ditadas pela pandemia e o dinheiro fácil impulsionado pelas políticas acomodatícias dos bancos centrais para mitigarem a crise económica pandémica, provavelmente intensificaram os esquemas fraudulentos e o número de pessoas aliciadas por estes.

Os esquemas Ponzi são dos mais utilizados e consistem em burlas disfarçadas de investimento. Estes estratagemas geralmente prometem elevados retornos com pouco ou nenhum risco e os lucros dos investidores mais antigos são pagos com depósitos dos investidores mais recentes. Ou seja, são esquemas piramidais que subsistem enquanto a base for maior que o topo e os investidores não resgatarem o seu dinheiro.

Atualmente, as criptomoedas são uma realidade crescente e a tecnologia ‘blockchain’ subjacente confere-lhes segurança e privacidade. Os principais bancos centrais mundiais aceleram a criação de moedas digitais, as denominadas ‘Central Bank Digital Currency’ (CBDC), para superarem a presente ameaça à sua hegemonia.

Ora, no seio da gradual multiplicação de criptomoedas - já são quase oito mil - haverá provavelmente umas moedas com vida mais curta do que outras. Existem moedas digitais que nem sequer cumprem um dos propósitos basilares que esteve na génese das primeiras, a de serem deflacionistas, ou seja, moedas mercadorias digitais que pela sua escassez inscrita no protocolo estão limitadas na sua emissão. Uma ‘separação do trigo do joio’, tal como na bolha das ‘dotcoms’, pode ser uma realidade no futuro.

O valor de mercado das criptomoedas aumentou seis vezes nos últimos 12 meses e é, atualmente, de quase três biliões de dólares, cerca de 13% do PIB norte-americano. A bitcoin (BTC) representa cerca de 40%, o Ethereum (ETH) 20%, as principais ‘altcoins’ 20% e as restantes criptomoedas 20%. Os entusiastas quer da BTC quer da ETH sustentam que as suas moedas representam uma cabal reserva de valor e apostam numa capitalização idêntica à do ouro de 11,5 biliões de dólares. Se essa valorização se efetivasse, muitas mais criptomoedas apareceriam do nada, mais liquidez e recursos seriam retirados da economia, mais riqueza ‘virtual’ seria criada e mais “ricos com pés de barro” surgiriam. A criação de riqueza é suportada pela produtividade e são precisas pessoas para fornecer bens e serviços. Por exemplo, a economia dos EUA superou os níveis pré-pandémicos com menos 5 milhões de trabalhadores (a taxa de participação desceu de 63% em 2019 para 61,6%), um aumento de produtividade, mas, obviamente, não o suficiente para manter toda a gente a viver dos rendimentos dos criptoativos! Quem trabalha?

Este dinheiro fácil poderá sustentar de forma duradoura esquemas Ponzi porque a valorização das criptomoedas poderá suportar o resgate dos investimentos e viabilizar uma pirâmide invertida durante algum tempo. Quanto maior é a árvore, maior é o tombo. Até lá, a bolha vai crescendo, impulsionada pelos bancos centrais, cujos balanços, Fed, BoE e BCE aumentaram cerca de 10 vezes desde a grande recessão de 2008/09. O fator TINA (‘There Is No Alternative’) e o FOMO (‘Fear of Missing Out’) têm impulsionado as valorizações dos ativos e podem alimentar esquemas Ponzi. Além das criptomoedas, há atualmente variadas ofertas financeiras bastante apelativas, alicerçados em NFT (‘Non-Fungible Token’), Fan Tokens, SPAC (‘Special Purpose Acquisition Companies’, as denominadas empresas de cheque em branco) e IPO que poderão facilitar esquemas Ponzi e espoletar dificuldades financeira no futuro, nomeadamente com a reversão da atual política monetária expansionista dos bancos centrais. 

O valor dos IPO, SPAC e cotação direta (Direct Listing) nos EUA, desde o início do ano, ultrapassou um bilião de dólares, ou seja, mais do dobro de 2020 e mais de 6 vezes superior à média dos últimos dez anos. Na semana passada, o IPO da fabricante de camiões elétricos Rivian alcançou 56 mil milhões de dólares, apenas superado pela cotação direta da Coinbase de 85,8 mil milhões em abril. Em março, a Roblox conseguiu 45,3 mil milhões, a terceira maior este ano. A Amazon foi avaliada em 438 milhões no seu IPO em 1997…

 

PMR In VE 19 de novembro 2021




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Licenciado em Economia pela Faculdade de Economia da Universidade do Porto.