Quando alguém refere que se deve evitar a exposição do
fundo de pensões português a ações, apelidando esse investimento de jogo e
abominando também o papel dos especuladores nas bolsas, mostra o seu completo
desconhecimento sobre o funcionamento dos mercados acionistas. Desde sempre que
os especuladores são vistos pela generalidade dos agentes económicos como personas
non gratas, entidades que ganham dinheiro desestabilizando os mercados.
Todavia, é impossível ganhar dinheiro nos mercados acionistas e ao mesmo tempo
ser desestabilizador. É um trade-off. Um especulador é alguém que
procura lucrar com as ineficiências do mercado, nomeadamente avaliações
incorretas de empresas, comprando empresas que estão abaixo do seu valor
fundamental e vendendo ações que estão sobreavaliadas, estabilizando desta
forma o mercado. É certo que um arbitragista também tenta capitalizar com as
ineficiências do mercado, mas essas ineficiências são refletidas muitas vezes
por distintas cotações de determinada ação em diferentes bolsas. Atualmente, o
papel dos arbitragistas é cada vez mais realizado por algoritmos que procuram
ineficiências pontuais de alguns minutos, segundos ou milésimos de segundo.
Os mercados não são eficientes, sobretudo no curto prazo, e os preços das ações
nem sempre refletem os fundamentais das empresas. No dia a dia o mercado reage
desproporcionalmente à divulgação dos dados macro e microeconómicos, existindo
sempre oportunidades para os especuladores e arbitragistas, ambos
estabilizadores dos mercados acionistas. Especular é delinear várias hipóteses
quanto ao futuro, de acordo com expetativas para os fundamentais das empresas.
O papel do especulador resume-se grosso modo a aproveitar as
ineficiências do mercado. É uma estratégia relativamente diferente àquela em
que um investidor compra determinada ação de uma empresa que considera de
elevada qualidade e com potencial de valorização no longo prazo, esperando que
o seu investimento dê lucros no longo prazo, adotando por vezes uma postura mais
passiva. O especulador é provavelmente mais ativo, um investidor mais de curto
prazo, procurando oportunidades onde existem movimentos significativos de
preços, devido à volatilidade e incerteza de curto prazo, comprando ações que
ficam baratas em termos fundamentais e vendendo títulos que estão mais caros.
Há ainda mais uma vantagem na atividade especulativa, o aumento de liquidez que
os especuladores proporcionam ao mercado acionista devido à sua postura ativa,
permitindo aos investidores que pretendam investir ou desinvestir no mercado o
façam a preços mais favoráveis. Os especuladores nos mercados acionistas
protegem os investidores mais incautos de comprarem mais caro. No longo prazo
os preços das ações tendem para o seu real valor. Um mercado de ações no longo
prazo tende a ser eficiente, nomeadamente um índice acionista mais amplo,
refletindo a evolução da economia. Os índices acionistas mais amplos geográfica
e sectorialmente das economias avançadas são uma opção tão válida quanto a
compra de obrigações soberanas de qualidade “AAA”, com a vantagem de entregarem
melhores retornos. Em boa verdade, poderemos, isso sim, considerar nefasta
especulação o açambarcamento de mercadorias que agrava ainda mais o fenómeno
inflacionista.
Em suma, os especuladores de ações que ganham dinheiro com a sua estratégia
estabilizam o mercado. Se perderam dinheiro é porque a sua análise relativa aos
fundamentais da empresa estava errada. No final os mercados e a economia têm
sempre razão e os especuladores que perderam dinheiro tendem a ser afastados.
PMR In Jornal de Negócios 7/11/2022
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