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terça-feira, 8 de novembro de 2022

A especulação e os mercados acionistas

 Quando alguém refere que se deve evitar a exposição do fundo de pensões português a ações, apelidando esse investimento de jogo e abominando também o papel dos especuladores nas bolsas, mostra o seu completo desconhecimento sobre o funcionamento dos mercados acionistas. Desde sempre que os especuladores são vistos pela generalidade dos agentes económicos como personas non gratas, entidades que ganham dinheiro desestabilizando os mercados. Todavia, é impossível ganhar dinheiro nos mercados acionistas e ao mesmo tempo ser desestabilizador. É um trade-off. Um especulador é alguém que procura lucrar com as ineficiências do mercado, nomeadamente avaliações incorretas de empresas, comprando empresas que estão abaixo do seu valor fundamental e vendendo ações que estão sobreavaliadas, estabilizando desta forma o mercado. É certo que um arbitragista também tenta capitalizar com as ineficiências do mercado, mas essas ineficiências são refletidas muitas vezes por distintas cotações de determinada ação em diferentes bolsas. Atualmente, o papel dos arbitragistas é cada vez mais realizado por algoritmos que procuram ineficiências pontuais de alguns minutos, segundos ou milésimos de segundo.


Os mercados não são eficientes, sobretudo no curto prazo, e os preços das ações nem sempre refletem os fundamentais das empresas. No dia a dia o mercado reage desproporcionalmente à divulgação dos dados macro e microeconómicos, existindo sempre oportunidades para os especuladores e arbitragistas, ambos estabilizadores dos mercados acionistas. Especular é delinear várias hipóteses quanto ao futuro, de acordo com expetativas para os fundamentais das empresas.

O papel do especulador resume-se grosso modo a aproveitar as ineficiências do mercado. É uma estratégia relativamente diferente àquela em que um investidor compra determinada ação de uma empresa que considera de elevada qualidade e com potencial de valorização no longo prazo, esperando que o seu investimento dê lucros no longo prazo, adotando por vezes uma postura mais passiva. O especulador é provavelmente mais ativo, um investidor mais de curto prazo, procurando oportunidades onde existem movimentos significativos de preços, devido à volatilidade e incerteza de curto prazo, comprando ações que ficam baratas em termos fundamentais e vendendo títulos que estão mais caros. Há ainda mais uma vantagem na atividade especulativa, o aumento de liquidez que os especuladores proporcionam ao mercado acionista devido à sua postura ativa, permitindo aos investidores que pretendam investir ou desinvestir no mercado o façam a preços mais favoráveis. Os especuladores nos mercados acionistas protegem os investidores mais incautos de comprarem mais caro. No longo prazo os preços das ações tendem para o seu real valor. Um mercado de ações no longo prazo tende a ser eficiente, nomeadamente um índice acionista mais amplo, refletindo a evolução da economia. Os índices acionistas mais amplos geográfica e sectorialmente das economias avançadas são uma opção tão válida quanto a compra de obrigações soberanas de qualidade “AAA”, com a vantagem de entregarem melhores retornos. Em boa verdade, poderemos, isso sim, considerar nefasta especulação o açambarcamento de mercadorias que agrava ainda mais o fenómeno inflacionista.

Em suma, os especuladores de ações que ganham dinheiro com a sua estratégia estabilizam o mercado. Se perderam dinheiro é porque a sua análise relativa aos fundamentais da empresa estava errada. No final os mercados e a economia têm sempre razão e os especuladores que perderam dinheiro tendem a ser afastados.

PMR In Jornal de Negócios 7/11/2022




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Licenciado em Economia pela Faculdade de Economia da Universidade do Porto.