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sexta-feira, 31 de janeiro de 2020

O Coronavírus, a FED e os mercados


Em meados do mês, o mercado foi confrontado com a agudização das tensões políticas entre os EUA e o Irão, que, em e boa verdade, acabaram por não ter impacto significativo nos mercados acionistas. A inexistência de uma escalada do conflito facilitou a superação da situação.

Chegados ao final do mês, o mercado defronta-se com o agravar dos receios de uma pandemia a nível global, com o alastrar do surto viral do Coronavírus que estava confinado à China.

Os mercados são virais e contagiam-se com bastante facilidade. As recentes quedas registadas nas bolsas asiáticas estenderam-se às restantes praças mundiais. Os índices bolsistas norte-americanos, fieis barómetros da evolução de todos os mercados acionistas, corrigiram pela primeira vez desde o início de dezembro. Outro momento ocorreu no início de outubro antes de a Reserva Federal dos EUA (FED) lançar o seu atual programa de "Quantitative Easing não oficial". Tecnicamente o mercado estava significativamente "sobrecomprado", precisava de "respirar" e ganhar "fôlego" para novas subidas, os compradores escasseavam e a liquidez diminuía, e o Coronavírus foi a justificação encontrada pelo mercado para a tão aguardada correção. Não é o Coronavírus! É o balanço da FED! O futuro dirá se o surto viral é uma situação grave que impacte a economia mundial. Neste momento não é.

Após o aperto de financiamento nos mercados monetários de curto prazo dos EUA em setembro, a FED não injetou apenas dinheiro através de leilões de recompra para fornecer liquidez por meio de empréstimos de curto prazo a Bancos, corretores e "hedge funds" sem dinheiro, mas também comprou bilhetes do tesouro norte-americano. A correção do mercado tardava, e é difícil acontecer quando a FED está a expandir o seu balanço, de 3,8 biliões de dólares em setembro para os atuais 4,1 biliões de dólares. As operações de "recompra" da FED têm alimentado o avanço ininterrupto do mercado. Não lute contra a FED. 

Porém, na semana passada o balanço da FED diminuiu, algo que não acontecia desde meados de novembro, há dois meses. Grosso modo, os Bancos Centrais,
através da banca comercial, financiam a economia. São estes ou a poupança que financiam o investimento e o consumo? Num regime bancário de reservas fracionárias, a poupança é moeda-crédito.

Os Bancos querem que o BCE ponha fim à política de taxas de juros negativas. Se existem investidores que estão a beneficiar com financiamento barato, há outros que vêem as suas poupanças diminuírem em termos reais, nomeadamente aforradores de depósitos a prazo. No entanto, é mais provável que as taxas continuem baixas ou negativas durante um
longo período de tempo, com a japonização da economia mundial, do que a regularização dos balanços dos Bancos Centrais, que também acarreta um problema para os Bancos, que veriam os seus ativos, mobiliários e imobiliários, colapsarem. Os balanços da FED e do BCE quadruplicaram nos últimos 12 anos, mas a inflação de preços, por exemplo em Portugal, medida pelo IPC é de cerca de 17% desde 2003. No entanto, os principais mercados acionistas mundiais, as obrigações e o mercado imobiliário duplicaram, triplicaram, quadruplicaram alimentados pela enérgica expansão monetária dos Bancos Centrais, principalmente depois da crise de 2008.

Com a inversão da pirâmide demográfica, a propensão ao consumo e ao investimento é cada vez menor, culminando em baixas taxas de juro face ao crescente aumento da poupança. A política monetária acomodatícia dos Bancos Centrais enviesa e origina a inversão do financiamento, que passa a estar mais dependente das políticas monetárias centrais do que das poupanças das famílias.

Dívida e metais preciosos são ativos de refúgio. O mercado de dívida soberana é um porto seguro, e a rentabilidade da Bund alemã desceu dos -0,17% para -0,40% em duas semanas. O ouro está em máximos desde a tensão geopolítica no Médio Oriente. Este e outros metais preciosos que ganharam esse estatuto, como o paládio, como não geram renda, têm provavelmente espaço de valorização, a par dos ativos de renda fixa, se se efetivar um abrandamento económico nos EUA, e a consequente queda da taxa de juro que remunera o dólar. 

Paulo Rosa, In "Vida Económica", 31 de janeiro de 2020






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Licenciado em Economia pela Faculdade de Economia da Universidade do Porto.