A transversalidade e Universalidade da ciência económica. O objecto de estudo da economia é a maximização do bem-estar do ser humano, mas não deixa de ser em sentido estrito. A ciência económica é mais abrangente. A todos os seres vivos e não vivos. Ver página "descrição do blog".
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quinta-feira, 28 de outubro de 2021
Na esteira da Modern Money Theory (MMT)
O custo da criação de dinheiro pelos bancos centrais é o imposto inflacionário, espelhado inicialmente na distorção dos preços dos títulos nos mercados financeiros e dos valores do imobiliário, e é tanto maior quanto mais facilmente essa nova moeda criada alcança a economia, impulsiona o consumo no retalho, origina inflação de preços e cria desigualdades na sua distribuição. Tal como referiu há três séculos o economista francês Richard Cantillon, a nova moeda não é neutra quando entra na economia e os grandes bancos, denominados de primary dealers, são os primeiros a recebê-la. A monetização da dívida pública através do aumento do endividamento público que é tomado, ainda que indiretamente, pelos bancos centrais, tem um custo que é o aumento de impostos. Sucessivos défices públicos e crescente subida da dívida soberana em relação ao PIB nominal sinalizam impostos diferidos que serão tão mais dilatados no tempo quanto maior for a capacidade e o vigor da economia subjacente, e a perceção dos agentes económicos e investidores dessa robustez, que permita acomodar facilmente a arrecadação de receita fiscal.
O objetivo primordial da MMT é o pleno emprego e os países com um banco central podem e devem criar moeda para suportar eventuais défices orçamentais crescentes, e o limite será o aparecimento de inflação. Como tal, todos as suas despesas poderiam, em princípio, ser financiadas por meio da criação de dinheiro. Mas a Teoria Quantitativa da Moeda refere que a quantidade de moeda é igual ao PIB nominal, logo se a nova moeda alcançar a economia e a produção agregada se mantiver estável, a inflação aparecerá. O PIB per capita japonês há 25 anos era dos mais elevados do mundo, hoje figura em 30º lugar e à paridade dos poderes de compra em 40º, mas a dívida pública subiu de 40% para 240% do PIB suportada pela monetização espelhada na subida do balanço do Banco do Japão (BoJ) que detém grande parte da dívida pública nipónica, todavia a moeda permaneceu estável, alicerçada num robusto setor exportador.
Adotando a MMT, os Estados podem substituir receitas por mais endividamento e, assim, reduzir consideravelmente o peso dos impostos que recaem sobre as suas populações? A diferença fundamental entre as finanças do governo e as das empresas e famílias não é o acesso a um banco central, mas, em vez disso, o poder coercivo para aumentar os impostos. Uma empresa com prejuízos não pode reduzir essa perda impondo impostos sobre todos os outros. Um governo pode. Um trabalhador que tem um corte salarial não pode forçar os outros a compensarem a diferença. Um governo pode. Os credores compreensivelmente estão dispostos a aceitar retornos mais baixos em títulos do governo do que noutros investimentos. O risco de incumprimento do governo face a um choque económico adverso é menor. Mas os países emergentes recorrem frequentemente à desvalorização, incumprimento ou inflação e os custos de empréstimos são mais elevados. E se os bancos centrais fossem retirados dos banqueiros não eleitos e entregues a representantes fiscais eleitos? Para muitos políticos, o objetivo principal é permanecer no poder… A inflação e os impostos são, em muitos aspetos, simplesmente duas faces da mesma moeda. Os governos sem acesso às receitas fiscais podem, em vez disso, desvalorizar a moeda.
Paulo Rosa, Jornal de Negócios, 7 de dezembro 2020
A economia circular
A frase do químico francês Antoine-Laurent de Lavoisier, “Na Natureza, nada se
cria, nada se perde, tudo se transforma”, adequa-se plenamente à crescente
importância da economia circular e à aceleração da economia ‘zero desperdício’.
A economia circular representa um dos principais meios para a sustentabilidade
do planeta, bem como uma enorme oportunidade de mercado. Todavia, há uma
dessincronização entre as multinacionais que lutam para acompanhar a inovação
circular e os empreendedores que não têm recursos para crescer. A economia circular
está lentamente a unir as duas partes para promover a agenda de desperdício
zero.
No início de 2021, as empresas enfrentam uma matriz complexa de desafios -
desde o aumento das tensões geoeconómicas, até à urgência das alterações
climáticas. Com menos de dez anos para atingir os objetivos de ‘Desenvolvimento
Sustentável das Nações Unidas’ (ODS), a atual década é crucial para a
sustentabilidade do planeta e os líderes mundiais gradualmente agem na
prossecução desse objetivo. A transição para um modelo económico circular
global é fundamental para reduzir a degradação ambiental e priorizar a
biodiversidade e a natureza, ao mesmo tempo que proporciona competitividade
futura. Numa economia circular, o desperdício é eliminado e os produtos são
devolvidos ao sistema de produção no final da sua utilização. Consequentemente,
o crescimento é ‘desligado’ o mais possível do consumo de recursos escassos e
os materiais são mantidos em utilização no sistema produtivo pelo maior tempo
possível.
A economia circular representa uma oportunidade de mercado única de mais de 4,5
biliões de dólares até 2030, de acordo com a Accenture Strategy em 2015,
atualmente cerca de 5% do PIB mundial anual. A aceleração dessa transição
depende da adoção de novos modelos de negócio inovadores e dos avanços
tecnológicos disruptivos. Juntamente com a priorização de novos modelos de
negócio, que agora respondem por cerca de 30% do investimento em M&A (Fusões
e Aquisições) de acordo com a análise da Accenture em outubro de 2020, a adoção
de novas tecnologias digitais, físicas e biológicas pode gerar novas
oportunidades e entregar o triplo do resultado financeiro das grandes empresas.
Hoje, as grandes multinacionais com cadeias de abastecimentos e processos cada
vez mais complexos podem esforçar-se pela inovação circular, mas às vezes podem
faltar os recursos necessários para abraçar novos modos na transição para
negócios circulares. Todavia, e em contraste, os empreendedores têm as soluções
disruptivas para resolver esses desafios, mas podem não ter capital ou recursos
para replicar as suas soluções.
Uma iniciativa da Accenture, o ‘Circulars Accelerator’, agiliza a conexão entre
as multinacionais e os empreendedores. As partes interessadas em toda a cadeia
de valor têm o poder de abraçar totalmente a inovação e mutuamente beneficiar
de inovação colaborativa e alianças estratégicas. As ‘startups’ são classificadas
num dos três tipos de solução necessários para a transformação circular, que
juntos abrangem toda a cadeia de valor e respondem a desafios circulares
específicos: 1) Produção inovadora que cria e fornece produtos, embalagens e
soluções pioneiras. Por exemplo, a StixFresh na Malásia tem um adesivo 100%
vegetal que aumenta a vida útil dos produtos frescos até 14 dias, e de acordo
com a FAO (Organização para a Alimentação e Agricultura) das Nações Unidas, um
terço dos alimentos vão para o lixo. 2) O consumo da transformação. Atualmente,
e de acordo com o Fórum Económico Mundial, consumimos 1,75 vezes mais recursos
a cada ano do que a Terra pode regenerar naturalmente. Gradualmente aparecem novos
modelos de consumo circular, incluindo a extensão da utilização do produto (reparação,
mercados secundários), embalagens reutilizáveis e plataformas de partilha. 3) Recuperação
de valor. Este ‘cluster’ prioriza soluções que fecham o ciclo no atual sistema
linear existente, “take, make, waste” (“retirar, fazer, desperdiçar”). Este
grupo de inovadores cria novas maneiras que permitem a reutilização de produtos
e a recuperação do valor existente nos resíduos ou produtos em fim de utilização.
Paulo Rosa, In Vida Económica, 23 de abril de 2021
Quarta Revolução Industrial em Curso
A pandemia acelerou a Quarta Revolução Industrial, apesar de
todos os avanços e recuos no início e durante a fase mais grave e penalizadora
da pandemia e do confinamento. A convergência e a interação entre tecnologias
emergentes, como a robótica, a Inteligência Artificial (AI - Artificial
Intelligence), a ‘Internet das Coisas’ (IoT – Internet of Things), a computação
em nuvem, a computação quântica, a nanotecnologia, entre outras, estão em forte
aceleração imposta pelo distanciamento social, em consequência da pandemia, que
tem impulsionado o teletrabalho, o comércio eletrónico e a crescente
convivência em casa e à distância. Todavia, no início do confinamento, na
primavera do ano passado, as previsões de crescimento das novas tecnologias
foram revistas em baixa. Ao nível da IoT e em resultado das paralisações na
produção, interrupções nas cadeias de abastecimento e escassez de componentes,
a IoT, em 2020, diminuiu 18% em comparação com a previsão pré-covid no final de
2019, segundo a ABI Research. O elevado nível de incerteza em torno da
propagação da covid-19, no ano passado e que ainda hoje persiste, e o
desenvolvimento, produção e distribuição de uma vacina potencial tiveram um
impacto na procura de aplicações da IoT que resultaram em alterações ao nível
das preferências do consumidor.
Muitos projetos empresariais e planos de cidades
inteligentes foram colocados em espera porque as empresas tiveram que lidar com
a desaceleração da economia, e contração global no segundo trimestre de 2020,
determinada pela pandemia, e os governos priorizaram e redirecionaram os seus
orçamentos para responderem à crise sanitária.
No entanto, a disseminação do novo coronavírus impulsionou a
crescente utilização das novas tecnologias. As câmaras de deteção de
temperatura para identificarem potenciais infeções aumentaram substancialmente
e a procura de tecnologias que facilitam o gradual regresso em segurança dos
trabalhadores às empresas é, também, provável que continue a crescer. Muitas
empresas fornecedoras de soluções IoT alteraram rapidamente o seu conceito para
o desenvolvimento de aplicações relacionadas com a covid-19 e dispositivos para
serviços como redes sociais de monitorização do distanciamento.
Atualmente, a utilização da IoT cresce a ritmos crescentes e
acima do previsto antes da pandemia, no final de 2019. Os dispositivos
conectados enquadram-se em três domínios: IoT do consumidor, como ‘smartphones’
e ‘wearables’, IoT empresarial, que inclui fábricas inteligentes e agricultura
de precisão, e IoT de espaços públicos, como seja a gestão de resíduos. Na
medicina, a IoT ajuda a melhorar a saúde através da monitorização remota em
tempo real do paciente, da cirurgia robótica e de dispositivos como inaladores
inteligentes. Atualmente, um ‘smartwatch’ monitoriza o ritmo cardíaco e alerta
o utilizador para alterações graves, ou poderá avisar um centro de
monitorização. Nos últimos 12 meses, o papel da IoT na pandemia de covid-19 foi
determinante. No futuro, o conjunto e a variedade de aplicações de IoT em
potencial é "limitada apenas pela imaginação humana", e isso inclui a
promoção da sua utilização na maior eficiência dos recursos naturais, na
construção de “cidades inteligentes”, melhores e mais justas, e no
desenvolvimento de alternativas energéticas limpas e acessíveis.
A tecnologia 5G, e 6G nos próximos anos, aumenta
significativamente a velocidade de processamento de dados e reduz
substancialmente o tempo de latência, permitindo que estradas inteligentes de
IoT se conectem com carros autónomos, melhorem a segurança do condutor e
otimizem o fluxo de tráfego, reduzindo potencialmente o tempo médio das
deslocações. Os tempos de atendimento de emergência médica também podem ser
reduzidos significativamente. O mapeamento de um crime em tempo real e as
ferramentas ao dispor das forças de segurança também podem ajudar a prevenir o
crime.
Porém, apesar de todos os benefícios, as tecnologias de IoT
levantam também potenciais riscos, tais como questões de segurança e
privacidade, crimes cibernéticos, vigilância no trabalho, em casa ou em espaços
públicos e controle de mobilidade e expressão. Riscos que devem ser acautelados
através da constante atualização da legislação em vigor.
Paulo Monteiro, In Vida Económica, 14 de abril de 2021
quarta-feira, 27 de outubro de 2021
Bitcoin: A moeda dos que não têm moeda?
Nos últimos cinco anos o kwanza angolano perdeu 75% do seu
valor relativamente ao dólar norte-americano, o peso argentino 85%, a lira
turca dois terços e o real brasileiro metade do seu valor. Entretanto, nesse
período a bitcoin (BTC) multiplicou o seu valor por 100, de 660 dólares em
outubro de 2016 para os atuais 66 mil dólares.
Perante estes números, não é de estranhar uma gradual
preferência e adoção da BTC pelas populações dos países de fronteira, e mesmo
de algumas economias emergentes, em detrimento das suas moedas locais. A
desconfiança de muito povos africanos, latino-americanos e asiáticos nos seus
governos e instituições é, talvez, maior do que o receio nos algoritmos da BTC.
Apesar do curso forçado da moeda local, a procura por uma moeda estrangeira
robusta, como o dólar, para proteção contra as suas moedas inflacionistas é uma
realidade há muitas décadas e, atualmente, a moeda norte-americana tem a
rivalidade da BTC. Países com baixos índices de desenvolvimento humano,
caracterizados por aparelhos produtivos desestruturados e baixos níveis de
educação, procuram meios de pagamento alternativos que facilitem as trocas e
preservem o valor. A subida exponencial da BTC desperta o interesse de muitos,
e apesar da elevada volatilidade afastar, eventualmente, as populações das
economias avançadas, não será, talvez, um problema para as pessoas dos países
subdesenvolvidos.
Mesmo as principais moedas mundiais têm sido penalizadas na
última década pelas musculadas políticas monetárias expansionistas encetadas
pelos seus bancos centrais. A descida das taxas juro para níveis próximos de
zero, ou mesmo negativos, parece não ter sido suficiente para estimular o
crescimento económico. Por conseguinte, o Banco do Japão e a Reserva Federal
dos EUA (Fed), em primeiro lugar, seguidos depois pelo Banco Central Europeu,
compram há anos títulos de dívida pública, e outros ativos, financiando
indiretamente e monetizando as crescentes dívidas públicas dos seus governos,
no intuito de promoverem o crescimento e segurarem a secular hegemonia
económica global. Esta postura descredibiliza as principais moedas mundiais e
beneficia a BTC, uma criptomoeda deflacionista. Nos últimos meses, cresce o
receio de estagflação, mas o ouro, uma reserva de valor milenar, mantém-se
estável e não corrobora essa preocupação, todavia a BTC valorizou mais de 100%
desde os mínimos de meados de julho e alcança novos máximos históricos. Será a
BTC percecionada, atualmente, como uma cabal reserva de valor e mais importante
do que o ouro? Em março do ano passado, início do confinamento ditado pela
pandemia, diante da incerteza e da volatilidade, a BTC perdeu 50% e o ouro caiu
14%, no entanto o dólar valorizou. Em momentos críticos, a preferência por
liquidez recai sobre a moeda norte-americana que continua a dominar.
Tentar restaurar a credibilidade das moedas fiduciárias, mediante a retirada
dos estímulos monetários e aumento de juros pelos bancos centrais, poderá
desencadear instabilidade no sistema financeiro (queda de ações, obrigações,
imobiliário, problemas com hipotecas e serviço da dívida pública mais elevado)
e espoletar uma nova ronda de estímulos monetários. Será um ciclo vicioso? Nada
fazer descredibiliza as principias moedas fiduciárias e fomenta as
criptomoedas. Em 2018 a Fed tentou reverter a política monetária, mas desistiu,
após 20 meses, devido à desaceleração económica. No entanto, nesse ano a BTC
perdeu mais de 70%.
A mineração de BTC, validação fundamental das transações,
tem custos substanciais com energia, refrigeração, computadores e mão de obra,
mas garante a segurança do sistema. Quanto mais elevada for a cotação da BTC,
mais mineiros serão atraídos e menos vulnerável será o sistema. A queda
significativa da BTC pode significar prejuízos para muitas ASICs
(supercomputadores utilizados para calcular o ‘hash’/código certo na mineração
de um bloco e o adiciona à blockchain a cada 10 minutos, em média, validando
assim as transações), afastando as máquinas mais poderosas e aumentando a
vulnerabilidade do sistema que ficará entregue a computadores mais vulgares.
Neste cenário, um ataque informático bem-sucedido aumenta consideravelmente,
mas o baixo ‘market cap’ poderá afastar os melhores ‘hakers’. Aparentemente, é
um sistema que se autorregula.
A BTC tem um ‘market cap’ de 1,1 biliões de dólares e a capitalização do ouro é
de 11,4 biliões de dólares. Procuram os entusiastas da BTC alcançar o ‘market
cap’ da BTC e ser uma cabal reserva de valor? Atualmente, o ‘market cap’ de
todas as criptomoedas é de 2,5 biliões de dólares, quase 3% do PIB mundial. É,
provavelmente, um montante já considerável e que espoletaria uma crise
financeira se se volatilizasse…
O consumo de eletricidade médio anual na mineração da BTC é, atualmente, de 112
TWh, ou seja, mais do dobro da eletricidade consumida em Portugal em 2019. Mas
a mineração de ouro gasta anualmente 131 TWh, segundo o índice de Cambridge, e
a banca tradicional 139 TWh, de acordo com a IYOPS. O consumo total anual de
energia dos bancos tradicionais é de cerca de 26 TWh em servidores e
computadores em execução, 26 TWh em caixas eletrónicas e 87 TWh é uma
estimativa para o funcionamento de mais de 600 mil agências bancárias em todo o
mundo.
Os mineiros suportam custos na expectativa de uma potencial recompensa futura.
O risco de não receberem a recompensa pela mineração de um bloco, após trabalho
executado, incentiva os mineiros a seguirem as regras. Numa alusão à teoria dos
jogos, os mineiros ganham mais em cooperar do que em defraudar os outros
mineiros.
Na semana passada, foi lançado nos EUA, e com a anuência da SEC, o primeiro ETF
cujo subjacente é a BTC. É crescente a entrada de entidades credíveis na
comunidade bitcoin, como forma de diversificar a carteira e aproveitar as
subidas das criptomoedas. A volatilidade da BTC, a crescente concorrência e os
avanços tecnológicos são talvez as principais ameaças à BTC. Não há barreiras à
entrada de novas criptomoedas.
No entanto, a BTC é uma moeda digital mercadoria que não permite impressão
pelos bancos centrais para debelar uma crise financeira.
A importância de uma moeda depende do número de agentes económicos que a adotam,
referenciam, suportam ou dão o benefício da dúvida. Cerca de 53% da população
mundial não tem conta bancária, porque não quer, não preenche os requisitos ou por
debilidades dos sistemas bancários e são os principais potenciais utilizadores
de criptomoedas de sucesso.
Será a BTC talvez mais uma moda do que uma moeda? Em boa verdade, aqueles que
não se reveem na sua atual moeda e confiam nos algoritmos da BTC, como cabal
reserva de valor e facilitadora das transações, são potenciais impulsionadores
desta criptomoeda. O mundo não é preto e branco, há cinzentos mais claros ou
mais escuros, há prós e contras.
A independência de uma autoridade central poderá ser uma vantagem para muitos,
mas a ausência de regulamentação governamental será uma desvantagem para outros
tantos que se reveem mais num ordoliberalismo.
Paulo Monteiro Rosa, In Vida Económica, 29 de outubro de 2021
sexta-feira, 22 de outubro de 2021
Produtividade e inflação dos bens e serviços
A produtividade é a relação entre a produção e a quantidade de fatores de produção utilizados, nomeadamente trabalho e capital, e mede a eficiência na produção de bens e serviços, através de melhores resultados obtidos em menos tempo e com menos esforço. A produtividade do trabalho é definida pelo PIB por trabalhador ou PIB por horas trabalhadas. O PIB suíço é o triplo do português e tal é conseguido com menos população ativa, o que confere aos helvéticos uma produtividade do trabalho quatro vezes superior à dos portugueses.
Por exemplo, uma empresa com 100 trabalhadores e cuja produção diária, medida pela receita, são € 20 mil, num total de 800 horas de trabalho, apresenta uma produtividade do trabalho de € 25/hora. A empresa poderia aumentar a sua eficiência através da aquisição de novas máquinas, computadores mais recentes, simplificação de rotinas e mitigação dos custos burocráticos. Se essa modernização culminasse num acréscimo de receita diária para € 40 mil, a produtividade do trabalho aumentaria 100% para € 50/hora e a empresa estaria agora mais competitiva via preço, sendo possível subir salários. Uma competitividade extra-preço permitiria acréscimos ainda mais significativos, através da diferenciação do produto, de tal modo que a receita diária subiria, por exemplo, para € 100 mil, ou seja, uma produtividade do trabalho € 125/hora. Tal seria possível se a empresa vendesse camisolas de marca registada a € 50, em vez de blusas indiferenciadas a € 5.
O benefício da descida dos custos de produção é repassado em parte aos clientes e em parte à força de trabalho através de salários mais elevados. Mas o setor dos serviços dificilmente apresenta acréscimos de produtividade, todavia os salários também aumentam, fenómeno descrito como a “doença do custo de Baumol”, avançado por William Baumol, em 1966, que exemplificou com um quarteto de cordas. Para tocar uma peça escrita para um quarteto de cordas são necessários, atualmente, os mesmo quatro músicos que no século XIX. Em suma, o aumento da produtividade nas fábricas impulsiona o nível de poupança através da redução dos preços dos bens e do aumento dos salários nas fábricas. O aumento da produtividade no setor manufatureiro eleva inevitavelmente o custo de serviços intensivos em mão de obra, como concertos. Se alguma orquestra pagasse a um músico o mesmo salário de há 200 anos, não teria ninguém para tocar e todos quereriam trabalhar na indústria manufatureira. O aumento da produtividade dos trabalhadores nas fábricas impulsiona os salários nos serviços. A poupança nas fábricas aumenta a procura de concertos, permite o aumento dos preços dos bilhetes e, consequentemente, os salários dos músicos.
Os preços dos bens tendem a ser deflacionistas e dos serviços inflacionistas. Mais precisamente, os preços dos bens transacionados internacionalmente estão expostos a mais concorrência e, por isso, tendem a ser mais deflacionistas do que os bens não transacionados internacionalmente. Os preços dos serviços prestados localmente tendem a ser os mais inflacionistas no cabaz de bens e serviços.
Eletrodomésticos gradualmente mais baratos em termos reais proporcionam um aumento do consumo de educação e saúde, tendencialmente mais caros. Setor primário, secundário e terciário de serviços indiferenciados tendem a ser mais deflacionistas. O setor terciário superior (ou quaternário) que incluiu as atividades intelectuais, tende a ser inflacionista.
A substituição de trabalhadores por máquinas acontece em menor escala nos setores da saúde, arte, educação, atividades humanas não rotineiras, cujas melhorias não vêm do ganho de produtividade, mas dos ganhos de experiência dos funcionários.
A melhor forma de abordar a teoria da produtividade é
transformar serviços em bens. Contratar um alfaiate para fazer um fato por
medida é caro, então compramos um fato de fábrica, ou seja, fatos como um bem e
não como um serviço. Da mesma forma, podemos consumir o “bem” do quarteto de
cordas na forma de uma gravação, em vez do “serviço” ao vivo. Transformar
serviços em mercadorias industrializa o processo e reduz os custos. Em boa
verdade, o confinamento ditado pela pandemia impulsionou o consumo de bens em
detrimento dos serviços e contribui para a queda dos preços. Este ano, o
gradual regresso aos serviços, como concertos e teatros, tem alimentado também
a subida da inflação.
Paulo Monteiro Rosa, In Vida Económica, 22 de outubro de 2021
terça-feira, 19 de outubro de 2021
Produtividade e preços dos bens e dos serviços
A produtividade é a relação entre a produção e a quantidade
de fatores de produção utilizados, nomeadamente trabalho e capital, e mede a
eficiência na produção de bens e serviços, através de melhores resultados
obtidos em menos tempo e com menos esforço. A produtividade do trabalho é
definida pelo PIB por trabalhador ou PIB por horas trabalhadas. O PIB suíço é o
triplo do português e tal é conseguido com menos população ativa, o que confere
aos helvéticos uma produtividade do trabalho quatro vezes superior à dos
portugueses.
Por exemplo, uma empresa com 100 trabalhadores e cuja produção diária, medida pela receita, são € 20 mil, num total de 800 horas de trabalho, apresenta uma produtividade do trabalho de € 25/hora. A empresa poderia aumentar a sua eficiência através da aquisição de novas máquinas, computadores mais recentes, simplificação de rotinas e mitigação dos custos burocráticos. Se essa modernização culminasse num acréscimo de receita diária para € 40 mil, a produtividade do trabalho aumentaria 100% para € 50/hora e a empresa estaria agora mais competitiva via preço, sendo possível subir salários. Uma competitividade extra-preço permitiria acréscimos ainda mais significativos, através da diferenciação do produto, de tal modo que a receita diária subiria, por exemplo, para € 100 mil, ou seja, uma produtividade do trabalho € 125/hora. Tal seria possível se a empresa vendesse camisolas de marca registada a € 50, em vez de blusas indiferenciadas a € 5.
O benefício da descida dos custos de produção é repassado em
parte aos clientes e em parte à força de trabalho através de salários mais
elevados. Mas o setor dos serviços dificilmente apresenta acréscimos de
produtividade, todavia os salários também aumentam, fenómeno descrito como a
“doença do custo de Baumol”, avançado por William Baumol, em 1966, que
exemplificou com um quarteto de cordas. Para tocar uma peça escrita para um
quarteto de cordas são necessários, atualmente, os mesmo quatro músicos que no
século XIX. Em suma, o aumento da produtividade nas fábricas impulsiona o nível
de poupança através da redução dos preços dos bens e do aumento dos salários
nas fábricas. O aumento da produtividade no setor manufatureiro eleva
inevitavelmente o custo de serviços intensivos em mão de obra, como concertos.
Se alguma orquestra pagasse a um músico o mesmo salário de há 200 anos, não
teria ninguém para tocar e todos quereriam trabalhar na indústria
manufatureira. O aumento da produtividade dos trabalhadores nas fábricas
impulsiona os salários nos serviços. A poupança nas fábricas aumenta a procura
de concertos, permite o aumento dos preços dos bilhetes e, consequentemente, os
salários dos músicos.
Os preços dos bens tendem a ser deflacionistas e dos serviços inflacionistas. Mais precisamente, os preços dos bens transacionados internacionalmente estão expostos a mais concorrência e, por isso, tendem a ser mais deflacionistas do que os bens não transacionados internacionalmente. Os preços dos serviços prestados localmente tendem a ser os mais inflacionistas no cabaz de bens e serviços.
Eletrodomésticos gradualmente mais baratos em termos reais
proporcionam um aumento do consumo de educação e saúde, tendencialmente mais
caros. Setor primário, secundário e terciário de serviços indiferenciados
tendem a ser mais deflacionistas. O setor terciário superior (ou quaternário)
que incluiu as atividades intelectuais, tende a ser inflacionista.
A substituição de trabalhadores por máquinas acontece em menor escala nos setores da saúde, arte, educação, atividades humanas não rotineiras, cujas melhorias não vêm do ganho de produtividade, mas dos ganhos de experiência dos funcionários.
A melhor forma de abordar a teoria da produtividade é
transformar serviços em bens. Contratar um alfaiate para fazer um fato por
medida é caro, então compramos um fato de fábrica, ou seja, fatos como um bem e
não como um serviço. Da mesma forma, podemos consumir o “bem” do quarteto de
cordas na forma de uma gravação, em vez do “serviço” ao vivo. Transformar
serviços em mercadorias industrializa o processo e reduz os custos. Em boa
verdade, o confinamento ditado pela pandemia impulsionou o consumo de bens em
detrimento dos serviços e contribui para a queda dos preços. Este ano, o
gradual regresso aos serviços, como concertos e teatros, tem alimentado também
a subida da inflação.
sexta-feira, 15 de outubro de 2021
Escassez de chips e a indústria automóvel
A escassez global de semicondutores continua a afetar o fornecimento de microchips usados para produzir quase tudo atualmente, nomeadamente bens que empregam produtos eletrónicos, desde eletrodomésticos a computadores, e está a penalizar significativamente a indústria automóvel. Quase todos os fabricantes enfrentam atrasos na produção e paralisações temporárias enquanto esperam pelos chips de que precisam para terminar de construir carros na linha de montagem. Em Portugal, a Autoeuropa já interrompeu várias vezes a produção este ano devido à contínua escassez de componentes. A última paragem foi no final de setembro e início de outubro e retomou a produção na passada quarta-feira, dia 6.
Os semicondutores contêm processadores de microchip que são usados em ‘smartphones’, televisões, ‘routers’ de internet e até mesmo termostatos de controle de temperatura doméstica. Os carros novos são construídos, cada vez mais, com uma infinidade de microchips a bordo, desde motores de janelas a sistemas de navegação, e a indústria automóvel foi duramente atingida pela escassez de chips que espoletou paragens e abrandamento na produção de automóveis. Isso significa que menos automóveis estão disponíveis e que comprar carro, seja novo ou usado, é mais difícil do que o normal. Atualmente, os chips são tão essenciais na produção de carros quanto o aço, o alumínio e o plástico.
Nos EUA, parte dos consumidores que perspetivavam comprar carro novo porque o antigo estava com problemas mecânicos, optam por consertá-lo. Devido à oferta limitada de carros novos e usados, os preços de ambos estão acima do habitual.
Vários governos apostam no aumento significativo da capacidade de produção de chips. À medida que os preços dos semicondutores sobem aumenta também a atratividade para a produção dos mesmos. A indústria de chips não se caracteriza por custos fixos elevados e outras barreiras à entrada presentes num monopólio natural e que, de tal modo, impeçam o aumento significativo de produção. Sendo assim, num mercado concorrencial o lucro tende para zero, logo é esperado que a produção de chips aumente ou novos produtores entrem neste setor enquanto as margens forem elevadas, voltando a reequilibrar a oferta deste bem, cada vez mais necessário, e a descida do seu preço. A Intel, que não fornecia chips para a indústria automóvel, iniciou a produção para este setor. Grandes fabricantes de chips como a TSMC, a empresa de Taiwan que domina a indústria global de semicondutores, estão a construir mais fábricas.
As exportações japonesas de bens duradouros e maquinaria para a produção de chips têm aumentado significativamente nos últimos meses, refletindo o esforço e as perspetivas de reforço da produção de chips a nível global. A Fitch Ratings espera que à atual escassez de chips suceda um excesso de produção em 2023. Várias fabricantes de automóveis esperam que a escassez de chips se mantenha até meados de 2022.
Está a ser um bom momento para vender um carro que não esteja a utilizar? O aumento dos preços dos carros novos empurrou muitos consumidores para os carros usados, tornando-os mais escassos e mais caros também. Em suma, temos atualmente um mercado de vendedores.
Paulo Rosa, In Vida Económica, 8 de outubro de 2021
Proposta de Orçamento do Estado para 2022
O crescimento económico projetado de 5,5% em 2022 na Proposta de Orçamento do
Estado para 2022 (POE 2022) mostra um executivo mais otimista que os principais
organismos internacionais, nomeadamente o FMI que estima um crescimento do PIB
real português de 5,1%. A revisão em alta, muito provavelmente, antecipa uma
melhoria no mercado da energia no próximo ano, a redução das dificuldades nas
cadeias de abastecimento a nível global e a gradual superação da pandemia de
covid-19. A POE 2022 estima uma melhoria da envolvente externa e, isso,
reflete-se num contributo das contas externas para o PIB português acima do previsto
para o presente ano de 2021 e uma consequente redução do défice comercial. Mas
o governo estima que o grande impulsionador do crescimento económico em 2022
seja o investimento privado alicerçado no Plano de Recuperação e Resiliência (PRR)
e este facto poderá explicar a revisão em alta, de 0,4 pontos percentuais, relativamente
às perspetivas de crescimento do FMI. O bom desempenho do investimento privado
esperado pelo governo gerará mais emprego e, consequentemente, mais consumo das
famílias. Por conseguinte, o executivo estima que o consumo privado contribua
também consideravelmente para o crescimento do PIB em 2022, nomeadamente espera
que tenha o segundo maior peso na subida do PIB, a seguir à variável
investimento privado. Todavia, o investimento público marcará passo em 2022 com
um aumento residual de 1,8% e será o menor contribuidor para o crescimento
económico. Assim sendo, a POE 2022 antecipa que o Investimento privado cresça
em termos reais 8,1% em 2022, o consumo privado 4,7% e a despesa pública apenas
1,8%.
A POE 2022 projeta a continuidade da redução gradual do rácio da dívida pública
iniciada este ano. É esperado que a relação da dívida pública face ao PIB
nominal desça 4,1 pontos percentuais em 2022 para 122,8% de 126,9% estimado para
o presente ano de 2021. Em 2020 o rácio da dívida pública subiu
consideravelmente, penalizado pelos confinamento e distanciamento social ditados
pela pandemia, e alcançou um nível histórico de 133,7%, uma subida de quase 17
pontos percentuais face ao rácio de 117,2% verificado em 2019.
A POE 2022 estima uma redução do défice orçamental de 4,3% para 3,2%, o que
reflete uma intenção de consolidação das contas públicas. Em boa verdade, há
uma desaceleração no aumento da despesa pública, espelhada no crescimento de
apenas 1,8% nos gastos públicos, face aos 4,3% previstos no atual ano de 2021.
O programa de compra de ativos (APP), iniciado pelo Banco Central Europeu (BCE)
em 2015, permitiu uma considerável descida das taxas de juro da dívida pública,
nomeadamente dos países do sul da Europa. Os títulos adquiridos ao abrigo do APP
junto do BCE totalizavam € 3227 mil milhões no final de setembro de 2021, um
montante idêntico à riqueza produzida na Alemanha em 2020, e representavam 39%
do ativo do banco central da Zona Euro. Atualmente, o total do montante ao
abrigo do APP e do PEPP (programa de compras de ativos pandémicos) iniciado na
primavera do ano passado para suportar a crise pandémica, é de € 4666 mil
milhões, e o PEPP responde por cerca de € 1200 mil milhões. Quando as aquisições
de títulos para suportar a crise pandémica terminarem, os investidores esperam
que o BCE continue as compras de ativos e uma das formas poderá passar pelo
reforço do APP. Ou seja, os investidores estimam que as taxas de juro continuem
baixas nos próximos anos e que a inflação mais elevada, verificada
presentemente, seja um fenómeno transitório.
As atuais baixas taxas de juro permitem que o serviço de dívida das contas
públicas se mantenha estável, apesar do elevado montante de dívida. Por
conseguinte, cortar ainda mais na dívida pública relativamente ao PIB nominal,
numa altura em que as famílias e as empresas ainda não se recompuseram da crise
económica ditada pela pandemia, poderia ter um impacto negativo. Uma descida da
dívida pública mais acentuada teria que ser, provavelmente, à custa de uma
variação negativa dos gastos públicos.
A POE 2022 passará agora para a Assembleia da República. O debate na
generalidade acontece a 26 e 27 de outubro e a votação global a 25 de novembro.
Se for aprovada converte-se em Orçamento do Estado para 2022 (OE 2022).
Paulo Monteiro Rosa, In Vida Económica, 15 de outubro de 2021
sexta-feira, 1 de outubro de 2021
Crise energética precipita estagflação?
O crescente aumento dos preços da energia corroboram uma
crise energética global. A elasticidade do consumo de energia é rígida e o
inverno no hemisfério norte aproxima-se e com ele o frio. Em 1970, a crise
energética culminou num período de estagflação. A atual inflação
temporária caminhará para uma inflação mais persistente? Um período de
inflação mais longo e níveis de preços indesejáveis poderiam ditar uma
antecipação da redução das compras de ativos pela Reserva Federal dos EUA e uma
subida, mais cedo do que esperado, das taxas de juro para mitigarem a subida de
preços. Uma estagflação nos EUA seria, talvez, definida por um crescimento
do PIB à volta dos 3% ou abaixo e uma taxa de inflação de 3% ou acima, medida
pelo PCE ‘core’, talvez o critério mais apropriado para aferir a alteração de
preços devido à atualização mais frequente do seu cabaz de bens e serviços e à
sua cobertura mais abrangente relativamente ao IPC. A subida das taxas de
juro acabaria por intensificar ainda mais uma hipotética estagflação espoletada
por uma crise energética.
O Brent de Londres, referência mundial para dois terços da oferta de petróleo,
atingiu os 80 dólares por barril pela primeira vez desde setembro de 2018 e o
gás natural quadruplicou de preço nos últimos 12 meses, estando aos níveis do
último trimestre de 2008, após o colapso do Lehman Brothers e, consequente,
Grande Recessão. O fenómeno temporário de ‘contango’ do ano passado, reverteu
gradualmente para um salutar ‘backwardation’, mas a inclinação negativa da
curva de futuros do petróleo intensifica-se, num claro sinal de que os
investidores acreditam que a oferta continuará a ser exígua e poderá redundar
em estagflação, ou seja, crescimento anémico acompanhado de inflação.
Na Europa, o megawatt/hora (mwh) de eletricidade negociado na OMIP, MIBEL e EEX
subiu dos 40 euros para cerca de 180 euros. Ou seja, o custo para as
comercializadoras de eletricidade era de € 0,04 o KiloWatt/hora (kwh) até há
alguns meses e atualmente é de € 0,15 a € 0,18/kwh. A subida dos preços das
licenças europeias para emissão de CO2 é um dos principais impulsionadores dos
custos da eletricidade. Por exemplo, as famílias portuguesas pagam cerca de €
0,17 ou € 0,18 kwh, a carga fiscal ronda os 60% e é transversal na Europa, mas
agora os preços agravar-se-ão.
O carvão quadruplicou de preço nos últimos 14 meses e está em níveis recordes.
A diminuição da oferta da China impulsiona o preço do carvão, à medida que o
país promete atingir os padrões de emissões e alcançar a neutralidade de
carbono até 2060.
O que fazer? Uma redução da carga fiscal conseguiria mitigar o problema, mas os
atuais níveis de dívida pública, muito mais elevados que em 1970, são um
entrave a mais endividamento e podem pressionar os juros pelo efeito de
‘crowding-out’. Uma transição energética mais gradual e faseada, abrandando o
seu ritmo de forma a preservar o crescimento económico e o emprego. Algumas
empresas não conseguem acompanhar a subida dos custos e na ausência de escala
ou ‘pricing power’ serão obrigadas a encerrar. O regresso gradual do petróleo
de xisto poderá atenuar a subida dos preços. Reverter o desinvestimento em
energia nuclear seria uma opção?
A falta de energia poderá impulsionar os preços do aço e do alumínio. A
escassez de semicondutores e outros ‘bottlenecks’ pressionam também os custos
das empresas. Crescem as dificuldades para as famílias acompanharem a subida
dos preços da energia e, neste contexto, um aumento substancial dos salários
reforçaria ainda mais a estagflação. Todavia, este é o preço a pagar pela
rápida transição para uma energia mais ‘verde’.
A estagflação ocorre quando uma economia enfrenta alterações repentinas e
significativas na oferta de uma mercadoria ou serviço (choque da oferta), como
um rápido aumento no preço da energia. A produção torna-se mais cara e menos
lucrativa, desacelerando o crescimento económico. Atualmente, a subida é
generalizada a todas as fontes de energia. A estagflação pode ser resultado
também de uma política económica desfasada e imposta muito rapidamente. Por
exemplo, políticas energéticas sem uma gradual e cuidadosa introdução podem
penalizar muito os custos das indústrias e das empresas, e podem resultar num
crescimento económico mais lento e numa inflação mais alta. As crescentes
necessidades ambientais e cumprimento de metas de descarbonização podem
condicionar os preços.
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