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sexta-feira, 7 de maio de 2021

Era uma vez a inflação e o juro…

O ser humano trabalha para poder consumir e satisfazer os seus gastos presentes e futuros. Produzimos para consumir. Portanto, somos produtores e consumidores simultaneamente. Se alguém consome primeiro através do recurso ao crédito é porque, muito provavelmente, tem capacidade para honrar os seus compromissos e é detentor de bens, resultado do trabalho acumulado, que suportam esse crédito. A lei de Say refere que produzimos um determinado bem ou serviço, para podermos consumir os bens e serviços produzidos pelos outros agentes económicos. O meio que facilita todas essas atividades de troca de bens e serviços é o dinheiro, que efetivamente representa o trabalho armazenado, e a divisão do trabalho permite a especialização e o crescimento económico. A raiz da troca não é o dinheiro, mas ele facilita consideravelmente as comparações de valor entre bens.

A oferta de capital vem da poupança dos consumidores, juntamente com o dinheiro reservado para esse fim pelos próprios produtores. O preço do crédito, baseado na poupança de alguém, é a taxa de juro e está alicerçada nas preferências temporais, entre quem adia e quem antecipa o consumo, e no risco de perda de capital.

Ninguém está disposto a sacrificar uma unidade de consumo agora por menos de uma unidade no futuro, ou seja, ter uma preferência temporal negativa, espelhada em juros negativos. Obviamente, existem pessoas que não conseguem consumir todo o seu rendimento disponível, mas investem no mercado imobiliário, no mercado de capitais, ou os mais empreendedores criam uma empresa, sempre com o intuito de obter um acréscimo de dinheiro, não emprestam com juros negativos para receber menos dinheiro. As preferências temporais são positivas, ou seja, só é racional existirem taxas de juro reais positivas.

Se os preços dos bens estão a aumentar ou se se espera que venham a subir, então as preferências temporais aumentam e o presente sobrepõem-se ao futuro. O produtor irá aumentar a sua preferência temporal na expectativa de preços finais mais elevados para a sua produção, devido à esperada subida da inflação. Os consumidores também aumentam a sua preferência temporal para consumirem mais bens no presente porque no futuro podem estar mais caros. O aumento da procura de dinheiro e a diminuição do stock de moeda traduzem-se na subida da taxa de juro.

Analogamente, se a previsão para o comportamento dos preços é de queda, haverá menos incentivo para aumentar a produção ou consumir mais no presente, porque poderemos fazê-lo mais tarde sem existir o risco de pressões inflacionistas, logo as preferências temporais caem, ou seja, as taxas de juro descem, pelo excesso de stock de moeda e retração da procura.

É por isso que as taxas de juros se correlacionam positivamente com o nível de preços. Grosso modo, o juro é o preço do tempo. A taxa de juro é refletida pelas preferências temporais e o aumento da mesma representa uma subida do juro.

Irving Fisher refere que, no longo prazo, a taxa de juro nominal é dada, aproximadamente, pela soma entre a taxa de juro real e a inflação esperada. Ou seja, se a expectativa for de subida de preços, então a taxa de juro aumentará também. Se a previsão for de descida de preços, a taxa de juro tenderá a cair. Países com elevada inflação têm altas taxas de juro, e vice-versa, e é também uma forma de os agentes económicos se protegerem contra a inflação.

Um indivíduo mais velho pode ter uma preferência temporal menor, em relação à que tinha quando era novo, devido a um rendimento mais elevado e ao facto de ter tido mais tempo para adquirir bens duradouros como uma casa e um carro. Por isso, o envelhecimento da população nos países desenvolvidos, mais vincado no Japão e na Alemanha, pode ser uma das razões para as baixas taxas de juro e de inflação.


Paulo Rosa, 13 de novembro de 2020, VE




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Licenciado em Economia pela Faculdade de Economia da Universidade do Porto.